Sinopse: “Outras Quarentenas” é uma série de quatro curta-metragens idealizada por Marcelo Campos, fotógrafo, ativista em educação, negritude e mudanças climáticas. Ele é cofundador do Movimento NÓS e ex-conselheiro municipal de Juventude de Mauá (SP). Participou das Ocupações Estudantis em 2015-16, representando os estudantes na relatoria da ONU e Conselho Nacional do Ministério Público. Trabalhou com adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa na organização Ação Educativa.
Direção: Marcelo Campos
Título Original: Outras Quarentenas (2020)
Gênero: 2020
Duração: 17 min, dividido em quatro partes
País: Brasil
Quase Sempre vai Faltar Remédio
A proposta de Marcelo Rocha para o projeto IMS convida foi dividida em quatro curtas chamados de “Outras Quarentenas“. Sabendo do comprometimento do artista com o ativismo negro e a educação, faz muito sentido que tenha se enveredado por esses campos.
“Desde cedo aprendi com a minha avó que prevenir é melhor que remediar,pois quase sempre vai faltar remédio.”
Dividir em quatro partes a Quarentena não é somente um ato simbólico, mas também mobilizador no sentido de pensarmos a quais corpos ela se torna, de fato, possível. Rocha explicita a fragilidade do corpo periférico já em seu cotidiano, mas denuncia que após a Pandemia, os corpos tornam-se cada vez mais vulneráveis. Dentre as múltiplas vielas das favelas esses corpos encontram, mais cedo ou mais tarde, um sentimento em comum. “Quem dera não fosse a dor,mas tem sido“, diz Marcelo.
Reivindica pelos dados (os quais sabemos subnotificados principalmente em regiões periféricas) e novas estruturas que possibilitem a vida desses corpos e não somente sua sobrevivência. Aos se utilizar de colagens e espelhamentos das imagens das favelas, algumas leituras pode ser feitas. Dentre as que acho mais urgentes: esses corpos tem múltiplas caras, possuem sentimentos, crenças, famílias e vida. No entanto, ao espelhar as imagens, Marcelo sugere aquilo que também todos já sabemos. O faz ao não dar alternativa outra a esses corpos que promovemos um ataque feroz ao projeto de democracia social no Brasil.
Há alguns, só resta Deus ou o crime. “Na correria, que deus proteja o povo da periferia”, Ndee Naldinho em “O Povo da Periferia (Expressão Ativa)“
Nas demais partes da tetralogia, Marcelo Rocha continua a se utilizar da técnica do espelhamento, agora pedindo cuidado, que só virá do próprio povo, já que o Governo se utiliza de seu poderio armamentista para disseminar a população mais pobre.
“Luta para continuar vivo“, diz.
É o que observamos nas somente grandes cidades brasileiras, mas de igual modo no interior. Sabemos que a questão é: não há território para pobre nesse país, nunca houve. Os conquistados, vieram da luta. Diária. Cotidiana. Cansativa.
Até mesmo em um momento no qual os que podem estão em casa, esses outros permanecem arriscando a própria vida em transportes públicos cheios. De pobres.
“São muitas violências” e, a mais chocante é a negação da própria vida. Não estamos falando de liberdade, igualdade ou fraternidade, mas da própria possibilidade de existência.
Sem saída, em uma realidade duplicada através de um espelho que foi construído durante séculos, o povo pobre não consegue parar, precisa se expor para manter a própria subsistência.
A agressividade do Estado é uma das tônicas dos vídeos de Marcelo, mas essa agressividade vem de tantas formas que, às vezes, parece difícil imaginar como sair dessa casa de espelhos. Há momentos em que somente colocando o próprio corpo em risco, como aconteceu nas últimas manifestações.
O reflexo, do reflexo, do reflexo da sociedade escravocrata.
“Estudar como?“, pergunta ao espectador. Grande parte do povo permanece exatamente com as mesmas carências do escravo livre. Livre, porém sem liberdade.
O diário imagético de Marcelo Rocha em “Outras Quarentenas” nos mostra todas essas carências. Até mesmo – e principalmente – em um momento delicado como este, como o status social conta.
Quando falamos em isolamento da população pobre pensamos nas distâncias territoriais de suas casas, no emprego que exibe um fazer desumanos e nas prisões. Esse é o isolamento possível e experimentado para esses corpos. Aquele que os ignora.
Com o medo tão perto, talvez só seja possível pensar-se enquanto comunidade em Outras quarentenas . Aquelas que enfrentam em situações supostamente normais. Aquelas que uma parte da população ignora em situações supostamente normais.
A quebrada as enfrenta dia a dia, ano a ano, década a década.
Como pensar em saídas para essas outras quarentenas? Talvez, já seja hora de quebrar o espelho e olhar o outro nos olhos.
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