Direção: Diego Felipe Souza e Vladimir Santafé
Título Original: Ensino de Filosofia em Defesa do Pensamento Crítico (2020)
Gênero: Documentário
Duração: 44min
País: Brasil
Como Tocar Serrotes em Tempos de Opressão?
Em sua forma, “Ensino de Filosofia em Defesa do Pensamento Crítico” (que você assiste gratuitamente clicando aqui) é um documentário bem tradicional. A produção da Bantu Comunicações e Linhas de Fuga segue o padrão de apresentar o tema através de narrativas e imagens e trazer depoimentos de professores da disciplina. No entanto, esse estilo de linguagem em nada faz com o que documentário seja menos necessário. O filme está desde o mês passado disponível na Plataforma Bombozila.
Começando por Sócrates (que temos como criador da Filosofia Ocidental), o filme lembra que os filósofos sempre foram perseguidos. Spinoza, Walter Benjamin, Deleuze , todos eles sofreram por expor e defender uma nova maneira de entendimento para o mundo. Sabendo que as suas percepções eram apenas um das tantas possíveis fizeram mais: deixaram evidentes que o olhas e a perspectiva modifica o objeto.
Em épocas de governos autoritários, como era na época de Sócrates, ou como é na nossa, essa é uma proposta desafiadora e arriscada. Não digo com isso que nossos filósofos serão efetivamente perseguidos, mas a desvalorização da disciplina e a falta de remuneração justa já não seriam desestímulos suficientes? Além disso, após uma breve época, iniciada em 2008, na qual Sociologia e Filosofia – disciplinas necessárias para formação do cidadão – estiveram entre aquelas obrigatórias para o ensino médio, vemos um retrocesso com a Reforma do Ensino no país em 2017 com um projeto educacional voltado para o mercado de trabalho.
É evidente que em um país no qual a maioria da população não compreende a atuação da Sociologia e da Filosofia em suas decisões cotidianas valeria, inclusive, ampliar o debate dessa disciplinas e não restringi-lo ou apaga-lo. Ainda faltam inúmero passos para que consigamos trazer para os espaços de debate uma Filosofia compreensível e que dialogue com todo e qualquer homem, como sempre deveria ser.
A retirada dessas disciplinas da escola não somente as elitiza como enfraquece as possibilidades de fazer com os alunos trabalhem com questões centrais para sua formação. Filosofia é: Estática, Ética e Lógica. Filosofia é aprender a pensar e a desenvolver seus argumentos com base fundamentais ou saber refutar um argumento contrário ao seu sem agressividade e superficialidade. Basta uma leve olhada para nossa sociedade para entender que precisamos reconstruir esses caminhos.
Talvez, a grande pergunta a ser feita seja: o que pode o pensamento? Em um pequeno, porém potente livro, O que é a Filosofia?, o filósofo Guilles Deleuze, em conjunto com seu parceiro constante Félix Guatarri, discorre sobre as potentes e variáveis da disciplina.
Ao trazer diversos professores de ensino médio para fazer sobre a experiência de ensino na escola, percebemos uma larga preocupação com as questões sociais que deixarão de ser postas em aula, a ideia da Filosofia como ação que pode modificar uma percepção, a preparação para se relacionar em sociedade e a construção de uma emancipação política.
A necessidade de uma crítica propositiva, como o professor Edgar Lyra da PUC-Rio ressalta, deve ser construída de maneira lenta e obstinada. O papel do professor é difícil e pesado, mas somente ele será capaz de despertar algo quando se propõe a ir além papéis, notas, resenhas e se coloca ao lado do aluno para descobrir uma nova maneira de resistência.
Em outro trecho, vindo de seu Abecedário, Deleuze anuncia:
“Eu ensinava meus alunos a tocar serrote porque eu tocava e todos achavam normal. Acho que, hoje, isso não seria mais possível… Pedagogicamente, queria explicar o quê com o serrote? Em que momento ele entrava em cena? As curvas. O serrote, como você sabe, tem de ser curvado e obtemos o som num ponto da curva. São curvas móveis que lhes interessavam muito.”
Será que não deveríamos todos voltar a tocar serrotes?
Para iniciar mais discussões como essa, veja nossa Apostila Bombozila.