Sinopse: O legado de Stanley Kubrick para o cinema é imensurável. Sua obra e seus filmes são estudados por admiradores e cineastas, todos em busca de respostas que o diretor foi notoriamente reticente em dar. Embora ele esteja entre os cineastas mais importantes que já existiram, a chance de ouvir as próprias palavras de Kubrick era algo muito raro. Por meio de Michel Ciment, crítico de cinema e especialista na carreira do cineasta, em “Kubrick por Kubrick” temos acesso a uma série de entrevistas feitas com o realizador durante cerca de 30 anos.
Direção: Gregory Monro
Título Original: Kubrick by Kubrick (2020)
Gênero: Documentário
Duração: 1h 13min
País: França
Amor Antigo
Quase sempre aquelas pessoas que se interessam por cinema, para além do entretenimento, em algum momento alcançam e se encantam por Stanley Kubrick. É provável, inclusive, que ele seja um dos primeiros amores dentre os realizadores mais celebrados do audiovisual. A reclusão era uma característica que sempre serviu de base para a mitificação do cineasta – e não é dele exclusivo, outro ídolo da juventude que sempre se tornou ainda mais curioso para mim foi o escritor J.D. Salinger. Quando o diretor morreu em 1999, por exemplo, eu era um cinéfilo adolescente e ele já faz fazia parte desse imaginário clássico.
“Kubrick por Kubrick“, documentário feito para a televisão francesa dirigido por Gregory Monro, traz para uma nova geração as formas de expressão do diretor. Dentro da seção Perspectiva Internacional da 44ª Mostra Internacional de Cinema se São Paulo, faz parte daquelas obras sobre a história do cinema sempre selecionadas. Talvez até uma tentativa de criar um caça-níquel cult, que reúna parte do público que, em uma maratona de muitos riscos na hora de escolher os filmes, opta por algo mais familiar. Mesmo assim, não deixa de ser um longa-metragem de relevância.
Ainda mais no Brasil, onde a única edição do livro de Michel Ciment (“Conversas com Kubrick”) encontra-se esgotada e sem previsão de reedição – faz parte do acervo da saudosa Cosac Naif. Concedendo poucas entrevistas na carreira, uma das raras exceções aconteceu para este crítico e pesquisador de cinema, que gravou tais conversas. Com base nelas, Monro compõe seu documentário. Ignorando aquelas longas sequências em que são mostradas cenas dos filmes – técnica de montagem que toca nossos corações, mas se revela pouco eficiente dentro da obra – o resultado é um longa-metragem sintético. Em conjunto com as falas de Stanley, reportagens com elenco e equipe de produção dos grandes filmes.
Não espere grandes revelações sobre o norte-americano que, radicado em Londres, exercia seu ofício sem sair da cidade. Trata-se de uma biografia simples, atacando diretamente os pontos principais da cinematografia de Kubrick. Não segue cronologias ou se molda a partir da notoriedade das produções. Prefere criar pontes entre as obras. Por isso, Barry Lyndon (1975) é o primeiro que surge, por conta da sua famosa iluminação naturalista e com uso de velas. Reflexo do interesse precoce do diretor pela fotografia, onde desempenhou seus primeiros trabalhos. Da seleção de Ryan O’Neal para o papel principal, chega à escalação de Malcolm McDowell para dar vida a Alex em “Laranja Mecânica” (1971) – e assim por diante.
Com essas conexões, no estilo de fita-banana, “Kubrick por Kubrick” relembra as maneiras pelas quais conhecemos o diretor. O perfeccionismo técnico e as maneiras como ele tirava algumas pessoas do elenco de suas zonas de conforto para, após dezenas de takes, obter o resultado desejado. Sterling Harden, de “Dr. Fantástico” (1964) fala sobre isso, mas inesquecível mesmo é a história – não trazida de forma completa – de Shelley Duvall em “O Iluminado” (1980). Uma escolha que ajuda na composição panorâmica da carreira é não atualizar depoimentos, um caminho que levaria a uma ode que contribuiria pouco ao documentário. Sem o distanciamento temporal e o trauma da morte, os atores trazem sensações mais reais – apesar de que não podemos ignorar que parte daqueles materiais faziam parte do período de divulgação dos filmes.
Porém, os amantes do trabalho de Stanley que esperam chegar ao final da sessão com novas informações podem se frustrar bastante. “Kubrick por Kubrick” é um documentário de reencontro. Baseado nas poucas falas que temos acesso do cineasta e com pessoas do círculo íntimo dispostas a manter a imagem por ele construída, sobre a nós exatamente o que ele queria que se tornasse legado: o poder de sua criação.
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