Entre Mortes

Entre Mortes Hilal Baydarov Filme Crítica Mostra SP Pôster

Logo Mostra SP 2020 Sinopse: Em “Entre Mortes”, Davud é um jovem incompreendido e inquieto em busca de sua “verdadeira” família, aqueles que ele tem certeza de que trarão significado e amor para sua vida. Quando, ao longo de um dia, o rapaz experimenta uma série de inesperados incidentes que cada vez têm como resultado uma morte, memórias invisíveis, narrativas e preocupações vêm à tona. Davud se vê em uma jornada de descoberta, até que, finalmente, passa a aceitar que viver em perigo é seu destino, e que a morte sempre será mais forte do que suas próprias narrativas. Davud, enfim, retorna ao lugar onde sempre viveu. Lá, ele descobre que o amor o espera. Mas talvez seja tarde demais.
Direção: Hilal Baydarov
Título Original: Səpələnmiş Ölümlər Arasında | In Between Dying (2020)
Gênero: Drama | Mistério
Duração: 1h 28min
País: Azerbaijão | México | EUA

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Feminino Como Referência

Entre Mortes“, exibido na mostra competitiva do Festival de Veneza e agora parte da seção Perspectiva Internacional da 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, é uma das mais curiosas formas de metaforizar as dificuldades de entendimento de um protagonista sobre a referência feminina de sua vida. Exagerando um pouco no estranhamento, o jovem diretor azerbaijano Hilal Baydarov deverá sofrer pesadas críticas daqueles que buscam uma lógica dentro da própria obra. O que o cineasta faz aqui é se apropriar de uma narrativa até desgastada, em que uma série de eventos inesperados acontecem no mesmo dia. Faz isso criando nas duas pontas a relação do protagonista Davud (Orkhan Iskandarli) com sua mãe.

Antes disso, um prólogo poético, de pouca relação com os acontecimentos e que por vezes passa despercebido. Ali reside todos os problemas que movem o personagem. Ele culpa a mãe pela morte do pai e nos apresenta uma narradora que o faz aceitar a sentença: “fui manchado de sangue para me manter puro“. A mera dúvida sobre o desenvolvimento desse passado já é o suficiente para intrigar o espectador durante o período de projeção. Todavia, o diretor cria novas personalidades para aquela narradora, que antecedem os novos encontros com figuras femininas no desenrolar da narrativa. Todas essas relações efêmeras se marcarão pela forte carga de violência.

Ao desdobrar a mãe de Davud em várias, das mais diversas idades e atrações para com ele, “Entre Mortes” nos instiga a refletir quem, além de mãe, aquelas mulheres que têm o fardo de nos criar, são. Sem direta relação com a vida da progenitora, ele pratica um exercício de empatia. Testemunha justiçamentos relacionados a violências domésticas e se envolve de forma romântica com uma jovem insegura de si. Baydarov se vale de planos bem abertos, quase sempre parados. Usa as árvores como elemento e chega a contrapô-las como se em diferenças estações estivessem (uma cheia de folhas e outras sem nenhuma). Entrega visualidades para seu protagonista atingir o edificante objetivo. Cria fricções entre personagens que não estão na mesma sintonia e ainda adiciona um elemento de suspense com a sub trama de um grupo de quatro homens que acompanham todos os passos de Davud.

Aqueles quatro Cavaleiros do Apocalipse parecem prontos a confrontar o jovem a qualquer instante. Nunca o fazem, parecem perceber que a vida lhe servirá como escola. Um curso intensivo de um dia sobre a complexidade dos humanos e a efemeridade da vida. Aqueles abutres se contentarão em assistir aquela empreitada imprevisível. O elemento de estranhamento que mais se destaca – provavelmente de forma positiva ou negativa, de acordo com o gosto pessoal do espectador – é o deboche narrativa, uma linha favorável à naturalização da morte como elemento. Nada demais para os tempos em que vivemos, mas – exposto de forma tão crua – capaz de afastar parte do público de um envolvimento com a jornada do protagonista.

Toda a paciência que ele não dedica à mãe, ele expressa da porta de casa para fora. Ironicamente, ele ouve que essa é nossa maior virtude, um dom de Deus. Com tanta resiliência praticada na rua, ao voltar aos braços da mãe, ele será outro homem. Davud passa o tempo todo buscando sem saber o que buscar e encontra muita coisa. Até o amor perdido pela mãe. “Entre Mortes“, então, nos pune em um epílogo que desmonta todo o aprendizado do personagem. Transforma aquele dia enriquecedor de experiências em algo perdido. Entretanto, concede a nós a possibilidade de fazer diferente.

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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