Os Observadores

Poster de Os Observadores (The Watchers, 2024)

Sinopse: Em “Os Observadores”, Mina, uma artista de 28 anos, se perde em uma imensa e assustadora floresta natural no oeste da Irlanda. Quando Mina finalmente encontra abrigo, ela acaba presa ao lado de três estranhos que são vigiados e perseguidos por criaturas misteriosas todas as noites.
Direção: Ishana Night Shyamalan
Título Original: The Watchers (2024)
Gênero: Thriller | Fantasia | Mistério | Suspense
Duração: 1h 42min
País: EUA | Irlanda

Imagem de Os Observadores (The Watchers, 2024)

Com um Pássaro na Mão

Os Observadores”, estreia na direção de Ishana Night Shyamalan, jovem filho do produtor da obra, M. Night Shyamalan (que esteve ontem por aqui na Apostila de Cinema quando assistimos “Armadilha”), também foi distribuída pelo braço da Warner e chegou ao catálogo de seu serviço de streaming, o Max. Usando elementos sobrenaturais como mote, Ishana surge como uma espécie de aprendiz, mas pinçando tantas referências que consegue ser capaz de confundir boa parte dos cinéfilos em seu primeiro longa-metragem.

Há duas formas possíveis de leitura sobre essa adaptação do romance gótico contemporâneo do escritor A.M. Shine. Todavia, o fato dessa possibilidade ser criada já mostra a dificuldade da realizadora em passar suas intenções. A trama, costurada com novas revelações a todo instante, parece nunca querer se aprofundar naquilo que leva o espectador a acompanhar em determinado momento.

Os Observadores” começa com um prólogo, no qual um homem parece ser capturado em uma floresta por alguma entidade misteriosa. Corta para a informação de que 70% da mata nativa da Irlanda foi destruída no último século, propondo uma relação entre a ação do ser humano sobre a Natureza e o que está por vir. É quando somos apresentados a Mina (Dakota Fanning), uma moça que sustenta um luto de quinze anos pela morte da mãe, usando sua juventude para ter uma vida distante dos seus e o mais escondida possível. Um dia ela precisa levar um pássaro pelas estradas irlandesas para cumprir um prazo no local em que trabalha.

Shyamalan, o pai, gosta de fazer abordagens pela ótica familiar em suas obras. De certo modo, Ishana também procura fazer. Quando a protagonista se vê perdida na mesma floresta e é levada ao Poleiro, local em que os humanos precisam estar à noite para não serem pegos pelas criaturas que lá habitam, parece que a teia de personagens será mostrada como se uma família por conveniência se formasse. O casal Ciara (Georgina Campbell) e Daniel (Oliver Finnegan) são liderados por Madeleine (Olwen Fouéré), uma senhora que capitaliza sua idade para tornar sua palavra em uma ordem velada, carregada de credibilidade.

A ideia por trás da narrativa principal é simples: a partir do momento em que você se vê naquela floresta à noite, só existem dois caminhos. Ou você se abriga no Poleiro todas as noites ou você fica à disposição das criaturas e morre. O primeiro terço da obra soa como uma longa introdução, na qual essa premissa é explorada de forma cansativa. Existe ali uma ideia de que “os outros” da história exercem sua opressão limitando territorialmente aqueles indivíduos. Uma virada na forma de agir de Mina interessante, eis que – aquela que desejava viver passivamente no quase anonimato – parece assustada com a ausência de questionamento dos outros três humanos que habitam o Poleiro há muito mais tempo.

Com isso, “Os Observadores” flerta com o diálogo com a sociedade atual, aquela em que “somos levados”, cada vez menos independentes – ao mesmo tempo cada vez mais individualistas. Isso é explorado em momentos como aquele em que eles se reúnem de frente para uma televisão e assistem a um DVD contendo um reality show de namoro, no estilo MTV – talvez uma das atividades mais divertidamente alienantes que temos na última década. Madeleine em certo momento, como se tentasse sintetizar aquela situação, diz “os observadores nos deixam viver porque seguimos suas regras”, em estado de aparente conformismo.

Até que no meio do filme acessamos um flashback de Mina e entendemos o real trauma familiar que habita sua mente há quinze anos. Depois disso, as próprias ideias por trás da narrativa são constantemente alteradas. Ishana Shyamalan atrai para a trama os conceitos de cooptação dos oprimidos, de transmutação, de “fitas achadas” na figura do professor Killmartin (John Lynch), dentre outros. É uma colagem que não soa como revelações de forma crescente e sim como o abandono das ideias anteriores. Jogando de forma segura, não querendo os “dois pássaros voando”, mas – ao contrário da protagonista, trocando toda hora o pássaro que tem na mão.

O longa-metragem segue essa teia a partir de um verniz mitológico, precedendo o que seria um falso clímax no início do terço final. Da mesma forma que tratamos da quebra de expectativa em “Armadilha”, nos transportando para fora daquele território que tudo levava a crer seria o único da história, a realizadora também vai além, criando um novo clímax fora da floresta. Agora, com a proposta de que presenciamos, na verdade, um experimento humano mal sucedido.

Assim como a proposta de leitura do filme discorrida acima é uma, confesso que vi em “Os Observadores” potencial para ser entendido como, de fato, uma colagem de referências às outras obras do gênero. Não uma tentativa desesperada da cineasta estreante em adicionar elementos que possam seduzir o público durante a obra negligenciando a unidade fílmica e sim uma consciência de que o próprio longa-metragem também é um experimento. Vi potencial nessa leitura, mas também confesso que terminei a sessão pouco convencido disso.

Veja o trailer:

Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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