Sinopse: Agora em seus anos de crepúsculo, dois homens devem escolher entre seus desejos um pelo outro ou as famílias que orgulhosamente criaram. “Suk Suk – Um Amor em Segredo” apresenta a história homoafetiva entre dois homens maduros que juntos dividem momentos de sutileza e resistência enquanto lutam pelo direito de se amarem livremente.
Direção: Ray Yeung
Título Original: 叔・叔 (2020)
Gênero: Romance
Duração: 1h 32min
País: Hong Kong
Sobre Ternura
Chegando aos cinemas brasileiros após passagem pelo Festival de Berlim de 2020, “Suk Suk – Um Amor em Segredo” coloca luz sobre o amor homossexual na terceira idade. Talvez sem a mesma carga de sensibilidade e empatia de produções protagonizadas por pessoas mais velhas ou o tom de emoção e afeto comum ao cinema LGBTQIA+. Mas, ainda assim, o romance efêmero que precisamos ter nos tempos de hoje.
Esse é o terceiro longa-metragem do cineasta Ray Yeung, que realizou duas comédias românticas com personagens mais jovens em “Cut Sleeve Boys” (2006) e “Front Cover” (2015). Aqui a descoberta do amor tem o ar melancólico da idade como outra ótica possível, de dois homens que parecem cansados de não exercer a plenitude da vida. Suas transições por espaços e interações não se abstém tanto da verbalização quanto o inesquecível “Dias” (2020) de Tsai Ming-Liang – até porque os vínculos aqui soam (um pouco) mais perenes.
Enquanto linguagem, o diretor não parece equilibrar tão bem as imagens. Mistura a estética tradicional de planos abertos, com viés observatório que vão além dos personagens e nos traz o conjunto de referências em relação à família e território. Uma convenção que ele supera, retoma e abandona algumas vezes, sem nos convencer dos objetivos que o levaram a esse expediente. Sendo assim, os enquadramentos que rompem com essa formatação não parecem tão fundamentados. Isso gera uma dificuldade de permanência às vezes, afeta o espectador sem ele sentir. Todavia, a história costurada pelo roteiro de Yeung consegue segurar bem a sessão, seja pela empatia ou pela curiosidade (esperamos que jamais seja por preconceito).
Até porque estamos diante de uma temática ainda pouco registrada no audiovisual contemporâneo. Um caso de amor gay na terceira idade nos instiga sobre dois aspectos. O primeiro envolve a vida pregressa de Pak (Tai Bo) e Hoi (Patra Au) – vencedores dos troféus de melhor ator e ator coadjuvante, respectivamente, no Hong Kong Film Awards. Com outras sete indicações, não recebeu mais prêmios pelo sucesso na cerimônia de outro bom filme, “Dias Melhores” (2020). Para o público, isso acaba não se tornando um elemento preponderante porque há naquele romance o frescor da novidade, mas é um exercício imaginar as dinâmicas de acolhimento por trás dessas biografias.
O novo, entretanto, é a grande instigação, já que a necessidade e busca de afeto entre os idosos (de qualquer gênero ou expressão de sexualidade) parece ser também um tabu. Nessas conexões entre temas, ainda podemos adicionar a relação com o trabalho. Pak é um profissional que dedicou sua vida à função de taxista, provendo estabilidade à esposa e filha. Seu sonho de aposentadoria ganha forma quando ele vê a possibilidade de passar sua licença e carro para o genro. O protagonista de “Suk Suk – Um Amor em Segredo” parece querer esgotar seus últimos momentos enquanto flaneur de uma cidade que domina nas palmas das mãos e no volante. Talvez por isso ele pareça menos disposto ao flerte e ao jogo das intenções de Hoi, viúvo mais inserido na comunidade LGBT, um amante que o levará a outras experiências.
O amor entre eles irá superar os aspectos carnais, com os encontros sobre a possibilidade de desenvolvimento de uma casa de repouso que permita a liberdade e a dignidade de senhores homossexuais. Todavia, se há algo mais profundo enquanto mensagem é a de que o afeto, mesmo na terceira idade, é carnal também. E talvez encontre seu esgotamento por motivos alheios à vontade – ou até em seu próprio arbítrio. O grande acerto aqui é que não há nada imotivado, mas também não há exploração da culpa enquanto elemento. Nem pelo olhar do adultério e nem pelo do rompimento de um relacionamento que existe enquanto tiver que existir.
É possível que alguns apontem o dedo para o fato de “Suk Suk – Um Amor em Segredo” ser um filme muito bem pavimentado, seja pela construção de personagens ou pelo que envolve a narrativa sem que o resultado final o faça justiça. Poucas ferramentas são usados como eficiência pelo cineasta, que não administra tão bem o tempo e parece mais preocupado em não induzir julgamentos do que levar a observação a outro nível.
Ocorre que são poucos os espaços ocupados por Pak e Hoi, reflexo de uma sociedade que precisa superar, no caso deles, duas faces de discriminação. Portanto, não ir muito além disso é parte do jogo também. Se é algo que a intenção realista da obra permite, sinal que o problema não é somente dela, é bem mais nosso.
Veja o Trailer: