MLK/FBI

MLK/FBI Documentário Martin Luther King Crítica Pôster

Sinopse: Primeiro filme a revelar a extensão da vigilância e da intimidação do FBI ao reverendo Martin Luther King, baseia-se em arquivos descobertos e/ou tornados públicos recentemente, em uma diversidade de documentos obtidos por meio do Ato de Liberdade de Informação e em relevantes materiais audiovisuais restaurados. O documentário explora a história de perseguição a ativistas negros pelo governo norte-americano e o contraste entre J. Edgar Hoover e King, duas figuras icônicas e poderosas que, apesar de suas diferenças, viam-se ambas como guardiões do sonho americano.
Direção: Sam Pollard
Título Original: MLK/FBI (2020)
Gênero: Documentário
Duração: 1h 44min
País: EUA

MLK/FBI Documentário Martin Luther King Crítica Imagem

Narrativas por Trás das Imagens

Dentro da mostra competitiva de longas-metragens internacionais do Festival É Tudo Verdade 2021, o documentário “MLK/FBI” é uma reprodução dos estudos do escritor e pesquisador norte-americano David Garrow. O filme é dirigido por Sam Pollard, que nos últimos anos trouxe importantes obras sobre a historiografia do povo negro nos Estados Unidos. Em 1998 ele foi indicado ao lado de Spike Lee pela produção de “Quatro Meninas“, documentário dirigido pelo diretor de “Destacamento Blood” (2020). A produção, desta vez, é da já famosa Field_of_Vision, que estará na cerimônia deste ano com o curta-metragem “Do Not Split“.

A forma pelo qual a história é representada encontra um curioso equilíbrio na linguagem moderna. Tirando trechos bem rápidos no final, em que o próprio Garrow e outras figuras contemporâneas opinam sobre o legado de Martin Luther King, toda a trajetória se dá por imagens de arquivo, editados com falas atuais ou da época. Com isso, o volume de informações contida na produção consegue ao mesmo tempo ser assimilada por quem tem pouco conhecimento sobre os fatos, sem deixar de prover um bom material para quem revisita a vida do pastor e ativista pelos direitos civis, assassinado em 1968.

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São raros os momentos em que a montagem de “MLK/FBI” dá uma sensação espetacularizante. Na vez em que a ferramenta é pinçada, logo no início, o histórico discurso no Lincoln Memorial em Washigton, em 1963. A intenção aqui é mostrar como, nos bastidores da vida política, houve um plano para deslegitimar a figura de Martin Luther King. Um ataque pessoal, objetivando ferir a honra direta de alguém que movimentava as massas para que lutassem por respeito e dignidade.

Sem comprovação de vínculo com células comunistas na América, o que havia contra ele era a proximidade com o advogado Stanley Levison. Garrow em seus textos – e, por consequência, Pollard em sua narrativa – apresentam este personagem paralelo como a definição clássica de aliado. Um judeu, branco, que se viu convidado a contribuir de certa forma com as propostas de transformação na sociedade de King. A vinculação direta de socialismo com revolução, uma construção ideológica ianque para se manter livre do “fantasma”, caia por terra se imaginarmos que o Pastor era conhecido pela implementação não-violenta de políticas afirmativas.

Todavia, o maior destaque de “MLK/FBI” é readequar a ideia de que J. Edgar Hoover era o incorrigível vilão da sociedade, inovando nos métodos para aplicar as ordens de um sistema opressor. Ele surge como peça de uma engrenagem, que inclui uma forte propaganda governista em Hollywood. Filmes hoje pouco falados, como “Aventura Perigosa” (1952), produzido e estrelado por John Wayne e “A História do FBI” (1959), dirigido por Mervyn LeRoy e protagonizado por James Stewart contribuíram muito para esse imaginário, de órgão autônomo e isento capaz de identificar, investigar e quase punir tudo o que for contrário aos interesses da nação. Com isso, a ideia de que os agentes do FBI são homens brancos conservadores adicionaram este elemento ao argumento de antagonismo de lutas sociais. Há um caminho mais híbrido. De fato, é inegável que a tática era transformar Martin Luther King em um hipócrita, seja por ser um religioso imoral ou um pacifista guerrilheiro. A suspensão da publicização das investigações até 2027 deram um longo sigilo a esse embate.

MLK/FBI“, então, usa o que está disponível – o que já permite traçar um panorama bem amplo. Um exemplo é mostrar que JFK e seu irmão, Bob Kennedy, pediram diretamente para que o Pastor se afastasse de Levison. Já Hoover, que comandou o FBI entre 1924 e 1972, teria na morte de King um episódio capaz de questionar a forma como o órgão agia. Se, ao invés de se preocupar em buscar meios de derrotar ideologicamente um cidadão norte-americano, protegesse sua vida e liberdade, não seria hoje tão condenável. Apostou na cegueira estatal, deixando que os interesses do capital agissem – sendo apenas uma extensão de uma sociedade que nasceu para dar errado.

Veja o Trailer:

 

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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