Sinopse: Aos 60 anos, a atleta Diana Nyad se prepara para realizar o sonho da sua vida: nadar de Cuba até a Flórida, uma travessia em águas abertas de mais de 160 km.
Direção: Elizabeth Chai Vasarhelyi e Jimmy Chin
Título Original: Nyad (2023)
Gênero: Biografia | Drama | Esporte
Duração: 2h 1min
País: EUA
A Braçada que Faltava
Mais uma aposta do catálogo da Netflix para o Oscar 2024, a cinebiografia “Nyad” obteve êxito nas indicações de melhor atriz para Annette Bening e atriz coadjuvante para Jodie Foster. Muitos apontam, inclusive, o forte lobby da plataforma de streaming como responsável direta pelo “esquecimento” da Academia aos trabalhos espetaculares de Julianne Moore e Natalie Portman em “Segredos de um Escândalo” (2023), nomeado somente em roteiro original. A adaptação da história de Diana Nyad, baseado em sua autobiografia “Find a Way” (inédita no Brasil) passa longe da excelência do longa-metragem de Todd Haynes – e talvez aqui também temos um dos grandes incentivos aos ataques feitos ao filme dirigido por Elizabeth Chai Vasarhelyi e Jimmy Chin, vencedores do Oscar em 2020 pelo documentário “Free Solo” (2019).
A maior parte deles gira em torno do notório tradicionalismo narrativo, permitindo que a história de superação da nadadora que insiste na conclusão de sua “last dance” após os sessenta anos de idade se pareça com muitas outras que já assistimos nas últimas décadas. A passagem da vida de Diana (Bening), digna de um livro e da transposição às telas de cinema, é uma luta por um feito notável. Seu objetivo de atravessar os 160 quilômetros que distanciam Havana em Cuba da costa da Flórida nos Estados Unidos, é daquelas notícias que surgem como nota de rodapé do telejornal diário e que só entendemos a dimensão do acontecido quando uma obra nos apresenta a trajetória por completa.
Quanto a isso não podemos ignorar a eficiência narrativa de “Nyad”. Seu poder de síntese na introdução nos permite ler Diana como uma senhora que desenvolveu certa obsessão pela travessia Cuba – EUA capaz de tornar todas as conquistas relacionadas às maratonas aquáticas em sua carreira “menores”. Ao ponto de abandonar o que construída ao falhar na primeira tentativa de ficar cerca de sessenta horas no mar rodeada de tubarões para provar seu ponto, quanto tinha apenas 28 anos.
Acaba cansando os cinéfilos vorazes tal experiência de outra cinebiografia composta por um roteiro de manual, daquelas que, em pequenas nuances narrativas e pistas da montagem ou da trilha, nos permite prever o passo seguinte. Mesmo assim, ao final é difícil pensar outra forma de se apresentar a vida de Diana para o espectador. Os trechos sombrios de seu passado aparecem em flashbacks que vão se tornando mais esclarecedores com o desenvolvimento da trama, as canções de rock setentista servem como tempero saudosista e a homossexualidade da protagonista é alçada como âncora na qualificação da personagem muito bem defendida por Annette Bening. Tudo como um manual, mas nada parece substituível com tanta facilidade, sobretudo nas mãos de uma dupla de cineastas que obteve êxito com um documentário que também usa o esporte como inspiração.
Desta forma, “Nyad” permite ao público encontrar o heroísmo da protagonista sob várias óticas. No esporte, pela incapacidade da mesma de se tornar menos competitiva. Na luta contra o etarismo a partir da lição de ser capaz de cumprir o objetivo aos 60, longe do “corpo” dos 30, mas com um equilíbrio mental e autoconhecimento que não seria possível até então. Sem contar na ideia de que o feito individual depende de uma construção coletiva de sucesso.
A forma como a dupla de cineastas conta essa história flerta muitas vezes com o discurso motivacional direto e muito mais genérico (e, por que não dizer?, danoso) de coachs comportamentais que entendem que podemos aplicar o modus operandi de Diana em nossas vidas pessoais e profissionais. Mesmo deixando de aplicar o sentimentalismo exacerbado ou o heroísmo exagerado em diálogos e discursos próximos do brega tal qual a Hollywood se valia há vinte anos; esses mesmos coachs devem amar “Nyad” (e indicá-lo por ali em suas listas nas redes sociais pelos mesmos motivos).
Todavia, a trama que une Bening e Foster em duas boas atuações (mais uma vez, distantes do esplendor de Moore e Portman) é desenvolvida para além disso. Filmado na República Dominicana, encontramos na obra um drama pelo olhar de uma mulher que se nega a ser descartada pela sociedade por conta da idade – e que nunca teve seu feito reconhecido como um recorde pelo Guinness, fazendo com que a continuidade de suas palestras e entrevistas sejam formas de ampliar seus registros históricos para nunca ser esquecida ou apagada.
Ao revisitar sua carreira, escolhe os próprios planos do passado como fonte primária de seu planejamento. Podemos lamentar que a fórmula da cinebiografia deixe pouco espaço para o filme “mostrar” ao invés de “contar”. Como exemplo do primeiro caso, a inspirada cena durante os créditos iniciais que mostra Diana colocando os óculos de natação e encarando o homem na raia ao lado – enquanto que ele pula na piscina, em clara atitude de quem acha que aquela senhora não está ali para competir com ele.
Por fim, “Nyad” é capaz de emocionar mesmo com uma protagonista pautada pela obsessão, após uma vida carregada de vitórias e elogios por todos os lados. O que nos move é a grandeza do que ela coloca como missão, deixando um sentimento de que o quase impossível é assim classificado porque ainda iremos testemunhar alguém que irá fazê-lo.
Veja o trailer: