Luana Muniz – Filha da Lua

Luana Muniz - Filha da Lua Documentário Crítica Filme Pôster

Confira a estreia de “Luana Muniz – Filha da Lua” com crítica e entrevista exclusiva com Rian Córdova!

Assista a entrevista com o diretor Rian Córdova:


Sinopse: O documentário revela a intimidade de Luana Muniz, autora do bordão “Travesti não é bagunça”. Ela se divide entre a prostituição, o ativismo LGBT e os shows em cabarés. A Rainha da Lapa é conhecida em todo o Brasil pela participação no programa “Profissão Repórter” e sua aproximação inesperada com o Padre Fabio de Melo e Alcione.
Direção: Rian Córdova e Leonardo Menezes
Título Original: Luana Muniz – Filha da Lua (2017)
Gênero: Documentário
Duração: 1h 12min
País: Brasil

Luana Muniz - Filha da Lua Documentário Crítica Filme Imagem

Legado da Lapa, da Lira e da Liberdade 

Se a cidade do Rio de Janeiro fosse uma pessoa, ela seria uma travesti” – esta é apenas uma das sentenças muito bem encaixadas pela protagonista de “Luana Muniz – Filha da Lua“. Apesar de seu bordão mais famoso, “travesti não é bagunça“, ter sido a reprodução da fala de uma colega de trabalho, a maneira como Luana personificou o espírito libertário, tão facilmente encontrado nas noites da Lapa – e mesmo assim tão invisibilizado e alvo de discursos de ódio na sociedade – a tornou um ícone.

O documentário de Rian Córdova e Leonardo Menezes vai além disso no objetivo de retratar a figura por trás da lenda. Aquela que morou em quase vinte países e que participou do jornalístico “Profissão Repórter” – que se comunicava de forma a se fazer ouvir, a ocupar de plano os espaços. De valorização de seu nome, parte integrante não apenas de sua personalidade e sim de sua identidade. As movimentações por vezes exageradas ou desbocadas (para quem se prende a padrões) era parte do magnetismo que nos envolvia a Luana. Talvez aqueles que criticaram a Apostila de Cinema pelo “excesso de preocupação” na escolhas representativas de longas-metragens como “Queens” (2021) entendam o que queríamos dizer ao contrapor obras tão diferentes como essas.

Porém, o filme traz outras expressões do legado da Filha da Lua. Não apenas nas transições de seus habitats, a calçada e o palco. Além de dividir a forma como o Teatro a rejeitava, por ser não apenas atriz, mas prostituta, até chegar à grande contribuição que uma heroína como ela pode oferecer: o acolhimento. Luana nunca foi uma ativista de ocasião e combatia a intolerância com a informação – àqueles que mais necessitavam. Quando o Rio de Janeiro se tornou centro das atenções do mundo nos períodos de Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos, a gentrificação do Centro da cidade tirou ainda mais a visibilidade das travestis.

Com isso, a vulnerabilidade se ampliou em igual proporção. Nos últimos anos de vida, que os realizadores de “Luana Muniz – Filha da Lua” jamais imaginariam que o seriam quando de sua produção, ela se preocupou em desenvolver uma rede de auxílio, que levasse perspectiva de autonomia e conscientização. As travestis sofrem com o preconceito como uma avalanche. A multiplicidade de olhares da sociedade, quase todos, convergem para deslegitimá-las. Se tornam um alvo fácil, até mesmo para pessoas de mente mais aberta e comportamento menos conservador.

Corpos que parecem ali para serem julgados – e desabonados. Em um dos testemunhos do documentário, o verbo perfeito para tal situação – e típico do Rio de Janeiro é mencionado: escrotizar. No fundo, é isso que as minorias sentem, em um território em que reina a esculhambação, mas nunca pelo viés do respeito. Por isso, travesti é visto como bagunça, é lido como ofensa – em inacreditáveis leituras atravessadas que se perpetuam, vide o teor da entrevista de Ronaldo Nazário para Pedro Bial em pleno 2021. Por outro lado, falas importantes que vão de Alcione – conhecida de longa data de Luana  em suas noitadas com o saudoso Emílio Santiago – e Luis Lobianco, que dedicou uma temporada inteira de sua peça a este símbolo da Lapa.

Com uma abordagem dinâmica, de ritmo intenso assim como sua protagonista, “Luana Muniz – Filha da Lua” alcança seu objetivo de mostrar toda a complexidade que a envolve. Além do natural embate ético que envolve uma obra como o episódio de “Profissão Repórter”, o improvável acontecimento de um encontro com o Padre Fábio de Melo possuem o tempo de tela necessário para que não tornasse o documentário algo que flertasse com a mídia hegemônica, com o mainstream. O que vemos, na maior parte do tempo, é uma Luana livre, intensa, verborrágica, marginal. Representando e subvertendo a lógica escrotizante daqueles que o marginalizaram por toda a vida.

Veja o Trailer:

Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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