Do Not Split

Do Not Split Crítica Documentário Hong Kong China Oscar 2021 Pôster

Sinopse: Em 2019, Hong Kong foi abalada pelos maiores protestos desde que a Grã-Bretanha devolveu a área à China em 1997. Esta é a história dos protestos, contada por meio de uma série de manifestações de moradores locais que se transformam em conflito quando policiais altamente armados aparecem no local.
Direção: Anders Hammer
Título Original: Do Not Split (2020)
Gênero: Documentário
Duração: 35min
País: Noruega | EUA

Do Not Split Crítica Documentário Hong Kong China Oscar 2021 Imagem

Lados Escolhidos

Exibido no Festival de Sundance de 2020, o documentário “Do Not Split” dá visibilidade aos dissidentes da colonização chinesa a Hong Kong, área explorada pelos ingleses até o final do século XX. Dirigido pelo jornalista norueguês Anders Hammer, a co-produção de seu país com os Estados Unidos promove o discurso de liberdade ao oprimido do eixo Europa-América do Norte, que acontece sempre que o opressor contraria alguns de seus interesses, notadamente econômicos.

O curta-metragem documental, indicado ao Oscar 2021 em sua categoria, acompanha o grupo de manifestantes entre setembro e novembro de 2019, quando a intensidade das manifestações motivou Carrie Lam, designada como Chefe do Executivo de Hong Kong, a aplicar uma lei marcial, que endureceu a repressão – antecipando a leitura do próprio grupo, que ia às ruas pelo risco de terem suas liberdades individuais restritas, iniciando pelo direito à se expressarem em oposição ao governo estabelecido. Muitas críticas à obra surgiram pela omissão de informações. Em uma delas, a de que não houve qualquer diminuição da força democrática em Hong Kong, que teve seus governantes por mais de um século escolhidos pelo governo britânico. Já na montagem, cenas como a de um vídeo que apresenta um jovem sendo baleado pela polícia não inclui o momento em que ele toma a iniciativa de atacar primeiro – o que não justifica a repressão desmedida, mas tira a possibilidade da análise crítica sobre a alegação de legítima defesa trazida oficialmente.

Hammer aplica o olhar da mídia alternativa contemporânea em “Do Not Split“. Reflexo de sua experiência no Afeganistão, para onde se mudou em 2007 para cobrir a chamada Guerra ao Terror. Antes de destrinchar os interesses daquelas pessoas, nos alimenta de imagens fortes de conflito. Uma juventude capitalista que, ironicamente, inicia sua representação nas telas depredando uma filial do Bank of China, uma atitude assistida pelas forças policiais, ao contrário do recrudescimento possível daquelas manifestações de 2013, que tratamos há algumas semanas ao revisitar “Com Vandalismo” (2013), produção da Nigéria Filmes.

O cerco aperta quando parte da população pró-China decide se expor, reflexo de uma sociedade onde o poder de informação e comunicação estão, ao mesmo tempo, facilitados e nebulosos. Enquanto os opositores usam máscaras para proteger suas identidades (o que, mais adiante, surge como uma escolha acertada diante da nova legislação), aqueles que estão do lado do poder formal não temem represálias. Quase como uma fina ironia na luta pelo direito a ser comandado pelo capital, um dos momentos mais tensos do filme acontece dentro de um shopping center. Quando as demandas começam a ser definidas com mais clareza, fica mais fácil para o espectador menos informado receber os anseios do grupo. Na principal delas, a universalização do voto, para todos os cargos de comando daquele território.

Ao se deslocar um pouco mais no tempo, o cineasta transforma o curta-metragem em uma produção mais tradicional. As manifestações avançam para dezembro de 2019 e janeiro de 2020, mas a lei de segurança nacional é “ajudada” pelo avanço da covid-19, que tornou arriscado ir às ruas e se aglomerar. Para o olhar da elite ocidental, a China segue em um dúbio caminho entre antagonista e parceira. O país soube colocar na mesa uma dependência econômica mundial e as questões de segurança nacional são tratadas diplomaticamente com menos intensidade do que nações vistas como adversárias da liberdade e da democracia. A China deve vetar parte da transmissão do Oscar 2021 para não dar visibilidade ao filme, por exemplo.

Durante a última Mostra SP, Ai Weiwei montou à distância o impressionante “Coronation” (2020), que nos colocou no olho do furacão do novo coronavírus e nos mostrou as providências que Wuhan tomou para conter o avanço da doença. Muitas delas aplicando uma política de restrição à liberdade individual. “Do Not Split” é outra ponta dessa história, que pode ser entendido como um domínio cada vez mais inevitável da China ou um vespeiro robusto, a ponto de atacar valores que o Ocidente alimenta de forma hipócrita para estabelecer há séculos o seu domínio.

Assista “Do Not Split” (com restrição de idade):

Clique aqui e leia críticas de outros indicados ao Oscar 2021.

Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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