Sinopse: Ao visitar um abrigo para crianças, uma menina conhece Joseph, um menino cujo único sonho é ter um guarda-chuva amarelo. Este encontro inesperado desperta suas memórias do passado.
Direção: Helena Hilário e Mario Pece
Título Original: Umbrella (2020)
Gênero: Animação
Duração: 7min
País: Brasil
Gotas Amarelas e de Todas as Cores
Em somente sete minutos, o curta-metragem de animação brasileiro baseado em fatos “Umbrella“, disponível gratuitamente no YouTube desde 7 de janeiro, traz a história comovente de Joseph. Sem que compreendamos muito bem o motivo, a criança órfã residente de um abrigo, parece obcecada pelo amarelo. Aqueles que têm um pouco de noção de teoria das cores sabem que amarelo simboliza harmonia, prosperidade e alegria, muito atrelada ao simbolismo do próprio Sol. Imediatamente, nos parece uma cor ideal para ser trabalhada em um filme que lide com o delicado tema dos abrigos infantis.
Porém, o filme dirigido por Helena Hilário e Mario Pece vai além. Não se limitando a uma narrativa óbvia, a produção (pré-selecionada para a categoria melhor curta-metragem de animação do Oscar 2021) nos conecta às origens do trauma do menino. Curioso que nosso recém analisado “Soul” também trate um pouco do tema. Porém, se há alguma aproximação que possamos fazer entre os dois, ela termina por aí.
Se pensarmos sob a perspectiva da premiação, a produção ganha o mundo no momento certo. A página oficial do filme faz questão de frisar a empatia como grande mote de sua trama. Usando um caso real conhecido pelos realizadores em um orfanato da região Sul do Brasil, soa como uma ironia ser do nosso país uma trajetória tão potente no ano em que, infelizmente, nos provamos bem menos empáticos do que imaginávamos ser. Pouco mais de sete minutos que renovam nossas esperanças enquanto humanos e, na particularidade dos dramas da nação, como brasileiros.
Todavia, há um troféu para ser buscado. A ausência de conhecimento de todo o rol de pré-selecionados limita qualquer análise, a campanha para o Oscar ainda está no início. Porém, alguns elementos conferem preciosos pontos. A escolha pela estética e linguagem, por exemplo. Abdica das palavras, universaliza suas representações e tem uma animação de alto padrão que o deixa em pé de igualdade com os grandes players da categoria. Sua busca por popularização nos meses anteriores, disponibilizando gratuitamente, é outro fato que o aproxima do vencedor do ano passado: o lindo “Hair Love” (2019), que surge de um bem-sucedido financiamento coletivo pelos diretores Matthew A. Cherry e Karen Rupert Toliver e chegam ao maior palco da indústria cinematográfica distribuído pela Sony.
Helena Hilario é uma experiente produtora de curtas-metragens, com mais de duas dezenas de trabalhos no currículo. Também atua na produção de efeitos visuais, elemento que se apresenta como destaque nas obras anteriores listadas na carreira de sua dupla, Mario Pece. Juntos eles fundam a Strato Storm, que conta com mais de cinquenta pessoas na equipe. Desenvolvem animações para grandes plataformas, como a Netflix e Cartoon Network. Ou seja, há uma credibilidade construída, há pertinência no objeto do filme, há uma conjunção de fatores (inclusive ser do Brasil, presente nas manchetes de todo o mundo por péssimo fatores) que se unem para fazer do filme uma grande opção.
Por sinal, vale ressaltar que as categorias de curtas-metragens permitem uma ousadia maior dos votantes, que buscam o tradicionalismo nas categorias mais visadas. Sempre bom lembrar que Oscar e toda a temporada de premiações é calcada em um jogo político e mercadológico.
Por isso, é importante pensar além. Dito isso, “Umbrella” consegue em seus poucos minutos abrir espaço para uma outra temática importante: a questão dos refugiados de guerra e da recepção nos países de chegada. Tema poucas vezes tratado pela Apostila de Cinema em seu primeiro ano, porém sempre presente em nossos noticiários e narrativas contemporâneas. É central que nos dediquemos a conversar sobre a migração e as possíveis soluções para os problemas de adaptações culturais e econômicas que enfrentam aqueles que precisam sair de sua pátria.
Ao fazer com que essa preocupação apareça em uma animação, os realizadores introduzem ao debate uma série de crianças (que totalizam metade dos refugiados do planeta) que, no futuro terão que elaborar estratégias para um cenário possivelmente mais calamitante.
Assim, chegar à indicação ao Oscar pelo Brasil é apenas um dos feitos de “Umbrella“.
Assista Umbrella:
Assinam o texto:
Roberta Mathias: Em constante construção e desconstrução Antropóloga, Fotógrafa e Mestre em Filosofia – Estética/Cinema. Doutoranda no Departamento de Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) com coorientação pela Universidad Nacional de San Martin(Buenos Aires). Doutoranda em Cinema pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Além disso, é Pesquisadora de Cinema e Artes latino-americanas)
Jorge Cruz: advogado desde 2009, graduando em Produção Cultural pelo Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ) e escreve sobre cinema desde 2008.