Os Salafrários

Os Salafrários Crítica Filme Brasileiro Netflix Pôster

Sinopse: Clóvis é um salafrário de marca maior, que acaba de ser descoberto após dar um golpe em um grupo de japoneses e está sendo perseguido pela polícia. Lohane é uma expansiva empreendedora do ramo alimentício que viu seus sonhos desabarem quando a prefeitura rebocou seu trailer de sanduíches por falta de alvará. Agora, os irmãos postiços terão que conviver novamente, e provavelmente são a única salvação da vida um do outro. Clóvis – muito contrariado – vai ter que aprender a lidar com o afeto e a espontaneidade excessiva da irmã, e ensiná-la um truquezinho ou outro pra garantir a subsistência da dupla.
Direção: Pedro Antônio
Título Original: Os Salafrários (2021)
Gênero: Comédia
Duração: 1h 34min
País: Brasil

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Crises de Riso e Oportunidades

As globochanchadas chegaram de vez à Netflix. Isso não é uma crítica, apenas uma constatação. “Os Salafrários“, distribuído originalmente pela plataforma de streaming mais popular do mundo, chega ao catálogo algumas semanas após a estreia de “Cabras da Peste” (2021) (no mesmo serviço) e da tentativa de lançamento híbrido entre salas de cinema e locação em casa de “Lucicreide vai pra Marte” (2021). Em comum, a espinha dorsal de realizadores brasileiros de comédias populares contemporâneas, em uma fórmula que – devemos admitir – não decepciona. Tanto que gosta quanto quem não gosta.

O cineasta Pedro Antônio, por exemplos, está por trás dos sucessos anteriores de Marcus Majella e Samantha Schmütz. Cada qual querendo construir seu Universo Cinematográfico (imortalizado no ícone Leandro Hassum). O primeiro saiu atrás, em 2017, com “Um Tio Quase Perfeito“, mas conseguiu uma continuação que também já circulou pelas salas vazias. A segunda emulou “Chuva de Milhões” (1985) de Richard Pryor no divertido “Tô Ryca!” lá em 2016, mas não parou por aí. Esta continuação está em pós-produção e deve ser lançada também em 2021. O diretor tem experiência com a dupla, é o nome vinculado ao seriado “220 Volts” e ao “Ferdinando Show“, spin off de “Vai que Cola“, responsável pelo grande personagem de Majella.

Schmütz se baseou no humor global há mais tempo, assim como Fabiana Karla. Participaram da transição do “Zorra Total“, em um processo pelo qual já comentamos em nossa crítica ao filme da humorista. Já “Cabras da Peste” é um desmembramento do trabalho de Edmilson Filho e o sucesso mais improvável do filão, “Cine Holliúdy” (2012). Em comum a todos eles – sem esquecer de mencionar Paulo Gustavo, o mais bem-sucedido e o qual desejamos pronta recuperação em sua luta de semanas contra a covid-19 – é que todos encontraram um estilo próprio, o consagraram logo no embrião de suas carreiras e moldam seus projetos (ou os projetos que participam) com essa base.

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Portanto, não seja ingênuo e ache que encontrará em “Os Salafrários” o Majella e a Samantha que você ainda não viu. Com um humor que bebe na fonte do subúrbio carioca, uma aura de contraventores debochados, eles se repetem porque entregam o que o público quer ver. Marcus, no papel de Clóvis, parece se divertir mais do que atuar (os tradicionais erros de gravação nos créditos aumentam essa sensação). Percebe-se que ele transformou o difícil trabalho de fazer rir em um prazer, já entra em campo nos braços da torcida. Por mais que a Netflix acabe trazendo um espectador indefinido, tentando encontrar pessoas que, com outro tipo de poder de escolha, não se arriscaria a assisti-lo, é difícil imaginar quem deixe de ser fã por causa do filme. Mas também é quase impossível alguém que, já tentado apreciar este humor, se converta a este tipo de obra.

Todos os elementos adicionados em relação a uma das sitcoms ou talk shows protagonizados pela dupla também são velhos conhecidos. O texto de Fil Braz (da trilogia “Minha Mãe é uma Peça“) tem a liberdade da verborragia que a linguagem televisiva não permite. O custo da produção, por algumas das maiores empresas do segmento no Brasil, resulta em uma trilha sonora robusta, que vai de Zezé di Camargo à Anitta. Por sinal, o uso de “Vai, Malandra” na semana em que a cantora tenta gerar um novo impacto com o single “Girl From Rio” (pelo menos a foto já causou muito engajamento) é uma coincidência bem-vinda.

Ao contrário da pop star, não há uma busca colonizada de se afirmar perante outro público. É até complicado imaginar a recepção em outros países de “Os Salafrários” – acredito que a obra estrelada por Edmilson Filho soa mais universalista. Mas, se “Modo Avião” (2020), com Larissa Manoela, conquistou o mundo, não há como prever o que ocorrerá por aqui.

No pano de fundo do filme, a lógica da esperteza, a ideia de transformar crises em oportunidades. Uma atualização do tão problemática “jeitinho brasileiro”, na figura de um falsificador de obras de arte e uma vendedora de lanches em uma barraquinha em Magé, município da Baixada Fluminense (retratado até com certo exagero em relação à distância). As diversas maneiras de promover golpes por parte de Clóvis é a porta de entrada para Majella mostrar sua versatilidade. Já Samantha encontra o espaço se sempre para um número musical, mas tem força suficiente para segurar o riso.

Com as canções licenciadas compondo a trama, “Os Salafrários” segue a mesma trilha de vaudeville, de um teatro de revista, de um show de variedade no rádio ou de um humorístico de TV. É a forma como o Brasil se acostumou a consumir as piadas do cotidiano. Malhando a si mesmo, entendendo a contravenção como uma resposta a um sistema feito para te esmagar – e que deixa impune os grandes vilões da história. As últimas experiências de nossa sociedade reforçaram a máxima de que “rir de tudo é desespero” e há muito comediante achando que é poderoso e poderoso achando que é comediante. Esses merecem bem mais a nossa patrulha. Então, deixa à Majella e Samantha o que é de Majella e Samantha. Dominadores de seu ofício.

Veja o Trailer:

 

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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