Nem um Passo em Falso

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Sinopse: Em “Nem um Passo em Falso”, um grupo de pequenos criminosos em Detroit na década de 1950 são contratados por uma pessoa anônima para roubar um importante documento. Mas quando seu plano dá terrivelmente errado, o grupo descobre que se envolveu em uma rede de conspirações muito maior do que poderiam imaginar.
Direção: Steven Soderbergh
Título Original: No Sudden Move (2021)
Gênero: Crime | Mistério | Drama
Duração: 1h 55min
País: EUA

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O Primeiro Passo

Iniciando mais uma coluna na planilha “lançamentos online” da Apostila de Cinema, aportou no Brasil o streaming do grupo WarnerMedia com um catálogo cheio de filmes e séries, bem analisados em forma e conteúdo por nossos colegas em artigos, stories, vídeos (e por nós em nossa newsletter gratuita). Superada a emoção da avalanche de clássicos e produções contemporâneas que nunca daremos conta de assistir, chegou na HBO Max em seu primeiros dias o novíssimo “Nem um Passo em Falso“, longa-metragem do diretor Steven Soderbergh – responsável por transformar a difícil cerimônia do Oscar de 2021 em uma brincadeira de mal gosto.

Reunindo um elenco cheio de rostos conhecidos (e teríamos mais, caso os adiamentos das gravações pela pandemia de covid-19 não afastasse do projeto nomes certos como George Clooney e Nicolas Cage), o roteiro de Ed Solomon (de “Truque de Mestre“, de 2013) ambienta sua história em um período de mudança na indústria automobilística dos Estados Unidos. Usando a ficcionalidade, ele desenvolve os desdobramentos de um golpe que esconde a impunidade dos órgãos reguladores do país. Algo parecido com o escândalo que envolve as propriedades cancerígenas dos produtos da Johnson & Johnson e que a cineasta Phyllis Ellis abordou em documentário na obra “Beleza Tóxica” (2019) – até hoje um dos grandes sucessos de público aqui da Apostila.

A narrativa aqui é bem diferente, claro. “Nem um Passo em Falso” é um thriller baseado em escolhas ruins de seu leque de personagens. Começa com Curt (Don Cheadle), que aceita participar de um crime contra Matt (David Harbour). Ele se junta a Ronald (Benicio Del Toro) e Charley (Kieran Culkin) para render o homem, esposa e filhos na residência da família, mantendo-os em cárcere, com o objetivo de roubar um documento a pedido de Doug (Brendan Fraser). Porém, uma sequência de eventos acontece, transformando caçadores em caçados e com algumas mortes no caminho – o que atrai investigadores e policiais liderados por Joe Finney (Jon Hamm).

Unindo boas referências da sua própria filmografia com o toque das extraordinárias viradas do destino característica dos Irmãos Coen e outros exemplos do gênero, Soderbergh entrega seu melhor trabalho de direção em tempos. Ancorado por um design de produção fiel ao drama histórico, elenco experiente e à vontade em suas caricaturas, ele até tenta comprometer o resultado final com o uso exagerado de lentes olho de peixe e o constante fundo totalmente desfocado, quase um padrão dos dramas norte-americanos nos últimos anos. O diretor chega a tirar de nossa percepção personagens, em objetivos nem sempre tão clarificados nos posicionamentos enviesados de câmera que, se em “High Flying Bird” (2019) ampliavam a sensação observatória, aqui é um exercício virtuoso que não se justifica.

Apesar dos problemas apontados junto ao aplicativo da HBO Max, como as pavorosas legendas enormes na tela e deslocadas para o lado esquerdo, o filme consegue prender a atenção e segurar a tensão. Vamos nos envolvendo com a maneira como Curt vai se enrolando e como um golpe simples e objetivo, descamba para uma subtrama de traição por parte de Matt até um escândalo de proporções nacionais. O jovem interpretado por Noah Jupe possui um arco sobre seu próprio entendimento de tudo o que se passa naquele dia, mas não é tão bem aproveitada como em narrativas que possuem este foco, tal qual “Estrada para Perdição” (2002).

Em um ambiente cada vez mais perigoso, com sua vida valendo cada vez mais, o protagonista encontra a origem do problema por instinto, na legítima defesa que o faz agir desde o início, quando tenta acobertar a morte de um colega. Usando a tática de desfolhamento, novos personagens entram em cena quando uma nova camada da história gana forma. Sempre olhando para o alto na escala de poder, até entrar em uma curiosa reflexão sobre o desrespeito às regras e a ideia de que elas existem com este fim – pensadas para que gerem impunidade àqueles que as criaram.

Sem querer fazer o mesmo que o cineasta e desfolhar a leitura sobre legislação antitruste nos Estados Unidos (e que, vejam só, parece não ser tão aplicável junto aos conglomerados de mídia que se formam em gigantes de streaming como o próprio patrão do diretor), as mensagens sobre a falsa sensação de poder e a ilusão de uma sociedade controlada por normas e órgãos de fiscalização rígida se torna uma boa recompensa para aqueles que superam as exageradas técnicas de estranhamento a partir das imagens criadas por Soderbergh.

Sintetizando em bons diálogos no ato final, Steven Soderbergh não consegue estragar “Nem um Passo em Falso” com a mesma eficiência como fez com a cerimônia do Oscar deste ano – não seria exagero que ainda consiga vaga para alguns colegas de produção na próxima.

Veja o Trailer:

 

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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