E Amanhã… O Mundo Todo

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Sinopse: Em “E Amanhã… O Mundo Todo”, Luisa é uma dedicada estudante de direito, e militante, no primeiro semestre da faculdade. Quando se une a outros alunos para lutar contra o fascismo, a situação fica bastante complicada, tendo ela que decidir se vale a pena prosseguir com sua luta, colocando em risco sua família e amigos.
Direção: Julia von Heinz
Título Original: Und morgen die ganze Welt (2020)
Gênero: Drama | Romance | Crime
Duração: 1h 51min
País: Alemanha | França

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Fascismo Não é Opinião

Exibido no último Festival de Veneza, o drama alemão “E Amanhã… O Mundo Todo” é uma das estreias mundial da plataforma de streaming Netflix. Uma obra que traz a prática de uma luta que tende a ganhar força na sociedade nos próximos anos – ou estaremos condenados a regredir ainda mais. A diretora Julia von Heinz aplica um olhar sobre a juventude antifascista e as complexas dinâmicas de quem difere dos mecanismos de defesa pelos quais fatalmente precisaremos exercer daqui em diante.

O filme é centrado na figura de Luisa (Mala Emde), uma estudante de Direito no primeiro semestre da faculdade. Ela começa a se envolver com grupos que organizam protestos contra a escalada de intolerância na comunidade alemã, uma extensão da xenofobia que assola a Europa, potencializada pelo aumento na chegada de refugiados e outros imigrantes. Há um aspecto estético que precisa ser colocado em destaque logo no início da análise. A cineasta usará por quase todo o tempo a câmera na mão, com um forte senso de urgência.

Heinz entende que precisa trazer algo próximo de uma guerra civil em curso. Até porque, no campo ideológico, ela já existe. Isso pode tornar a experiência um pouco cansativa para parte dos espectadores. Por outro lado, o roteiro (da própria Julia, ao lado de John Quester), inverte a dinâmica comum a produções pensadas para o circuito de festivais. Testemunhamos uma abordagem direta, com a apresentação das questões, para depois criar as representações por trás desta trama. Isso torna a obra mais palatável e seus discursos mais diretos.

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E Amanhã… O Mundo Todo” parte da ideia da defesa à democracia e ao Estado de Direito previsto na Constituição Alemã. Um caminho natural que aqueles que chegam nos cursos jurídicos ainda jovem perseguem. Digamos que, na teoria, esta ciência é uma das mais envolventes e capaz de gerar uma visão romântica sobre ela. O que Luisa encontrará na prática será bem diferente desse ideal de resistência em prol de uma sociedade justa e igualitária.

Diante da nova onda fascista que vem se consolidando no mundo, os preceitos do antifascismo começam a ser revisitados com mais profundidade. Isso não impede que parte dos novos militantes se filiem às causas com motivações bem menos nobres (ou, digamos, mais confusas, difusas, individuais). O longa-metragem permite essa abordagem, em uma representação que soa como algo festivo. Há quem evite a violência como premissa ou, até mesmo, uma consequência por vezes inevitável. O problema é equilibrar e administrar esses interesses quando se é uma jovem cheia de energia.

Até chegarmos nessas interações e dilemas, pequenas sequências trazem a sala de aula como ambiente laboratorial de debate. E permite questionamentos extensíveis a quem não vive a realidade da Alemanha, por exemplo. Em que momento uma ação direta se revela necessária? Diante do risco de uma ruptura democrática, em que grau a comunidade terá que se organizar para não se tornar impossível certas articulações? O problema é que a própria lei que sugere a defesa da democracia prevê seus obstáculos. A Constituição Alemã exige o “esgotamento de todas as instâncias”. Sistema de freios e contrapesos, certo? O mesmo problema que passamos aqui, já que nunca sabemos até quanto esticar a corda e confiar nas instituições se regulando.

A obra vai mostrando uma Luisa cada vez menos convicta e crente no ordenamento jurídico do próprio país. Esse é outro caminho que aqueles desapontados com o Direito passam, mas ela parece ter antecipado essa frustração por ir com muita sede ao pote. Em uma realidade bem mais frenética, de pautas se empilhando – do fascismo à xenofobia, da proteção aos refugiados ao veganismo – a personagem de Mala Emde parece atropelada por um ciclo de demandas e decisões que precisa tomar, sozinha ou em grupo.

O filme nos mostra, então, que podemos errar tentando acertar. É normal e precisa ser superado sem rusgas. Há um mal maior a ser confrontado. Além disso, há muito mais de espera, discussão e reflexão do que imaginamos quando somos jovens. A ação direta é apenas uma das formas – e a violência (além da contra violência) é um aspecto a ser observado. Sobre o manto da proteção à “segurança nacional“, os Estados do Ocidente têm misturado frequências, tratando luta legítima como vandalismo e fascismo como opinião. Por mais que pareça exaustiva a experiência de “E Amanhã… O Mundo Todo“, talvez seja uma das produções mais necessárias que chegou à Netflix nos últimos tempos.

Veja o Trailer:

 

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

1 Comment

  1. Vi pela www várias críticas sobre o filme em tela. Todas elas superficiais e piegas. Incapazes de entender a emergência dos movimentos antifascistas, assim como suas limitações inerentes ao seu pacifismo xarope (um “não podemos agir igual aos que combatemos”, rasteiro e que nivela tudo de forma simplista a uma mera questão de “métodos”). Vejo que o Jorge Cruz Jr., foi o único capaz de perceber o semblante de perplexidade da protagonista diante dos limites dos movimentos pacifistas (e, um tanto quanto, festivos), assim como a da própria fragilidade de um ordenamento legal contraditório que acaba tornando permissiva a relação institucional entre o estado burguês e o fascismo, com ambos se auxiliando e juntando força no combate aos antifascistas.

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