“Freaky: No Corpo de um Assassino” chegou ao Telecine. Leia a crítica.
Sinopse: Depois de trocar de corpo com um assassino em série, uma jovem estudante descobre que tem menos de 24 horas antes que a mudança se torne permanente.
Direção: Christopher Landon
Título Original: Freaky (2020)
Gênero: Terror | Thriller | Comédia | Fantasia
Duração: 1h 39min
País: EUA
Corpo x Desejo
Chegando esta semana no catálogo do Telecine, “Freaky: No Corpo de um Assassino” é mais uma produção da Blumhouse, que parece ter encontrado a fórmula para equilibrar a releitura de representações clássicos dos gêneros de terror e horror com uma linguagem que agrada o público mais jovem. Dirigido por Christopher Landon, o mesmo da franquia “A Morte te Dá Parabéns” (2017) – o terceiro está chegando – aqui há uma adição de um elemento conhecido das narrativas tradicionais dos teen movies. Se os dois “dias da marmota” de Tree (Jessica Rothe) se apropriavam da ideia do looping eterno (pelo qual já falamos em nosso texto de “Palm Springs“, de 2020); aqui a revisitação foca na troca de corpos, que, na historiografia com cinema mundial, já acometeu de Lindsay Lohan a Tony Ramos.
Ao contrário de “Rua do Medo: 1994 – Parte 1“, lançamento da semana da concorrente Netflix, a Blumhouse, como sempre, vai além de todos essas releituras, reapropriações e revisitações que tornaram nosso primeiro parágrafo tão repetitivo. O exemplo está no ato inaugural de “Freaky: No Corpo de um Assassino“. Em uma quarta-feira, dia 11 (fonte parecida com aquela que introduzia uma nova história de Jason), a loira indefesa, a clássica final girl é sumariamente assassinada nos corredores de um shopping às escuras. Não há tempo a perder em recriações de velhas formatações. Se a ideia é ser referencial, que o faça em profusão, assim como o sangue jorrando a cada esquina da produção estrelada por Kathryn Newton.
Ela é Millie, vítima do serial killer na quinta-feira, dia 12. Porém, ao usar um artefato mitológico no golpe, o chamado Carniceiro (Vince Vaughn) acaba trocando de corpo com a adolescente. A jovem terá até à meia-noite da sexta-feira, 13, para repetir o feito, senão ficará no corpo de um assassino em série pelo resto da vida. Uma fagulha de fantasia que faz toda a diferença e permite que se dialogue com identidade de gênero e corporalidade. Se não de forma aprofundada ou brilhante, bem menos enviesada do que longas-metragens como o sueco “Queens” (2021). De quebra, lembrou minha distante adolescência ao resgatar o plot de “Garota Veneno” (2002), besteirol protagonizado por Rob Schneider que não vou dizer que assisti no cinema para não entregar a idade.
O rosto conhecido de Vaughn é capaz de atrair tanto uma leitura menos exagerada de sua representação de uma adolescente, quanto torna mais aceitável a humanização de um matador pelos colegas de turma da menina. Já Newton vai bem na sua transformação, que a torna mais sombria ao mesmo tempo que magnetiza representantes mais populares do colégio. Quanto ao horror, o estúdio que tem carregado parte desse tipo de narrativa nas costas não decepciona – e faz o corpo destroçado do professor pela aluna ser mais assustador do que a sequência parecida de “Mortal Kombat” (2021) envolvendo Kung Lao (Max Huang).
Com uma trama bem estabelecida, há espaço para cenas que fogem da dinâmica habitual de impulsionar o arco principal para frente. Na mais divertida delas, Millie, no corpo da carniceiro, passa a flertar com a própria mãe, em uma conversa sobre a perda do marido e as dificuldades de se relacionar com as filhas depois do fato. Uma forma sucinta de tratar da projeção sobre a vida do outro quando não estamos envolvidos emocionalmente – e as possibilidades de passarmos mensagens que nossos corpos e nossas posições em certas relações não permitem. Uma quebra cômica mais criativa e capaz de contribuir, o que se torna quase um evento no audiovisual replicante dos últimos tempos.
A dupla caça, contra o assassino no corpo da adolescente e para recuperar a adaga, segura nossa atenção até o fim. No clímax, Landon ainda cria um dilema muito interessante sobre a possibilidade daqueles corpos serem ressignificados para sempre. Isso torna o desenvolvimento ainda mais completo, já que temos em um lado Millie, no corpo de um assassino e o carniceiro, que guarda em sua personalidade o desejo de um serial killer. A ideia de que se precise conviver com um corpo que não te pertence, pelo qual você não se identifica, faz gerar um outro aspecto: o instinto. Talvez a criação mais interessante do gênero que assistimos desde “Relíquia Macabra” (2020), também parte do catálogo do Telecine e o qual indicamos.
Claro que uma proposta que abusa do referencial só terminaria com a velha ideia de que vilão de filme de terror nunca morre. “Freaky – No Corpo de um Assassino” nos conquista e deixa de bônus um epílogo empoderado e sanguinolento, como amamos assistir. Mesmo concluindo com honras suas provocações, é difícil não imaginar uma continuação a caminho.
Veja o Trailer: