Army of the Dead: Invasão em Las Vegas

Army of the Dead Filme Netflix Crítica Pôster

Army of the Dead: Invasão em Las Vegas, de Zack Snyder, chegou à Netflix. Leia a crítica!

Sinopse: Após um surto de zumbis em Las Vegas, nos Estados Unidos, um grupo de mercenários faz uma aposta final, aventurando-se na zona de quarentena para tentar realizar o maior assalto de todos os tempos.
Direção: Zack Snyder
Título Original: Army of the Dead (2021)
Gênero: Ação | Crime | Horror
Duração: 2h 28min
País: EUA

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Novos Zumbis e Nenhum Segredo

Depois de uma década de Snyderverse junto a Warner e DC, o cineasta Zack Snyder se tornou quase persona non grata junto ao estúdio. A Netflix assumiu, então, sua primeira empreitada após a sequência de filmes de super heróis, “Army of the Dead: Invasão em Las Vegas“. Uma ousada confluência de gêneros, que baseia sua trama em um tentativa de golpe na capital dos cassinos à beira de um ataque nuclear pós-apocalipse zumbi. O resultado final é um meio-termo entre o genérico e a catarse, por vezes bem arquitetada pelo diretor, que usa quase três horas de nossas vidas na tentativa de nos convencer que o divórcio com a franquia de alguns de nossos bonequinhos favoritos não fará dele mais um zumbi em Hollywood.

Ele joga em várias posições aqui, em um projeto que está vinculado ao seu nome desde 2004 – quando estreou na direção com “Madrugada dos Mortos“, que usa as mesmas criaturas como argumento. Ele dirige, roteiriza, produz e é responsável pela fotografia. Só não varre o set porque a plataforma de streaming aceitou de bom grado despejar quase cem milhões de dólares no longa-metragem, que reúne estrelas (nem tão) promissoras e Dave Bautista, o inesquecível Drax dos igualmente inesquecíveis filmes dos Guardiões da Galáxia.

Aqui ele é Scott Ward, o líder dos mercenários. Estamos em um mundo onde Las Vegas está tomada por zumbis e a única solução encontrada pelos Estados Unidos é promover um ataque nuclear contra seu próprio território. Making America great again, eles agendam o bombardeio para a alvorada de 4 de julho, restando apenas três dias para que o grupo encare alguns milhares de mortos-vivos para tomar para si algo em torno de cinquenta milhões de dólares.

Nove pessoas que se unem de forma pouco desenvolvida, mas que parece ter uma formatação parecida com as narrativas do gênero. Tal qual “Onze Homens e um Segredo” (1960 com Sinatra e 2001 com Clooney) e todas as sequências que vieram, cada personagem parece cooptado para exercer uma função. Porém, Snyder não está nem um pouco disposto a lidar com essas particularidades. Qualquer elemento individualizante está reservado para o protagonista e sua filha, Kate (Ella Purnell). Ela sairá de seu acampamento, onde faz trabalho humanitário, para buscar Geeta (Huma Qureshi), mãe de dois filhas levado ao olho do furacão. Todas as outras pessoas parecem meras ferramentas para as cenas de ação.

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Algumas escolhas chamam a atenção em “Army of the Dead“. Snyder cria a convenção da obra, em uma proposta de futuro, com um prólogo seguido de uma longa cena inicial. Ali a historiografia que levou à derrocada daquele território é acompanhada pelos créditos e uma versão de “Viva Las Vegas“. Essa é apenas uma das sacadinhas que ele tira do bolso quando quer entregar referências ao espectador. Aliás, a primeira delas é trazer outra canção clássica de Elvis, “Suspicious Mind“, dizendo com todas as letras no primeiro segundo do filme que acabamos de cair em uma armadilha. É verdade, de certa forma nos sentimos assim por vários momentos.

A cena épica já revela uma violência, além de alegórica, espetacularizante. O diretor “limpa” abordagens paralelas na trama principal para nos “sujar” de sangue pelo maior tempo possível. Com isso, boas ideias e elementos curiosos são pouco aproveitados, como é comum em trabalhos emocionados de realizadores que querem só a polpa do puro suco do entretenimento. Ou seja, não sabemos até que ponto o que nos comove é fruto da genialidade de Snyder ou mero fruto do acaso – outro expediente comum na indústria norte-americana.

Entre esses exemplos, podemos citar a trajetória de atualização na trilha criada por Junkie XL. Mutável, ela começa nos remetendo ao tecno do final dos anos 1990, bem encaixada na montagem mais dinâmica no início, que faz do filme uma mistura da filmografia do diretor com os lampejos de criatividade de Guy Ritchie de vinte anos atrás. Porém, termina se aliando à forma genérica de representação de boa parte da obra.

A experiência do compositor, misturada com a longa parceria com Snyder, põe em dúvida o quanto o traumatizado diretor quis ter o máximo de controle sobre sua criação. Vale o registro, para quem caiu de paraquedas no cinema de Zackynha, que ele acabou de passar por um embate de anos com a própria Warner, que lançou a verão estendida de “Liga da Justiça“, sucesso em sua plataforma de streaming HBO Max. Com mais de quatro horas, em preto e branco, a aventura foi daqueles lançamentos de 2021 que a Apostila de Cinema deixou guardada para outro momento.

Há uma outra proposta de abordagem em “Army of the Dead” que parecia promissora. Nela, os zumbis, sempre desprovidos de inteligência e representados como uma massa que só quer comer vivas as pessoas, parecem passar por um processo diferente. Há ali um Adão e Eva, um passo a frente tal qual a leitura sobre “O Planeta dos Macacos” (o original de 1968, mas levado ao infinito). Uma espécie de re-humanização de figuras que já soam clássicas para o Cinema e que admitem essa proposta em estágio avançado, como ocorreu nas derradeiras temporadas de “The Walking Dead“.

Isso torna as participações desses personagens mais perfomáticas, menos óbvias e até mais interessantes quando um tigre-zumbi amplia a possibilidade de uma pluralidade de espécies. Mas, é tão mal forjada e está ali como novas desculpas para as sequências de ação, que é melhor não dar ideia para Snyder – vai que ele gosta dessa simbologia toda e faz um Snyderverse Zumbi, não só com Adão e Eva, mas com Noé e toda um mar (vermelho-sangue) de referências bíblicas? Não duvidaria se a Netflix ainda atirasse dinheiro e a própria dignidade nas mãos do diretor…

Em suma, o filme é recheado de opções para sair do maniqueísmo, mas não quer fazer isso. A trajetória de sacrifícios dos gananciosos mercenários é um punhado de cenas de ação, extremamente violentas, com diálogos ali colocados para o espectador respirar antes de uma leva de tiros e explosões. Aí você pergunta: no que o longa-metragem se propõe, ele é bom?

Peço desculpas ao padroeiro do cinematógrafo, mas, sim, é bom. Snyder, em sua primeira produção captada de forma digital, dosa as excessivas representações em câmera lenta, traz uma Las Vegas distópica convincente, traz o que é possível de splatter em imagens incrivelmente nojentas, com os diálogos comuns ao cânone de Romero, ao mesmo tempo que promove alguns fatalities plasticamente mais interessantes que o próprio “Mortal Kombat” (2021).

No fim, quem deseja raciocinar menos do que os zumbis modernos do filme, se divertirá sem culpa com “Army of the Dead“. Fica óbvio desde o início que, para boa parte do elenco (menos famoso que o casting do Power Couple – uma exceção é Omari Hardwick, que está ali com um objetivo revelado no epílogo), o golpe é, na verdade, uma operação kamikaze. Portanto, para que elaborar planos? Talvez não seja necessário nem gravar o nome daquele gente toda. Nem do filme, nem do reality-show. O cineasta showman tem uma boa ideia sobre a cena final, em um clímax que justifica sua abordagem tradicional de fazer o mundo parar.

Desta vez, ironicamente, ele segue o jogo em alta voltagem o máximo que pode. Se já não bastasse os problemas de outras produções, ele ainda teve que inserir Tig Notaro, que faz a piloto de helicóptero (Marianne Peters, o IMDB soprou aqui) em refilmagens apenas com a atriz, já que Chris D’Elia, dono do papel originalmente, foi alvo de diversas denúncias de assédio sexual, inclusive a menores de idade. Ou seja, depois de tanta treta sobre seus projetos nos últimos anos, Zack Snyder só quer que todo o mundo (ou, pelo menos, Las Vegas) se exploda.

Veja o Trailer:

 

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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