Sinopse: Em “O Que Será”, Bruno Salvati (Kim Rossi Stuart) leva uma vida insatisfatória: é um cineasta (com pouco sucesso) e acaba de se separar de sua esposa Anna (Lorenza Indovina), mãe de seus dois filhos adolescentes Adele (Fotinì Peluso) e Tito (Tancredi Galli). Um dia, Bruno descobre que sofre de uma doença e precisa de um doador. A revelação de seu estado de saúde leva o cineasta a reavaliar os laços familiares, principalmente com o pai Umberto (Giuseppe Pambieri). Será o pai quem vai revelar um segredo que vai levar o filho a viajar em busca de alguém que o possa ajudar.
Direção: Francesco Bruni
Título Original: Cosa Sarà (2020)
Gênero: Drama
Duração: 1h 42min
País: Itália
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Em mais uma novidade da plataforma de streaming Petra Belas Artes à La Carte, tem início esta semana o Cine Clube Italiano, em parceria com o Instituto Italiano de Cultura de São Paulo. Uma vez ao mês, uma produção do país recém-lançada ou inédita no Brasil, fica disponível gratuitamente no serviço por uma semana – além de clássicos da produção italiana que faz parte do catálogo. Todos eles são acompanhados de um bate-papo sobre o filme. O primeiro selecionado, de maio, é o drama “O Que Será“, dirigido por Francesco Bruni.
Baseado na experiência do próprio cineasta, que superou a síndrome mielodisplásica, distúrbio que faz a medula óssea interromper a produção de células sanguíneas e que quase sempre depende de transplante para impedir a progressão para a leucemia, o filme traz como alter ego do diretor e roteirista Bruno Salvati, interpretado por Kim Rossi Stuart. Somos apresentados a ele já em uma cama de hospital, na véspera do início da quimioterapia. Esta abordagem inicial já traz parte da construção que quebra a forte carga dramática com pequenas doses de humor. Ele surge a partir de pequenas ironias ou consegue ser extraído dos desencontros das relações familiares.
A sequência dos créditos é um exemplo. O golpe na vaidade que geralmente a perda dos cabelos que o invasivo tratamento provoca é acompanhada de “Perfect Day“, canção que, com a levada e a interpretação lenta e triste de Lou Reed, dimensiona e ilustra bem a ideia de um protagonista que convive com a esperança e o medo. Bruni não deixa de perder o foco no drama e encerra a cena com Bruno olhando pela janela um casal se despedindo romanticamente. O homem, por sinal, ostenta uma bonita cabeleira. Temos, portanto, um encontro entre criador e criatura, personagem e autor que gostam de exercer o olhar observador – e que não basta quando se está diante do risco da morte.
Depois que conseguimos compreender Bruno, “O Que Será” se torna uma história sobre como nos relacionamos com nosso passado e a família. Os reflexos de atitudes que deixamos sem esclarecer e que retornam como fantasmas – e as consequências de tudo isso. Sendo assim, a parte da trama que envolve o ofício do protagonista, que (claro) também é cineasta, fica em segundo plano. Não porque as engrenagens não funcionam, é até divertida a forma como assistimos as dificuldades dele obter financiamento para seu novo projeto e imaginar o quanto da vida real de Francesco está ali. Não deixa de ser simbólico a apresentação de seu trabalho em uma sessão com outros pacientes.
Todavia, a parte da narrativa que envolve as dinâmicas familiares se impõe. E ela parte de vários pontos na cronologia do personagem. Quase como um carrossel, segredos são revelados para e por ele. Esses desencontros garantem certo dinamismo para a obra, que poderia se prejudicar se apostasse apenas em seu aspecto melodramático. A ideia central da revelação que seu pai Umberto (Giuseppe Pambieri) talvez não fosse o suficiente para manter o espectador conectado por tanto tempo. Bruni, então, pulveriza outros aspectos, tecendo outras relações.
Algumas delas envolvem os filhos do protagonista. Na procura pelo melhor doador, aquele que terá a medula mais compatível com o paciente, Adele (Fotinì Peluso) e Tito (Tancredi Galli) são parte importante do tratamento. Contudo, ao mesmo tempo que seu pai precisa atacar objetivamente sua doença, o risco de viver seus últimos momentos ao lado dos jovens faz com que ele misture as experiências. Em situações como a trazida pelo longa-metragem, cada diálogo acaba se tornando mais urgente. Deixar para depois, pode ser nunca mais. O ideal é que nada fique mal resolvido.
Por outro lado, a pressão sobre alguém em tratamento precisa ser evitada. Esse incômodo, normal entre todos os envolvidos, é bem retratado em “O Que Será” quando Adele questiona a diferença de olhar de seus pais sobre ela, em comparação a Tito. Cansada de observar uma condescendência maior com o irmão, enquanto exigem dela uma força e autonomia que nem sempre ela deseja expressar, esta é uma das cenas mais interessantes do filme.
Contribuindo para a premissa do texto se enriquecer, o longa-metragem retoma outros pontos do passado do cineasta. Alguns mais próximos, depois que ele descobre sua doença e outras bem mais distantes, em que traumas e outras feridas antigas mostram a complexidade da vida do personagem. É quando a obra reflete ainda mais seu equilíbrio narrativo, encontra uma alta dose de empatia. O filme permite um encontro sensível do adulto Bruno com sua infância, pela lembrança da mãe – momento em que a trilha de Ratchev & Carratello alcança a tonalidade triste típica de clássicos dramas italianos.
Nesta caminhada que acha espaço para alguns sorrisos e deixa a dura experiência da sessão um pouco mais leve, saímos emocionados não apenas pela trajetória de superação. Acaba que “O Que Será dá uma lição que vai além: a da renovação. Ver ao fim de uma crise, uma nova estrada, cheia de possibilidades. Sem subterfúgios, sem moldar relações. Recomeçar sem esquecer o que passou e sem mágicas do destino. Uma história que daria um filme – e deu.
Veja o Trailer:
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