Bastardoz

Bastardoz 2022 Filme Netflix Crítica Apostila de Cinema Poster

Sinopse: “Bastardoz” se passa durante a Guerra Civil Espanhola, quando inimigos declarados precisam unir suas forças para enfrentar uma horda de zumbis criados em uma experiência nazista.
Direção: Alberto de Toro e Javier Ruiz Caldera
Título Original: Malnazidos (2022)
Gênero: Terror | Comédia | Guerra
Duração: 1h 41min
País: Espanha

Bastardoz 2022 Filme Netflix Crítica Apostila de Cinema Imagem

Algoritmoz Inglórioz

Lançado há quatro meses com distribuição da Sony em seu país de origem, a produção espanhola “Bastardoz” (provavelmente uma das melhores traduções de títulos para o português dos últimos anos) ganha mares internacionais pelo serviço de streaming mais popular do mundo, a Netflix. Sua mistura de comédia, terror com zumbis e Segunda Grande Guerra foi o suficiente para levar o longa-metragem para a lista dos mais assistidos em poucas horas. Por ali deve permanecer por alguns dias ou, quem sabe, para assustadoras duas semanas – já que o objetivo da plataforma é criar um fluxo insano de obras rodando no top 10 para manter o público dentro do aplicativo.

Sem muito tempo para “descobrir” filmes, a partir do método tradicional de engajamento (que chamávamos de indicação dos amigos), a adaptação de “Noche de Difuntos del 38“, do escritor Manuel Martín Ferreras propõe uma releitura parecida com a de Quentin Tarantino em “Bastardos Inglórios” (2009). Algo que, no aspecto visual, os diretores Alberto de Toro e Javier Ruiz Caldera, utilizam como fonte. Principalmente porque boas partes das sequências acontecem em florestas e vilas no interior da Europa, algo parecido com o que a área de atuação do grupo de judeus norte-americanos liderado por Brad Pitt.

Como uma homenagem, o contra-plongée que fez com que as imagens tarantinescas ficassem marcadas na nossa mente em um dos melhores filmes do realizador. Contudo, há outras expressões audiovisuais que se conectam a “Bastardoz“. A espinha dorsal das narrativas de zumbis, a partir do olhar e criatividade de George A. Romero também é latente. Já o humor a partir da guerra, usando a proximidade com a morte e as reações involuntárias de quem se vê em meio ao terror, se encontra com o seriado “MASH” e seus derivados, incluindo a adaptação cinematográfica de 1970 por Robert Altman.

Ou seja, para além dos assustadores mortos-vivos, cenas como soldados com braços amputados (visualidade clássica da história que se passa no Vietnã) com uma quantidade de sangue desproporcional jorrando (aos moldes de Tarantino) transforma a obra em uma mistura de referências. Porém, esse simples jogo de assimilação não reduz o filme a apenas isso. É possível se divertir com o que há além do saudosismo cinéfilo. Gags que funcionam e elenco com boa química são alguns dos pontos favoráveis para quem deseja relaxar usando a ficção para saciar seu desejo por morte.

Aqui o conceito de zumbi não era nada familiar para os personagens. Por se passar no auge da Segunda Guerra Mundial, a forma como as criaturas surgem é uma proposta original. O prólogo nos mostra uma ataque nazista em uma vila no interior da Espanha. Ali, após a matança de todos os presentes, as tropas de Franco, com o auxílio de um oficial alemão, atiram uma arma química que transformará os mortos em zumbis, a título de experimento. O protagonista será Jan (Miki Esparbé), um advogado salvo do fuzilamento que receberá uma missão impossível, propositalmente suicida: ele terá que atravessar regiões ocupadas pelos republicanos para entregar um bilhete inútil para outro oficial. Será acompanhado de um jovem inexperiente e caracterizada pela covardia.

Detidos por um destacamento republicano que possui, entre outras figuras, uma sisuda mulher com o apelido de Matapadres (Aura Garrido), eles terão que se unir para criar uma espécie de resistência contra os zumbis. Um inimigo em comum, capaz de mitigar o peso de um conflito em meio a nada menos do que a Segunda Guerra Mundial. A ideia de transpor figuras da literatura fantástica para grandes eventos da História é sucesso no mercado editorial há muitos anos (e, em certa medida, no audiovisual). Em “Bastardoz” temos uma forma de trazer as memórias de erros do passado, apresentar aos mais novos alguns horrores reais, usando o extraordinário como pano de fundo.

No Brasil, um autor abraçado pela geração que consome o young adult, Eric Novello, tem em seu início de carreira um ótimo exemplo, quando colocou vampiros em meio ao Império Romano em “Dante: O Guardião da Morte“. Já o filme espanhol, então, consegue fazer uma boa ponte entre o alerta sobre o poder bélico de um grupo que não se importa com o extermínio de humanos e sua conexão com a visão canônica dos zumbis, uma das figuras preferidas para unir terror e crítica social a partir de metáforas.

Talvez esse caminho seja um bom filão para a Netflix, que tem desapontado em adaptações de escritos contemporâneos, sobretudo os que envolvem o romance. Só não podemos nos esquecer que “Bastardoz” não é uma produção original, apenas acordo de distribuição internacional. O fato do saldo final da obra ser positivo pode explicar mais o insucesso e má recepção de outro títulos do catálogo, pensados em algoritmos, do que atestar a qualidade deste.

Veja o Trailer:

Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *