Sinopse: “Um Clássico Filme de Terror”, é uma história de terror cheia de tensão e sangue, em que os passageiros de um ônibus são vítimas de assassinatos ritualísticos.
Direção: Roberto De Feo e Paolo Strippoli
Título Original: A Classic Horror Story (2021)
Gênero: Horror | Mistério
Duração: 1h 35min
País: Itália
Algoritmo à Carbonara
“Um Clássico Filme de Terror“, que chegou esta semana na Netflix, já exige do cinéfilo mais sisudo a superação de uma quebra de expectativa. Quando se fala em “terror italiano”, chega às nossas mentes nomes de grandes mestres e propostas de linguagem de gênero fundamentais para a historiografia do audiovisual. Os cineastas Roberto De Feo e Paolo Strippoli brincam com a lógica algorítmica que o horror comercial se transformou nas últimas décadas, em uma produção que – perto do fim – se assume colonizada, para desaguar em um epílogo que traz leituras parecidas com a dos brasileiros e seus preconceitos ao audiovisual nacional, autoral e extremamente criativo.
O nome do filme parece dizer tudo. A obra nos apresenta Elisa (Matilda Lutz), jovem que embarca em uma viagem no trailer com um grupo de pessoas. Pai e filha, esta com seu namorado gringo e o esquisito Fabrizio (Francesco Russo), preocupado em registrar em vídeo todos os passos de um passeio incomum. Uma abordagem relacionada ao imediatismo e à representação midiática que já soa clichê. Mais um, neste longa-metragem que replica e reproduz tramas e construções imagéticas do cinema popular – não como muletas narrativas e sim para usar delas propositalmente.
Quando o gringo Mark (Will Merrick) decide tomar a direção do veículo ligeiramente embriagado, um animal na pista provoca um acidente. Todos ficam inconscientes e acordam na manhã seguinte no meio da floresta, bem longe da estrada – sem saber bem o porquê. de “Jogos Mortais” (2004) a “Midsommar – O Mal Não Espera a Noite” (2019), do uso psicológico ao slasher, da subversão da lógica à crueza de corpos dilacerados. A obra é feita para divertir, usando as lembranças de quem folheia um álbum de fotos. Da sua viagem favorita, se você for fã do gênero ou de um agradável encontro de família, se você curte apenas o suficiente.
Pensado como algoritmo, “Um Clássico Filme de Terror” será um dos sucessos da semana no serviço de streaming (ao lado, claro de “Rua do Medo: 1666 – Parte 3“), mas provocará frustração àqueles que não embarcam na debochada jornada de ser um jogo de representações – mitigando o que poderia torná-lo representativo. Há quem prefira reclamar com autoridade de histórias em que decisões estúpidas dos personagens e vilões e suas inabaláveis missões de matar se envernizem de seriedade. Terminam a sessão criticando da mesma forma.
Talvez aceitar que o Cinema já produziu e nos deu mais do que sua capacidade de inovar seja um passo importante para continuar amando seu museu de grandes novidades. De Feo e Strippoli soa mais como arquivistas do que como diretores, fazem do longa-metragem um manual básico de terror e horror, um guia ilustrado do susto. A direção de fotografia de Emanuele Pasquet tem algo que fica entre a meia-luz brilhosa da contemporaneidade e a falsidade dos “Contos da Cripta“. A montagem de Federico Palmerini é o bê-á-bá do gênero, com direito a um respiro no segundo ato para explorar em paralelos os fiapos de passado dos personagens em suas caminhadas para mortes cruéis.
Tem também a casa mal-assombrada, que não poderia faltar. Incluindo a versão italiano de “A Casa“, composta e também traduzida por Vinícius de Moraes e sucesso na Itália na voz de Sergio Endrigo (e que gerou esse ótimo artigo de Daniel Gil sobre folclore a partir destes versos). Ou seja, tudo parece no lugar onde deveria estar. Tanto que só poderia ser, claro, um filme. É se agarrando nesta premissa, que a obra encontra um tom para trazer a necessidade de uma sociedade espetacularizante e as implicações nas relações humanas – na perda de humanidade e no olhar do outro como objeto, de conquista ou de descarte.
Parece profundo, mas “Um Clássico Filme de Terror” consegue tornar essa proposta um novo motivo para rir de si. Quebra uma narrativa colonizada e assumida com uma discussão entre dois italianos, que reconheceríamos de longe pelo idioma e – principalmente – pelo gestual. Ao reproduzir a cultura dominante, deixa uma pulga de reflexão quando se aproxima dos créditos finais. Como estamos consumindo um filme hoje? Será que eles não parecem apenas pequenos flashes? E a absorção da produção do próprio país, como fica? Desconhecimento escancarado em uma caixa de diálogos traz a curiosa frase: “italiano não sabe fazer filme de terror“. Talvez não saiba fazer western também. Só mesmo spaghetti. Ou talvez estejamos preocupados demais com o verde do gramado de nossos vizinhos.
Veja o Trailer: