Loucos por Justiça

Loucos por Justiça Crítica Filme Pôster

Sinopse: Em “Loucos por Justiça”, o militar Markus (Mads Mikkelsen) volta para casa para cuidar de sua filha adolescente, Mathilde (Andrea Heick Gadeberg), depois que sua esposa morre em um trágico acidente de trem. A relação entre pai e filha se torna ainda mais forte já que agora compartilham uma perda em comum. No entanto, quando Markus conhece um dos sobreviventes do acidente, o gênio da matemática Otto (Nikolaj Lie Kaas), ele começa a desconfiar que a morte de sua esposa não foi uma mera casualidade do destino.
Direção: Anders Thomas Jensen
Título Original: Retfærdighedens Ryttere (2020)
Gênero: Ação | Drama | Comédia
Duração: 1h 56min
País: Dinamarca | Suécia | Finlândia

Loucos por Justiça Crítica Filme Imagem

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Pensado para o público em geral, “Loucos por Justiça” estreia nesta sexta-feira nas plataformas de streaming por locação (os VODs Claro Now, Vivo Play, Sky Play, iTunes/Apple Tv, Google Play e YouTube Filmes) com possibilidades de quebras de expectativas positivas e negativas. Para aqueles que imaginam uma produção de ação desenfreada, motivada pela caracterização do ator Mads Mikkelsen (o rosto por trás de “Druk – Mais uma Rodada“) no papel de Markus, afastado de seu trabalho como militar após a morte da esposa, talvez o longa-metragem dirigido por Anders Thomas Jensen perca pontos com sua forma cadenciada, de priorização da construção dramática e do uso da comédia como ferramenta – mais até do que o thriller.

Contudo, a grande qualidade do filme é essa fuga da fórmula, é a consciência de que poderia fazer mais do que o compilado de sequências metodicamente pensadas para fluir uma narrativa de vendeta. Parte de um mote que abre o leque de possibilidades, até mesmo enquanto leitura extensiva da obra. Nele, Otto (Nikolaj Lie Kaas) aparece no prólogo em coprotagonismo. Ele é um pesquisador que tenta provar que coincidências não existem e é possível prever todos os acontecimentos com base na análise da cadeia de escolhas que nos move. Uma ideia de que o destino não encontra espaço para o acaso – e pondo em dúvida até mesmo a existência de algo superior às nossas relações humanas.

Ao perder o emprego por não conseguir ser objetivo em uma apresentação, ele cede seu lugar no metrô à mãe de Mathilde (Andrea Heick Gadeberg). Após uma explosão, a pessoa ali sentada morre – e Otto e a menina sobrevivem. Apesar da imprensa vender inicialmente a tese de um ataque terrorista, o homem parece disposto a provar que ocorreu ali o resultado de uma disputa de gangue, os Riders of Justice, que dão nome ao filme. Ele une forças a Markus, igualmente cético, mas com pretensões diferentes: vingar a morte da esposa. No meio de tudo isso, o desenvolvimento de uma conturbada relação entre pai e filha, que pagam o preço da ausência do primeiro.

A comédia situacional ganha espaço aos poucos e é usada no roteiro do próprio Jensen somente quando necessário. Sua base é a teimosia de Otto em provar seu ponto e os reflexos de um grupo de homens que se tornam criminosos acidentais ao invadir sistemas e perseguir pessoas. Mikkelsen, como sempre, faz dos limões de um texto sem muitas propostas novas uma limonada. Ele e Gadeberg vão dosando, equilibrando personalidades e comportamentos que passam a sofrer influência da proximidade entre pai e filha. Uma faceta de violência e desumanidade que Mathilde não sabia ser possível em oposição aos sentimentos adormecidos e agora despertados por Markus.

Loucos por Justiça” é eficiente em sua trama que vai entrelaçando fatos, criando um efeito dominó, ao mesmo tempo que traz uma teia de relações. Uma armada pouco usual, desfiando um senso de comunidade. Como pano de fundo, uma solução com tom de mensagem a quase todos os personagens: o primeiro passo para um bom recomeço é a aceitação. Seja na forma de golpe do destino (tema ainda pouco tratado pela psicanálise), seja na motivação divina e inafastável, é importante refletir sobre o que passou pelo viés de que impossibilidade de refazer aqueles passos. Fundamental para Otto, que é movido pelo desejo de provar para si que não é uma farsa e de que suas fortes convicções são reais e fazem sentido.

Essa linha de chegada fomenta debate até mesmo sobre os objetivos que existem por trás das vinganças – consumadas ou não. Ampliando para aquilo que o longa-metragem não mostra, podemos pensar sobre aplicação de meios punitivos como um todo – o que nos levaria a pensar sobre o que é justiça de fato e o que é apenas uma sensação subjetiva de justiça. Claro que, como uma boa história de laços recuperados, há também um discurso de que as experiências da estrada são tão (ou mais) importantes do que o destino.

Ao optar por usar o humor como ferramenta, as relações pessoais de forma preferencial e não limitar-se aos plots do personagens principais, “Loucos por Justiça” pode deixar os amantes das cenas de ação mais carentes – sem necessariamente atrair um espectador que gosta de ir além disso. Ou seja, se você chegou a ele e foi surpreendido de forma positiva, é possível que não tenha sido mera coincidência.

Veja o Trailer:

Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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