Sinopse: O caos se instala no planeta depois que um acontecimento global neutraliza todos os equipamentos eletrônicos e acaba com a capacidade humana de dormir. Mas Jill (Gina Rodriguez), uma ex-militar com um passado problemático, pode ter a chave para a cura: sua própria filha.
Direção: Mark Raso
Título Original: Awake (2021)
Gênero: Ficção | Drama | Ação | Thriller
Duração: 1h 36min
País: EUA
Léxico Tan Tan
“Awake” traz uma situação-limite, em uma ficcionalidade distópica imediata, para erguer um drama familiar sobre a valorização dos laços afetivos. O canadense Mark Raso lança seu terceiro longa-metragem pela plataforma de streaming Netflix fazendo uma opção no terço final que deverá deixar parte do espectador, ávido por conclusões fechadas, ideias verossímeis por trás das provocações ou um clímax emocionante.
O filme dialoga com algumas das produções mais interessantes das últimas duas décadas – mesmo que não se inclua neste rol. No mundo de “Awake”, um evento similar a um PEM (pulso eletromagnético) faz com que ninguém mais no planeta durma. À exceção da, entre pessoas não confirmadas, menina Matilda (Ariana Greenblatt). A figura da jovem salvadora da humanidade lembra um pouco a sociedade estéril de “Filhos da Esperança” (2006), um dos grandes filmes deste século. Nele, a protagonista grávida precisava ser escoltada para que o primeiro bebê em quase vinte anos pudesse nascer. Aqui o cerco se fecha no núcleo familiar. Jill (Gina Rodriguez), mãe de Matilda e de Noah (Lucius Hoyos) quer recuperar a credibilidade com os filhos, após a criação por parte da avó deixar a sensação de ausência da parte dela.
Quando o evento ocorre, os três sofrem um acidente no carro onde estavam. A princípio, a menina tem uma experiência de morte, pois aparece cuspindo água como se o salvamento fosse fruto de reanimação pulmonar. Vários caminhos poderiam ser seguidos pelo cineasta. Na estética, ele também parece beber da fonte de Alfonso Cuarón. Traz a ação quase sempre com uma câmera apenas, bem conduzida para que o excesso de informação não embrulhe a mente do espectador. Méritos também da montagem de Michele Conroy. As consequências sociais de um mundo sem sono, contudo, não são tão bem aproveitadas.
“Awake” nos remete a duas obras da sociedade contemporânea. Uma envolve o audiovisual e, vejam só, Christopher Nolan. Em seu animador início de carreira na direção, “Insônia” (2002) trazia Al Pacino como um investigador que não consegue se adaptar ao novo posto em uma cidade do Alasca, em que metade do ano é dia e metade noite. Após atirar acidentalmente em um colega, como fruto de um cansaço constante, ele precisa investigar um assassinato para fazer justiça ao outro policial.
Porém, a forma como o longa-metragem explora esta fadiga constante torna tudo muito mais nebuloso do que o normal. É quase nesta premissa que este novo filme se baseia. Quando a humanidade vê que ninguém mais dormirá, a preocupação passa a ser as reações do nosso organismo e o medo de que estamos há apenas alguns dias de nossa extinção.
Seria o fim trágico da ideia de Jonathan Cary, que em sua pequena e forte obra filosófica “24/7: Capitalismo tardio e os fins do sono” coloca este como o único obstáculo possível ao nosso aumento de produtividade. Mark Raso, quase que em homenagem à sua família, desenvolve uma trama com bem menos profundidade. Foca na corrida de Jill para manter Matilda e Noah em segurança – e, ao mesmo tempo, trazer um pouco mais de autonomia aos filhos. Age como se estivesse carregando uma bomba-relógio, com sua morte e a consequente perda de referencial de pessoas ainda dependentes prestes a acontecer.
O primeiro terço até tenta fundar alguns pilares sociais curiosos. Traz a representação da igreja e as justificativas divinas na imagem de um pastor, cria um embate entre ele e a ciência e ainda insere na história um negacionista e terraplanista que parece perdido nos próprios argumentos. Porém, a mãe parece mais preocupa em intensificar essas ações, tornando o apocalipse inescapável algo menor em sua luta pelo amor dos filhos.
Sendo assim, não há porque temer ou se desapontar com o final “aberto” de “Awake“. Chegamos ao fim do caminho pensado pela própria Jill, independente dos motivos que levaram a humanidade a ser condenada ou os desdobramentos de pesquisas e tentativas de solução que existam em paralelo à sua trajetória. Ela deseja olhar para si e para o seu núcleo, protegê-lo ao máximo e pelo maior tempo possível. Ou seja, sob a mesma ótica, podemos entender a obra como um panorama de questionamentos sobre uma distopia possível como algo que torna a si mesmo superficial ou que valoriza as conexões fraternas pelas quais devemos sempre manter vivas.
Veja o Trailer:
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