Mostra Olhar do Ceará | Sessão 5 de Curtas
Vozes e Visões
A Sessão 5 da de curtas-metragens da Mostra Olhar do Ceará do 30º Cine Ceará é composta por dois documentários tradicionais que tratam de agentes invisibilizados na sociedade. Pessoas que o preconceito múltiplo e enraizado entre nós faz com que boa parte opte por não trazer ao centro de seus debates tais pessoas. Mais do que não agir com preconceito, é necessário defender e compreender os anseios de todos. Em um ano onde o senso de comunidade foi posto à prova – e perdeu, produções como essas são importantes para que o resgate de humanidade seja observado.
O primeiro filme é “Todos Nós Moramos na Rua“, em que o cineasta Marcus Antonius Melo acompanha três pessoas em situação de rua do centro de Fortaleza. Um documentário que nos pega em sua construção logo no prólogo, em que um dos biografados, acertadamente sem medir palavras, cobra “respeito da sociedade hipócrita“. Aquela sociedade que, dificilmente, o espectador não se enquadra. Aquela que vira o rosto quando pouco lhe pedem. Aquela que tira do estabelecimento um igual que só quer algo vital ou básico para sua sobrevivência.
O curta-metragem traz a origem da chegada daquelas pessoas às ruas. É comum muitas delas (e o Brasil tem bons milhares de pessoas em igual situação) fugirem de brigas ou casos de violência doméstica. O desamparo estatal está na gênese e a sociedade, em grande parte, contribui com a reprodução da ideia de que muitos estão ali por opção. Melo distribui bem os três testemunhos e monta de uma forma tradicional seu filme. Em um momento de grave crise econômica, sem previsão de melhoras, a tendência é que a população em situação de rua aumente.
O documentário traz um pouco das formas de associação, parcerias e relacionamentos que eles precisam gerir – quase sempre motivados pelo medo. Vocabulário próprio das ruas e uma interessante metáfora de Luca, “bruxo” que aplica o conceito de invisibilização de forma lúdica – deixando a certeza de que somos, sim, trouxas.
Já “O Prisma“, de Augusto Cesar dos Santos, traz o relato de várias pessoas da comunidade LGBTQIA+. Não são poucos os documentários que se valem deste mote, na sempre fundamental troca com o público de experiências e lições que um grupo constantemente discriminado tem a passar. Porém, aqui há uma interessante abordagem que perpassa o curta-metragem, que fiz respeito à fé.
Dentro do recorte regional de um festival cearense, região de forte presença da religião, principalmente o catolicismo – marcada pela figura onipresente de Padre Cícero – o preconceito tem como consequência a negação do direito desse exercício de fé. Uma crueldade sem tamanho, se imaginamos que a origem desta manifestação cultural é a religação, é a inserção em uma comunidade. Exercer a fé é dividir o que se tem em comum com as pessoas próximas – não por acaso, chamados carinhosamente de irmãos.
Mais do que nos entender sincréticos, somos um país que precisamos nos entender plurais – mesmo dentro de grupos. Portanto, mais do que expressões de amor e o carinhoso pedido de respeito, a Sessão 5 da Mostra Olhar do Ceará pede espaço para que todos nós possamos Andar com Fé e não ser julgados pelo que cabe somente ao nosso íntimo.
Ficha Técnica da Sessão 5 de Curtas da Mostra Olhar do Ceará
Todos Nós Moramos na Rua (Marcus Antonius Melo, 15′ – Brasil, 2019)
Sinopse: Curta-metragem documentário que se volta para moradores em situação de rua do centro da cidade de Fortaleza/CE. O filme desacelera as turbulências diárias para ouvir a voz dos moradores, saber quem são, de onde vem, o que pensam, ouvi-los refletir sobre suas experiências, desejos, conflitos e leituras da situação de rua. Num trajeto que parte do cordel “Estouro Brasil” de Wagner Gonçalves (Ex. morador de rua e educador social), constrói-se uma narrativa a partir de entrevistas com três moradores de rua, três perfis diferentes que quebram uma visão hegemônica da sociedade para com a situação de rua. Esse exercício de diálogo serve para que possamos entender e conhecer melhor essas pessoas, sem a pretensão de dar conta de toda experiência plural, diversa e crítica vivida por milhares de moradores em situação de rua de todo o Brasil.
O Prisma (Augusto Cesar dos Santos, 25′ – Brasil, 2019)
Sinopse: Vivenciar a sexualidade deveria ser algo da mais pura simplicidade para pessoas adultas. Todavia, para muitos, é uma atitude de resistência política, cultural e até um risco a integridade física e psicológica. O filme é um recorte da vida de cinco personagens, que abrem suas portas, bocas e corações para nos contar acerca de suas vivências homoafetivas em uma cidade do interior.
Mostra Olhar do Ceará | Sessão 5 de Curtas
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