Lemebel

lemebel

Sinopse: Acompanhamos no documentário de Joanna Riposi Garibaldi a própria construção do filme com performances sugeridas por Pedro e com slides e vídeos antigos que nos transportam para os momentos das performances. “Lemebel” consegue ser quase tão plural quanto o artista que retrata.
Direção: Joanna Reposi Garibaldi
Título Original: Lemebel (2019)
Gênero: Documentário
Duração: 1h 30min
País: Chile / Colômbia

lemebel_1

“Irreal y Con Garbo”

“Lemebel”, documentário que integrou a 43ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, chega agora à plataforma Now. Pedro Lemebel, artista queer sul-americano – escritor, artista visual, performer – para nosso prazer, rende um bom documentário nas mãos de Joanna Reposi.

Além de ser Pedro Mardones (sobrenome do pai) e Pedro Lemebel, nome adotado por conta da inventividade de sua avó que fugiu e não queria ser reconhecida, Pedro foi muitos. O sobrenome que carrega o respeito que tinha pelas mulheres de sua família, com as quais diz ter aprendido tudo, diz muito sobre Pedro – ou os Pedros.

Capaz de se construir e reconstruir, como uma boneca russa, o artista inventava demandas, espaços e (re)configurações a partir do próprio corpo. A performance de Pedro era seu corpo. Dele (e com ele) fazia o que queria. Talvez, por isso o fogo, elemento que destrói, mas deixa a possibilidade de reconstrução, seja tão recorrente em sua obra.

Até os últimos momentos de vida – como em uma das primeiras imagens do filme, que flagra o artista saindo do hospital duas semanas antes de morrer – Pedro escolher ser múltiplo.

Assim, as projeções de slides na antiga casa, ora comandadas por ele, ora organizadas por Reposi após sua morte, são como lápides de alguém que estava sempre morrendo para renascer no mesmo/outro corpo.

Apesar de dizer não se achar bonito (e pode até ser que não se achasse mesmo), Pedro era uma figura poderosa. Não de uma beleza tradicional, mas de uma beleza convidativa. Minto. Quase convocatória! Pedro nos atraia com seu corpo – e , isso creio que ele sabia muito bem.

“Lemebel” retrata esse caráter de sedução provocado por seu corpo. É possível que essa capacidade de reconstrução continua funcionasse como um imã que nos fazia observar a escavação de seu próprio corpo.

O filme, aliás, também traz um pouco dessa ideia. Em algum momento, nos sentimos revirando os slides, os discos, os armários de Pedro. A proximidade estabelecida entre ele e a diretora faz do documentário um registro único, porém, familiar.

Conseguimos nos conectar com cada uma das facetas que Lemebel cria para si mesmo. Ele mesmo diz que, em partes, enxerga cada performance como um corpo distinto ou como muitos ao mesmo tempo. É difícil explicar o obra de Pedro não somente por sua característica performática, mas porque parecem muitos trabalhos ao mesmo tempo – em construções de personagens que só poderiam mesmo vir de escavações profundas.

Irônico e fascinante, Pedro nos captura. Assim como capturava os que acompanharam o iniciar de sua obra ainda nos anos 80 com o grupo “Éguas do Apocalipse” – nome que, convenhamos, combina muito com os tempos atuais.

É importante dizer que a figura de Pedro para o movimento artístico LGBT (para usar a sigla da época) foi mais que libertadora. Pedro foi um artista que performou, desenhou e lutou sem ter medo das palavras e das transformações.

Arqueologia da utopia social“, disse o artista sobre uma de suas obras. “Psicanálise“, disse sobre o processo de se rever nas performances.

Talvez a obra de “Lemebel” seja mesmo um pouco de tudo isso para a América-Latina como um todo. Aquele que teve forças para ousar até os últimos momentos de vida deixou nos registros das obras o corpo como performance viva.

Veja o Trailer:

Em constante construção e desconstrução Antropóloga, Fotógrafa e Mestre em Filosofia - Estética/Cinema. Doutoranda no Departamento de Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) com coorientação pela Universidad Nacional de San Martin(Buenos Aires). Doutoranda em Cinema pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Além disso, é Pesquisadora de Cinema e Artes latino-americanas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *