A Gente se Vê Ontem

A Gente se Vê Ontem

Sinopse:  Em “A Gente se Vê Ontem”, dois jovens do Bronx tentam criar uma máquina de viajar no tempo para o trabalho final da escola, o que faria com que ambos ficassem mais próximos das desejadas e disputadas faculdades de Ciências, como a MIT. A experiência, no entanto, foge ao controle e eles precisam lidar com a realidade: o preconceito racial nos Estados Unidos.
Título Original: See You Yesterday (2019)
Direção: Stefon Bristol
Gênero: Ficção Científica
Duração: 1h 27min
País de Origem: Estados Unidos da América

O  que Você Mudaria?

A jovem Claudette Walker (Eden Duncan-Smith) e seu amigo Sebastian Thomas (Dante Crichlow) são dois jovens talentosos prestes à terminar a High School. Como de costume, procuram acrescentar ao currículo feitos valorosos para que possam se tornar algo das grandes Universidades Estadunidenses. O projeto dos jovens, que vivem no Bronx, é audacioso: a viagem no tempo.

Com  esse breve resumo, “A Gente se Vê Ontem” tinha tudo para ser mais um filme juvenil facilmente esquecido dentre os tantos que a Netflix produz. Contando, em geral com o mesmo elenco e com a mesma temática, as produções para adolescentes e/ou jovens adultos da plataforma são apenas uma série de propostas requentadas com uma ou outra novidade – que, em geral, piora o formato.

Nem todo longa-metragem para adolescentes precisa ser um eterno clichê. Podemos citar: “Meninas Malvadas“(2004), “As Vantagens de ser Invisível” (2012), “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho” (2014) e “Se Enlouquecer, Não se Apaixone” (2010), como alguns que conseguiram fugir de uma superficialidade fácil. Aqui, não se trata de minha predileção, mas de filmes que conseguiram inserir em suas narrativas debates importantes, ora levando para o lado do deboche (como em “Meninas Malvadas”), ora trabalhando questões bem profundas pelas quais passam os adolescentes (como em “As Vantagens de ser Invisível” e “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho”).

Essas obras citadas, apesar de inúmeras diferenças entre si, têm algo em comum. Entendem o adolescente como um super-humano. Não romantizam nem desvalorizam suas questões mais íntimas. Costumo criticar bastante a plataforma Netflix por fazer isso. Todavia, em “Você nem Imagina” (2020), sobre o qual ainda pretendo escrever, e em “A gente se Vê Ontem” eles parecem ter calibrado a dosagem de sensibilidade. Cito somente filmes adolescentes porque é principalmente disso que se trata: a realidade de uma sociedade racista vista através e atravessada pelo corpo de uma jovem negra.

Após um assassinato decorrente da violência policial, Claudette tem motivo para ver seu projeto se transformar em uma proposição pessoal.  É interessante perceber as referências à trilogia “De Volta para o Futuro“, com um professor protagonizado por Michael J. Fox que lê Octavia Buttler, literata negra e estadunidense referência em ficção científica. Não é casual, portanto, que apareça com “Laços de Sangue“.

Se perguntarmos a um jovem negro o que ele mudaria em seu passado, caso pudesse voltar, possivelmente ele responderá: o descaso, os olhares, as duras, os “enganos”, a violência, a morte. O passado de inúmeros jovens negros está marcado pela insegurança. E seu futuro também.

Agora, com um motivo concreto para voltar, Claudette e Sebastian se dedicam ao máximo. Momento em que a história envereda para um lado o qual qualquer apreciador de ficção científica pode imaginar. Cada vez que voltam, algo não funciona. Perde-se uma vida. Negra.

Como no livro de Buttler (guardadas as devidas proporções), os jovens não conseguem sair do seu destino: a morte. Parece que em nenhuma das realidades possíveis todos permanecem vivos.

E, não é assim, a vida de grande parte dos jovens negros estadunidenses? A vida de grande parte dos jovens negros?

De ficção-científica, “A gente se Vê Ontem” só tem mesmo a viagem no tempo.

É o looping da vida real.

Caso o entendamos assim, o filme ganha mais densidade. E não é preciso ler Buttler, é só olhar a próxima manchete de jornal.

VEJA O TRAILER:

Em constante construção e desconstrução Antropóloga, Fotógrafa e Mestre em Filosofia - Estética/Cinema. Doutoranda no Departamento de Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) com coorientação pela Universidad Nacional de San Martin(Buenos Aires). Doutoranda em Cinema pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Além disso, é Pesquisadora de Cinema e Artes latino-americanas.

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