Pleasure

Pleasure 2021 Filme MUBI Crítica Apostila de Cinema Poster

Sinopse: Bella chega a Los Angeles de sua cidade natal, na Suécia, com sonhos de se tornar a próxima estrela pornô. Entretanto, como sua impiedosa ambição a leva a um território cada vez mais perigoso, Bella luta para conciliar seus sonhos de empoderamento com a realidade do lado mais obscuro da indústria.
Direção: Ninja Thyberg
Título Original: Pleasure (2021)
Gênero: Drama
Duração: 1h 48min
País: Suécia | Holanda | França

Pleasure 2021 Filme MUBI Crítica Apostila de Cinema Imagem

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Chegando para boa parte do mundo com distribuição da plataforma de streaming MUBI, o drama sueco “Pleasure” foi um dos destaques do Festival de Sundance do ano passado. A autora e diretora Ninja Thyberg fez um caminho parecido no mesmo evento com o de Emma Seligman, responsável por outro ótimo exemplar do catálogo do serviço, a comédia “Shiva Baby” (2020). Alguns anos após o lançamento do curta-metragem, ela retornou à mostra com a versão longa de sua narrativa de estreia.

Fora isso, as outras similaridades entre as obras são o protagonismo feminino e a forma como as personagens veem no sexo um instrumento de poder. Ao contrário da sugar baby norte-americana interpretada por Rachel Sennott, a história aqui é conduzida por Bella (Sofia Kappel), um jovem de 19 anos que sai da Suécia para iniciar carreira como estrela de filmes adultos na América. Ao ser perguntada se estava viajando para o país por motivos de “business or pleasure” o título do filme já indica que teremos uma trajetória bem diferente daquela idealizada por essa agente.

As origens de “Pleasure” remontam a um trabalho feito pela cineasta sobre estudos de gênero na faculdade. Motivada a mergulhar na indústria pornográfica – e todas as questões a ela atreladas, algumas, em parte, tratadas no roteiro – ela escreve e dirige o curta-metragem. Vence um prêmio do Canal+ no Festival de Cannes de 2013 e, ao escolher seu primeiro grande projeto, refaz a trama ampliando elementos e subtramas. Encontra uma nova Bella perfeita em Kappel, que nunca havia trabalhado como atriz e ganha o papel ao dizer que estava em processo de laboratório para seu TCC, que se propunha a fazer algo desconfortável.

É justamente este o grande ponto de destaque na carreira da protagonista, que segue caminhos bem diferentes de outra obra que nos coloca em ambiente parecido. Por exemplo, a busca pelo sucesso de Dirk Diggler (Mark Whalberg) em “Boogie Nights – Prazer sem Limites” (1997) – disponível na HBO Max – é facilitada pela leitura misógina desta indústria. Thyberg quer criar, de imediato, o choque nos levará à reflexão – sem que consiga atingir um espaço visual de contraponto. Isso acontece na primeira cena gravada por Bella. Em um set à moda antiga, com apenas homens na equipe de produção, ela nunca se sente parte de um processo.

Filmes desta natureza nunca ganharam muita atenção de quem não os assistia – até que sua popularização pela facilidade de acesso na internet o aproximou de muitos. Hoje já se sabe da força do vício daqueles que consomem pornografia e do quanto essa abordagem é danosa para as relações aqui, no mundo real. Dentre as diversas óticas de análise, há aquelas que argumentam que sempre estivemos diante de um produto que contemplava apenas os homens heterossexuais. Tanto nas escolhas estéticas quanto no público-alvo. A partir daí, se pode pluralizar as formas de fazer e permitir, em todas as fases da produção, se contemplar outras plateias, inclusive com criações female friendly.

Sobre essa premissa “Pleasure” se apresenta. Bella encontrará um ambiente não apenas machista, mas também racista. Nas trocas com os colegas, estabelece suas relações de confiança que precisam ser quebradas ou mitigadas na sua busca por sucesso. Ela não encontrará um set que a acolha enquanto artista para fazer o contraponto inaugural, mas percebe que é possível ser menos “mais do mesmo”. Porém, sua frustração (e a do espectador) é que as relações de poder estão enraizadas, estabelecidas de forma inegociável. Não há como quebrar barreiras, é preciso se alinhar ao sistema para sair vencedora.

Ao querer realizar o sonho de ser a Spielger Girl da vez (inclusive o famoso agente Mark Spielger está no filme), ela se submete a situações cada vez mais hardcore dentro da cena. Alimentar as redes sociais também vira um gatilho nesse desespero pela fama, lembrando um pouco outro bom filme sueco (em co-produção com a Polônia), “Suor” (2020). A diretora busca a provocação visual, principalmente naturalizando e banalizando a nudez masculina, como se tentasse ela mesma produzir contrapontos em uma indústria que também é misógina. Ao lado de “Má Sorte no Sexo ou Pornô Acidental” (2021), que chegou esse mês aos cinemas após vencer o Festival de Berlim, traz o sexo e nosso crescente consumo pelo ato sexual espetacularizado para o centro do debate.

Pleasure” se mantém um pouco refém da narrativa original e entrega uma conclusão próxima do abandono narrativo. Algo que, particularmente, me agrada. Não verbalizar a saída encontrada por Bella faz com que o público junte aquelas peças e informações da forma que lhe convém, como uma boa criação artística. E o que Ninja Thyberg entrega como fato, no clímax da história, é uma mensagem forte demais para ser esquecida. Finalmente gravando em um bonito cenário, em uma cama redonda e luxuosa, uma cena girl-girl ao lado da atual Spielger Girl, ela tem a oportunidade de assumir o poder, agir como o homem na cena. Quando percebe, está reproduzindo toda a crueldade que ela teve que “aceitar” para chegar ali.

O que se inicia como uma promissora vitoriosa, quebrando paradigmas para colocar o seu prazer como parte de suas escolhas, termina próximo a uma derrota, esmagada por uma indústria que não quer nenhuma mudança.

Veja o Trailer:

Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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