Sinopse: O último passeio de senhora pela cidade velha de São Luís revelando o desamparo de ambos sob o signo de um tempo injusto.
Direção: Frederico Machado
Título Original: Litania da Velha (1997)
Gênero: Drama
Duração: 17min
País: Brasil
Sem Choro ou Despedida
Parte do “Festival Estação Virtual – 35 anos de Cinema Brasileiro” e também disponível no portal Curtadoc, “Litânia da Velha” (1997) pode ser entendido como uma cruel e real poesia. Baseada no poema de Arlete Nogueira da Cruz de mesmo nome, o que vemos em imagens ou palavras é a decadência total de uma aposta que, desde o início, mostrava suas incoerências.
“Litania da Velha” personifica nessa senhora andarilha todas as angústias e morbidez do sistema criado para destruição. Em sequências que às vezes soam ou não como reais, experimentamos o amargor da solidão, da chuva, da terra, da vulnerabilização.
Assim, uma voz em off bem ao estilo dos documentários clássicos acompanha um corpo franzino pelas ruas de São Luis do Maranhão em seu centro histórico sem sabermos qual será seu destino final – por mais que esse seja imaginado.
“Litânia da Velha”, de Frederico Machado, já pode ser considerado como um desses novos clássicos por trazer em si diversas feridas que carregamos enquanto país ao conseguir conjugar em seus dizeres de forma poética, toda dureza que aquele corpo convoca. Quantas contradições possíveis em tão poucas sequências? O curta-metragem é uma metáfora nada suave para nossa realidade.
O corpo enrugado da andarilha combina também com a cidade de São Luis e, entre aquilo que nos foi deixado como herança arquitetônica e os destroços que viramos justamente advindos dessa herança, recordamos de toda fragilidade que nos constituiu.
Há que se ressaltar a montagem de Murilo Santos e Flavio Zettel que com seu zig-zig nos deixa um também embriagados de dor. A indefinição percorre as ruas de São Luis. Assim, podendo fazer referência à vida da maioria de nós, que vivemos sem saber como será o dia de amanhã. Tempo, silêncio e sufoco. Como na poesia.
“O tempo consome o silêncio e mastiga vagaroso a feroz injustiça.
O campo se perde embebido em jenipapos para a manhã sufocada.
Os bois da infância ruminam sua paciência e espreitam essa audácia.
— O tempo dói na ferida aberta da recordação.
A velha cata os pertences no quarto que exibe a sua miséria.
A sacola esconde improvisos da vida e ganhos equivocados.
A rua se reserva precária aos passos vacilantes, entre lembranças.
A pobre mulher sai maltrapilha, sem pressa, carregando brio e saudade.”
Arlete Nogueira da Cruz
Assista Litania da Velha, pelo canal oficial da Lumes Filmes: