Sinopse: “A 200 Metros” retrata a jornada de Mustafa (Ali Suliman), um pai que mora a 200 metros de distância de sua família. Ele e a esposa (Lana Zreik) vivem separados pelo muro que divide Cisjordânia e Israel. Quando recebe uma ligação de que seu filho sofreu um acidente e está internado, ele tenta atravessar a fronteira, mas é impedido. Inconformado com a situação e com a recusa dos oficiais israelenses, ele parte em uma odisseia de 200 quilômetros com o objetivo de reencontrar a sua família.
Direção: Ameen Nayfeh
Título Original: ٢٠٠ متر (2021)
Gênero: Drama | Aventura
Duração: 1h 36min
País: Palestina | Jordânia | Catar | Itália | Suécia
Contra o Opressor e o Observador
“A 200 Metros” (chegando nessa sexta-feira às plataformas de VOD Claro Now, Vivo Play, Sky Play, iTunes/Apple Tv, Google Play e YouTube Filmes) é a produção que representou a Jordânia na última temporada de premiações do Oscar. Obra que coloca duas questões envolvendo o ocupação israelense no território da Cisjordânia, uma barreira física que impactou ainda mais as dinâmicas sociais e econômicas da região. Uma delas é pelo olhar do protagonista, Mustafa (Ali Suliman). Uma inspiração que vem da realidade do próprio cineasta Ameen Nayfeh, que passou a encontrar limitações de contato com sua mãe que permaneceu estabelecida em uma aldeia palestina enquanto ele era o agente transitório. Não teve a mesma força de “O Presente” (2020), curta-metragem finalista em sua categoria, em um ano de grandes realizações internacionais concorrendo.
Não sabemos muito mais sobre as personalidades do realizador e de sua genitora, mas é possível que o protagonista do filme comungue as duas. O grande questionamento sobre ele vai no sentido dos limites do nosso idealismo. Mustafa não consegue viver com sua esposa Salwa (Lana Zreik) e filhos, que moram do outro lado do muro. Isso porque ele se nega a obter um documento que, na prática, lhe daria cidadania israelense, ultrapassando fronteiras apenas com visto provisório. A proximidade das residências é tal que, pelo telefone celular, eles brincam de apagar e acender as luzes de suas janelas. Por questões de princípios, o personagem não dá o braço a torcer e opta por uma rotina inconstante, sem dúvida danosa às crianças e à mulher.
Porém, como um golpe do destino, seu filho precisa ser internado no hospital assim que o tal documento provisório caduca. A solução é atravessar o território palestino em outro ponto de fronteira, que o permita entrar na ocupação israelense para visitá-lo. Aqui temos um Estado que ataca a matriz cultural dos oprimidos de diversas maneiras. Além do genocídio são múltiplos os etnocídios e “A 200 Metros” nos apresenta a burocracia como um dos mais fortes dele. Por mais idealista que o espectador seja, seria difícil criticar qualquer atitude de Mustafa que o permitisse ajudar o menino. Ele encontra um caminho que não o faz abandonar oficialmente suas raízes, mas é claro que, ao final daquela jornada, este comportamento acabará sendo repensado.
Acaba que aquele homem é um pouco estranho no meio da própria família, tanto por uma leitura de opressão, mas também como artifício burocrático. A sua narrativa é daquelas que Israel usa de exemplo para “forçar” uma paz, passando pelo abandono de seus vínculos culturais em prol das relações afetivas. A esposa se desdobra em dois empregos, não consegue dormir e vive sem tempo para auxiliar na criação e educação das crianças. A ponto de cogitar, sem ouvir a opinião do marido, deixar que um deles tente a sorte ainda criança no Maccabi Haifa, na velha ideia de vincular as oportunidades do futebol com a ascensão social.
Quando a internação acontece, o longa-metragem se transforma em um road movie. Mustafa viajará com outros palestinos que trocarão opiniões e interpretações sobre a ocupação israelense. Aqui chegamos na segunda questão que torna o filme muito atraente. No meio daquela “lotada”, temos Anne (Anna Unterberger), que se apresenta como uma cineasta alemã – de ancestralidade palestina – que está ali filmando de forma independente um documentário. Assim como projetamos se o homem vivido por Ali Suliman não teria aspectos da personalidade de Nayfeh, o mesmo podemos dizer da estrangeira.
Isso porque ela debruça seu olhar de maneira curiosa, tornando “A 200 Metros” atraente para a plateia ocidental de outra forma. Nos faz pensar nessas abordagens de forasteiros que adentram territórios com o objetivo de registro. Uma integração atravessada, um pouco imposta até. O roteiro (também do realizador) reserva algumas surpresas sobre essa mulher, que vai ganhando relevância na narrativa. Ao ponto de terminarmos a sessão acreditando ser ela, também, parte do problema.
Veja o Trailer: