Sinopse: “Alerta de Spoiler” é baseado no livro de memórias “Spoiler Alert: The Hero Dies”, este filme conta uma história comovente e engraçada, que mostra como a relação de um casal se transforma e aprofunda quando um deles fica doente.
Direção: Michael Showalter
Título Original: Spoiler Alert (2022)
Gênero: Romance | Comédia | Drama
Duração: 1h 52min
País: EUA
Meta-Clichês Seguem Emocionando
Como o título parece sugestionar, “Alerta de Spoiler“, longa-metragem norte-americano que chegou hoje ao catálogo do Telecine dentro da plataforma GloboPlay, boa parte do “que” e de “como” as coisas acontecer no romance entre Michael (Jim Parsons) e Kit (Ben Aldrige) já são parte da zona de conforto dos espectadores. De fato, a adaptação do livro autobiográfico de Michael Ausiello para o audiovisual usa como base uma trama tão comum quanto realista, sendo a sua abordagem muito parecida com outros filmes lançados nas últimas décadas. Ao final, porém, a obra para muitos cumprirá com o objetivo de emocionar, por mais que o passo seguinte seja despudoradamente antecipado pela narrativa.
Parsons, o Sheldon de uma das últimas sitcons de sucesso nos Estados Unidos, “The Big Bang Theory” (2007-2019), pela qual ganhou quatro Emmys, não é apenas um produtor associado, sendo papel importante na adaptação do livro. Assumidamente gay em 2012 após entrevista ao New York Times no auge de sua fama, ele foi convidado a moderar uma sessão de perguntas quando do lançamento do livro de Ausiello em 2017, ele ficou profundamente emocionado ao ler a biografia. Não apenas encabeçou o projeto como seguiu uma tentativa de formação de plateia ao fechar sessões gratuitas em Houston, sua cidade-natal, com o objetivo de dar mais visibilidade à história do bem sucedido jornalista.
Na primeira fase, Michael é um jovem jornalista que realiza seu sonho interiorano de trabalhar para a TV Guide em Nova Iorque, a principal publicação sobre televisão dos Estados Unidos. Somos contextualizados em uma época no qual essa mídia possui um peso muito maior do que o atual, sem que seja necessário um grande desenvolvimento sobre o panorama. O roteiro de David Marshall Grant e Dan Savage permite um breve contraste entre o protagonista e seu par, Kit, que o surpreende no primeiro encontro com a informação de que não possui TV em casa – algo que, para as novas gerações, não soa tão absurdo assim.
“Alerta de Spoiler” é um filme que usa alguns contrastes enquanto modus operandi. Isso faz com que o expediente de transformar inúmeros clichês de comédias românticas ou dramédias norte-americanos não seja a única mola propulsora da narrativa. O longa-metragem começa com um grande spoiler na forma como o público de hoje gosta de categorizar. Somos colocados em uma cama de hospital no qual um Kit bastante debilitado parece inconsciente para tristeza de Michael. Ou seja, a velha tática de transformar a história em um gigante flashback para construir toda a emoção da fria e pouco compreensível cena inicial, já é um clássico clichê audiovisual. É sempre bom lembrar que jamais vincularemos “clichê” a algo negativo – e quem já acompanhou outros textos da Apostila de Cinema sabe que esse é um elemento não automaticamente desabonador.
No caso do lançamento do Telecine, há algumas formas interessantes de se utilizar o procedimento. Outra maneira que parece funcionar é a de traçar metalinguagem com elementos televisivos. Michael é um apaixonado pela mídia a qual transformou em emprego e o espectador recebe fragmentos de sua infância a partir de uma sitcom dentro do filme. Aliás, o tempo de tela dessa narrativa em linguagem alternativa poderia ser maior. Porém, o diretor Michael Showalter (do ótimo “Os Olhos de Tammy Faye” de 2021) parece insistir na já citada tática do contraste, colocando o romance em primeiro plano ao mostrar o personagem de Parsons como alguém inseguro ao ponto de (quase) não “sexualizar” sua primeira ida à cama com Kit em oposição ao personagem de Aldrige que parece sempre cheio de confiança.
Com essa ideia, Michael define sua guinada romântica como um plot twist e pelo seu olhar acompanharemos as diversas fases de um relacionamento maduro. Há momentos em que a produção dá seus sustos a quem procura a boa técnica. No pior delas, há uma cena em que os pais de Kit (vividos pele duas vezes ganhadora do Oscar, Sally Field, e Bill Irwin) chegam em seu apartamento após a montagem mais engraçada do filme, na qual Michael e uma amiga “desgayzificam” a casa. Sem dar conta de cinco personagens em cena, cada qual ocupando locais diferentes do cômodo, a montagem de Peter Teschner apela para os múltiplos recortes dignos da constrangedora cena (que valeu um Oscar) de “Bohemian Rhapsody” (2018).
Por outro lado, não é apenas o clichê metalinguístico que é usado com parcimônia, mas também as referências saudosistas. E aqui falamos dentro de uma lógica de dramédias que poderia transformar “Alerta de Spoiler” em um recorte de citações preguiçosas. Das soap operas de hospitais como “Days of Our Lives” (no ar desde 1965 em quase 15 mil episódios) à uma das cenas mais marcantes da carreira de Shirley MacLaine em “Laços de Ternura” (1983), a forma como o roteiro propõe sua materialização é também parte da construção narrativa. Não estamos diante, portanto, de referências gratuitas.
Para além de análises frias, o que marca em “Alerta de Spoiler” é a emoção. Da troca de presentes de Natal consistente no espaço do armário na casa do outro à primeira vez que é dito “eu te amo” à passagem do tempo que revela toda sorte de crises típicas de uma relação que tenta não se perder na rotina apesar do amor incondicional. Há espaço para transformar a metalinguagem de um grande show de TV em uma proposta final de plot twist que salvaríamos todos nós da incontornável dor das despedidas em nossas vidas. Só que, falar mais do que isso, seria trazer o grande spoiler que inconscientemente você que não viu o filme sabe de volta ao jogo.
Veja o Trailer:
Uma bela análise. Quem não viu o filme ,consegue entendê-lo lendo seu texto. Eu assisti o filme recentemente e não consigo recordar de uma obra que tenha mexido tanto comigo nos últimos anos. Fiquei realmente tocado e comecei a ler tudo sobre a história de Michael e Kit. Não estamos preparados para filmes com finais tristes, principalmente quando eles de fato ocorreram.