CineOP | Mostra Histórica | TVDO e TV Cubo

CineOP Histórica

CineOP | Mostra Histórica | TVDO e TV Cubo

15ª edição da CineOP nos propõe, dentro da Mostra Histórica, alguns recortes. Dois deles nos leva ao conteúdo produzido por TVDO e TV Cubo, uma videoarte televisiva muito pungente na década de 1980, com a reabertura política brasileira. Segue o texto curatorial geral e o índice da sessão – com pequenas análises da Apostila de Cinema sobre todas elas:

A televisão completa 70 anos de transmissão no Brasil, e a CineOP vai refletir de que maneira um veículo de comunicação de massa efêmero e dispersivo teve, ao longo do período, momentos de invenção e ousadia que permanecem referenciais no audiovisual. O recorte feito pelo curador Francis Vogner dos Reis atravessa os últimos 40 anos com objetivo de pensar parte da intrincada trama que nos trouxe até este momento político, social e midiático em que estamos.

Assim, o destaque é de programas e iniciativas que quebraram a linguagem mais convencional trabalhada pela TV nesses anos todos. Produções feitas para consumo doméstico que, de tão singulares, hoje soam como criações modernas e de vanguarda.

Índice de Fimes
(clique em seus nomes e seja direcionado ao texto)

Avesso Festa Baile
Heróis 2
Mocidade Independente
Quem Kiss Teve
TV Cubo – Programa 1
TV Cubo – Programa 2

Ficha Técnica da Sessão TVDO e TV Cubo


CineOP | Mostra Histórica | TVDO e TV Cubo

Avesso Festa Baile
(Tadeu Jungle, 1983)

TVDO e TV Cubo Avesso Festa Baile

Avesso Festa Baile” é primeira da obras da TVDO apresentadas. Tadeu Jungle (que também dirigiria outras duas produções) conta que se tratava de um produto feito sob encomenda do presidente do canal, a TV Cultura. O documentário, pensado como piloto de uma série, mostra os bastidores do programa Festa Baile, em que o auditório tinha espaço entre mesas para dançar com os convidados recebidos no palco por Agnaldo Rayol e Branca Ribeiro. O filme, apresentado no CineOP em recorte histórica que pensa a televisão em seu auge de popularidade, nos faz refletir sobre alguns fazeres desta linguagem audiovisual.

A primeira delas – e falando de programas de auditório, sendo este o único exemplar do festival a tratar deste nicho – é que a produção era pensava para divertir em duas vias. Tanto o espectador de casa quanto à plateia presente. O que parece óbvio para quem assiste televisão há algumas décadas não o é tanto para as novas gerações, acostumadas a conteúdos que são meras reproduções de fórmulas enlatadas ou uma exploração sem fim da desgraça alheia. Essa dificuldade da TV entreter vem aumentando a desconexão do público com ela – e, sem dúvida, afetando até a consciência de qual seria o estado de espírito do país. A liberdade, mesmo que fragmentada, conquistada nos anos 1980 levou a grandes equívocos mais a frente – principalmente o sensacionalismo e a objetificação latente na década seguinte. Mas, em sua gênese, a TV – como bem dito na parte final por Branca, é uma ferramenta de entretenimento, educação e cultura.

A edição ágil e a despreocupação em contextualizações que servem apenas para cozinhar uma audiência volátil da era do controle remoto, faz desse (e todas as obras produzidas para esta plataforma resgatadas pela mostra) um produto que – revisto anos depois – flerta com o experimentalismo. Trata-se apenas da mudança da linguagem televisiva que, mesmo no meio de algo brega e careta, ainda era muito menos brega e careta do que hoje. (Jorge Cruz)

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Heróis 2
(Tadeu Jungle, 2003)

TVDO e TV Cubo Heróis 2

Heróis 2” é mais uma distopia documental provocativa da TVDO, gestada por um dos mestres dos videoensaio brasileiro, Tadeu Jungle. Usando como fato gerado o já mencionado momento de terra arrasada do governo de José Sarney, a obra é a prova de que pólos ideológicos existem e convivem. Traz o divino e o profano com toda a amababilidade e verborragia que o acompanham. Do poeta, os ideais agnóstico de Nietzsche e a cultura beatnik, de Dom Paulo Evaristo Arns o recado de que “a esperança nasce na hora em que não há solução”. Há, ainda, Waly Salomão – outro poeta, esse real e que tanta falta nos faz.

Dentro do experimentalismo recortante do curta-metragem, é quase impossível não concordar com os discursos. E os não discursos. E as metáforas visuais. Nesse pensamento, somos apresentados ao repórter que nada fala e ao homem que faz sua procissão de fé com uma televisão amarrada nas costas (aos mais jovens, um aparelho desses na década de 1980 pesava alguns quilos a mais do que os de hoje). Jungle toca na ferida da mídia hegemônica emburrecida, alienante – e, ainda assim, fundamental. A avacalhação deveria ser o projeto de futuro do Brasil, como nos leva a entender o poeta. “Heróis 2” é uma tentativa de transferir para as novas mídias (da época) as propostas de nação e tensões sociais como um processo necessário que o Cinema dos anos 1960 e 1970 conseguiu. Assim como Blindagem, banda curitibana que aparece rapidamente em uma apresentação, fez com a música. É difícil negar que contracultura, até hoje, é o que nos levará a uma avacalhação realmente libertadora. (Jorge Cruz)

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Mocidade Independente
(Nelson Motta, 1981)

Mocidade Independente

O TVDO, programa da Bandeirantes na década de 1980, tinha como objetivo apresentar as bandas de sucesso ou underground que começavam a despontar no rock nacional. Uma das década mais emblemáticas do gênero no Brasil, revelou Lulu Santos, Paralamos dos Sucessos, Titãs, Barão Vermleho, Kid Vinil, Plebe Rude, Hojerizah, dentre outros.

Mocidade Independente“, apresentada na CineOP, é uma compilação dos programas que já valeria pela entusiasmada performance de Kid Vinil, que nos deixou em 2017 e por rememorar a fase mais rock de Lulu Santos, que depois foi nadar em águas do pop (não que isso seja ruim).

Assim, esse mix de apresentações assume uma forma bem parecida com os videoclipes que começavam a chegar aqui e que ganharam espaços com a o nascimento da MTV brasileira na década seguinte.

A direção do programa era dividida entre Nelson Motta e Paulo Garcia. Motta, foi um dos desenvolvedores do que seria a linguagem dos vídeos e do universo rock oitentista no país. Assim, essa compilação é uma espécie de arquivo de toda uma década apresentado pela músicas, mas também pela maneira como se vestiam esse artistas e por seus gestuais.

Até mesmo Raul Seixas aparece e Itamar Assumpção nos mostra como podia ser múltiplo nosso rock. Há ainda espaço para a sofreguidão de Angela Rorô em seu melhor momento.

“Mocidade Independente” antecipou o que viria ser a MTV para a geração posterior. A arte de Helio Oiticia também é mostrada e nos convida a pensar um tempo no qual a produção artística no Brasil estava bem mais imbricada por uma luta contra o regime rígido. É só lembrar das companhias de teatro que se formaram conjugando atores, cantores, performers… Todos junto contra a repressão.

Seria interessante revisitar essa produção originária dos 80 e se debruçar por essa faísca que ali existia. Apesar de serem apenas compilações de programas, os trechos da TVDO deixam essa vontade. E ainda nos recordam da habilidade de Nelson Motta. (Roberta Mathias)

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Quem Kiss Teve
(Tadeu Jungle, 1983)

Quem Kiss Teve

A cobertura da turnê da banda Kiss no Brasil é parte desse ensaio televisivo chamado “Quem Kiss Teve“, de responsabilidade de Tadeu Jungle. Parte da TVDO, aplica um olhar nacional sobre as manifestações artísticas das áreas mais popular do rock, principalmente os caminhos do hard rock e do metal. Essa tentativa de compreender uma geração que provocou um choque pelas escolhas musicais (como geralmente acontece), se tornou mais presenta na sociedade brasileira na primeira edição do Rock in Rio.

A reportagem aqui apresentada faz uma abordagem curiosa, da mesma maneira que a TV Globo, quando se viu detentora dos direitos do evento, reproduziu em seus programas jornalísticos. O que Jungle faz é performar quando possível, seguindo a tendência das obras de arquivos selecionadas para essa edição da CineOP de trazer um diálogo semi-experimental em produções feitas para a televisão. Se valendo desse magnetismo causado pela cultura do fã no rock oitentista, “Quem Kiss Teve” ainda nos coloca próximo da banda liderada por Gene Simmons. O que seria o auge de uma reportagem mais tradicional, é usada como ferramenta de provocação. No melhor momento da obra, o apresentador abre mão da continuidade de uma pauta formulaica e decide nos questionar: esse programa está contribuindo alguma coisa conosco?

É uma forma de pensar nossa relação com o audiovisual. Principalmente o televisivo e, ainda mais, em um período em que seu consumo ocupava uma faixa muito grande de nossa rotina. Quanto de nossa sociedade engessada, que reluta em progredir ideologicamente, não deve ser computada à outrora chamada “babá eletrônica”? (Jorge Cruz)

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TV Cubo – Programa 1
(Direção Coletiva, 1986)

TVDO e TV Cubo

TV Cubo” se apresentava como uma alternativa. Em São Paulo, seria sintonizada pelo canal 3, entre a Cultura (canal 2) e o SBT (canal 4), que era lançado alguns anos antes com a expectativa de ser o canal do povo, reproduzindo a popularidade do seu dono, Silvio Santos. Uma alternativa que dificilmente encontramos na televisão aberta – e com as crises (econômicos e de perda de relevância junto ao público) vai transformando esse importante veículo de comunicação, de obtenção de conhecimento e cultura um grande cemitério de ideias.

A imagem do cubo já nos remete a uma visão plural, tridimensional, de diversos lados que se tocam de alguma maneira. O Programa 1, como apresentado na CineOP, se pauta em provocações: a ausência de representatividade indígena, a “greve do gado” (a única não liderada por Lula e pela CUT e que não possui esse nome à toa) e – na maior delas – nos apresenta grandes marcas de consumo como candidatos políticos. Pergunta se votaríamos neles. Quase todos os arquivos que compõem os recortes históricos do festival nos leva aos anos 1980. Não apenas quando a TV foi muito popular – atingindo picos de audiência de mais de 90% dos lares. Era um período em que o Brasil respirava democracia, depois de duas décadas sem poder levar a política para suas interações sociais, as pessoas clamavam por mais, por um terremoto de ideais. A TV cumpriu seu papel em produções como a TV Cubo, que serão aquelas que permanecerão nos registros. (Jorge Cruz)

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TV Cubo – Programa 2
(Marcelo Masagão, 1986-1989)

TVDO e TV Cubo

Anos após o comício das Diretas Já, o segundo programa da TV Cubo selecionado para a Mostra Histórica da CineOP se propõe a retomar o questionamento aos brasileiros – principalmente as camadas mais populares, que tiveram peça fundamental na mobilização a favor da democracia participativa. As entrevistas vão no sentido de saber se as pessoas, em um ambiente de eleição indireta que acabava de promover a volta de um governo civil na figura de José Sarney (após vitória de Tancredo Neves, que não chegou a assumir pois faleceu), têm o desejo de votar diretamente para Presidente da República.

As respostas dizem mais sobre a classe média. Enquanto nas zonas periféricas é nítido o desejo de uma ampliação da participação popular, nos bairros mais abastados já se identifica algumas predileções por tornar o pleito facultativo. Em paralelo, uma fala chama atenção: a possibilidade de se promover o chamado recall eleitoral – que seria a reavaliação do eleitor, no curso do mandato. Como saímos de uma sociedade sedenta pela troca e pelo debate de ideias, a ponto de ser pauta as modalidades de atuação democrática para um país em que intolerância é chamada de opinião cada vez mais nos fechamos em nossas verdades, sem espaço para ouvir o outro?

Talvez a TV Cubo pudesse voltar e nos salvar. Pouco mais de trinta anos depois, somos bem menos republicanos, democráticos, divertidos e criativos do que o conteúdo televisivo que nos chega pelo recorte histórico da mostra de Ouro Preto. Ver Rosemary e o saudoso Henfil falando sobre o futuro na concentração da manifestação é uma homenagem não apenas ao grande artista – que faleceu antes de ver a concretização de suas lutas – e também a um país que ouso dizer não existir mais. (Jorge Cruz)

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Ficha Técnica da Sessão TVDO e TV Cubo

Avesso Festa Baile (Tadeu Jungle, 45min – 1983)
Sinopse: Documentário experimental sobre o programa musical Festa Baile, na época produzido pela TV Cultura de São Paulo, com apresentação de Agnaldo Rayol e Branca Ribeiro. Feito a pedido do então Coordenador Geral da emissora, Fernando Pacheco Jordão, o programa (que seria o primeiro de uma série), como o próprio nome diz seria um olhar diferenciado para eventos muito populares. Ver os clichês com os olhos livres era o mote do programa. “O programa Festa Baile era o preferido do senhor Renato Ferrari, então presidente da Tv Cultura, e ele não gostou de ver o seu Avesso, e o proibiu de ir ao ar”, segundo relato do diretor Tadeu Jungle.
Heróis 2 (Tadeu Jungle, 30min – 2003)
Sinopse: Vídeo experimental panorâmico que registra as vibrações e antagonismos de um mundo em crise. De caminho. Um poema épico urbano que traduz em imagem e som o vazio de um tempo: Brasil, asfalto, anos 80. Através da atuação de vários personagens fictícios, dos depoimentos do poeta anarquista Roberto Piva, do Cardeal D. Paulo Evaristo Arns e do recorte de situações do real, monta-se um painel vivo desta era incerta e líquida, retomando e revendo a vibração revolucionária dos anos 60/70. Fecha a trilogia iniciada com Frau e continuada com Non Plus Ultra e um ciclo de vídeo de autor.
Mocidade Independente (Nelson Motta, 20min – 1981)
Sinopse: Estreia da TVDO em rede nacional, veiculado aos sábados na TV Bandeirantes. A TVDO dirigiu, editou e performou em algumas cenas. Por seu formato fragmentado, tornou-se um marco inovador da TV brasileira. Presença de Itamar Assumpção, Raul Seixas, Jorge Mautner, Gang 90 & Absurdetes, e outros. Este é um compacto dos 8 programas originais. Há registro de programas completos.
Quem Kiss Teve (Tadeu Jungle, 28min – 1983)
Sinopse: A vinda do conjunto KISS para o Brasil abordada de uma maneira pouco usual para a TV da época. Esse video foi feito como um piloto para a Tv aberta. Entrevistas com integrantes da banda são feitas fora do protocolo e o entrevistador Tadeu Jungle chega a pegar na língua do Gene Simmons. Mais do que a banda em si, o foco do filme são os fãs que cantam num inglês incompreensível na entrada do Estádio do Morumbi, junto com vendedores ambulantes, ambistas e policiais. O video foi apresentado no Festival Videobrasil.
TV Cubo – Programa 1 (Coletiva, 9min – 1986)
Sinopse: Antes de começar o programa a TV Cubo fez uma interferência no som dos canais 2 (TV Cultura) e 4 (SBT) anunciando: “Tele – humanos em geral, boa noite. Pedimos desculpas mas estamos invadindo o ar de seu lar. Pedimos que sigam atentamente as nossas instruções. Está entrando no ar a TV Cubo”.
TV Cubo – Programa 2 (Marcelo Masagão, 13min – 1986-1989)
Sinopse: Neste episódio, a TV Cubo resgata imagens do comício pelas Diretas Já, que em 25 de janeiro de 1984 reuniu 300 mil pessoas na Praça da Sé, em São Paulo e pergunta: “Você quer votar para presidente?”.
Classificação: Não recomendada para menores de 14 anos

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A Apostila de Cinema é uma iniciativa de promover o debate sobre o cinema e questões pertinentes ao mesmo levantando análises culturais, sociais e estéticas que consideramos centrais para o pensamento crítico da Sétima Arte Contemporânea.

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