Sinopse: O filme é baseado na história real do Rei Dom Pedro I, que desenterrou sua amante Inês de Castro para torná-la rainha depois de morta. A obra conta a história de Pedro e Inês em três diferentes épocas (presente, passado e futuro). Um amor atemporal que vence as limitações do tempo. Protagonizado pelos atores Diogo Amaral e Joana de Verona, o filme imortaliza a mais gloriosa história de amor portuguesa.
Direção: António Ferreira
Título Original: Pedro e Inês (2018)
Gênero: Drama | Romance
Duração: 2h
País: Portugal | Brasil | França
A História que Nunca Morre
Chegando ao circuito brasileiro pela Pandora Filmes, a co-produção entre Portugal, Brasil e França, “Pedro e Inês” nos apresenta uma história pouco conhecida pelos brasileiros, que têm contato apenas com as desventuras da Corte Portuguesa no período do Brasil colonial. Porém, os adeptos das frases de efeito e ditados, sem dúvida, já falaram em alguma situação onde as providências tomadas não fariam o mesmo efeito com o chavão: “agora Inês é morta“. É justamente esta narrativa do século XIV, revisitada no livro “As Tranças de Inês” de Rosa Lobato de Faria, que o diretor e roteirista António Ferreira transporta para as telas em uma vistosa produção audiovisual, que venceu o prêmio de melhor filme pelo voto popular no Festival do Rio de 2018.
Na história original, D. Pedro amava Inês, mas deveria amar Constança – de acordo com seu pai, o Rei Afonso IV. Para que ele não consolidasse o matrimônio com a moça, o nobre manda assassiná-la. Quando seu filho se torna Rei, ele manda desenterrar Inês, coroá-la e fazer o povo enfileirar-se para beijar as mãos da defunta. Em tese, neste momento o dito popular surgiu. Porém, por trás dessa idealização do amor há questões envolvendo a falta de liberdade do período real, assim como a nunca superada vulnerabilidade da mulher, mudando apenas os aspectos da sociedade patriarcal em curso. Um prato cheio para recontar a vida dos personagens em três linhas temporais (com uma quarta de brinde).
Desta forma, “Pedro e Inês” nos leva ao Reino de Portugal de Afonso IV (João Lagarto), em um trabalho de direção de arte e figurino que salta aos olhos, bem como as locações na região de Coimbra. E, na poética de seu protagonista, interpretado por Diogo Amaral, atravessa a realidade em presente e futuro. Se os interesses da corte motivavam Afonso a ir contra o casamento do filho, na contemporaneidade o filme traz a relação de dependência econômico dos filhos burgueses. Pedro é uma mistura de herdeiro e funcionário do escritório de engenharia do pai, Constança (Vera Kolodzig) é a esposa em um casamento em crise pela impossibilidade de ter filhos e Inês (Joana de Verona) é a amante, que ele conhece em uma entrevista de emprego.
Responsabilidade e medo por assumir um amor contrário ao que aquele que exerce poder sobre si pensa soa como uma trama que nunca envelhecerá, pelas dinâmicas alteradas de uma sociedade que muda como mecanismo de defesa para permanecer igual. O texto de Lobato e a adaptação de Ferreira não quer promover redenções ou novos desenlaces, apenas atualizar uma tragédia. Há elementos na produção que tornam seu ritmo um pouco menos dinâmico. Apesar do cineasta montar o filme (ele mesmo é o responsável pela edição) para que as três linhas temporais andem juntas, a conexão se dá pela poética de outro Pedro – internado em um clínica psiquiátrica por se dizer um Rei e passar os dias lamuriando sua paixão por Inês. Uma sensação parecida com outra produção que une Portugal e Brasil tratada há algumas semanas aqui na Apostila de Cinema, “O Ano da Morte de Ricardo Reis” (2020).
Essa quebra de narrativa alonga a obra, ao mesmo tempo que tira espaços que a tornariam mais curiosas, principalmente envolvendo o futuro. Nele, uma espécie de comuna reflete uma sociedade que retoma hábitos campesinos. Porém, com tradições ainda mais rígidas e que impedem, novamente, as escolhas envolvendo relacionamento. O cinema popular gosta de usar essa premissa, como na comédia romântica com toques de fantasia “Kate e Leopold” (2001), onde o diretor James Mangold reuniu Meg Ryan e Hugh Jackman no auge de suas popularidades ou nas diversas releituras da machista mitologia grega, seja pela própria Pandora (que dá nome à distribuidora) ou pela esquecida história de Quelone, ninfa que se nega a ser submetida aos compromissos do patriarcado e é condenada por Hermes a carregar a própria casa nas costas, no que chamamos hoje de tartaruga.
Com uma edição difícil para traçar sua comunicabilidade, o longa-metragem é eficiente na proposta de demonstrar como as diversas expressões do amor, quando não aceitas, podem levar a resultados parecidos. Seja na época de casamento por procuração ou na imposição de uma situação nomeada para deslegitimar o romance como o concubinato. Se recortarmos em um período histórico a mesma posição social e replicarmos suas narrativas, dificilmente sairemos de uma lógica, perversamente pensada para existir de tal maneira.
Em relação às personagens femininas de “Pedro e Inês“, a cobrança por ser mãe e o estímulo à competição são alguns dos fatores que – mesmo superados – levam a elas o aspecto da sociedade que pune, apresentando entre elas mais semelhanças do que as narrativas históricas seriam capazes de apontar. Seja Constança ou Inês, por mais que Pedro objetive uma redenção posterior de sua amada, a misoginia nunca acaba e segue sendo reproduzida.
Veja o Trailer: