Sinopse: “Venus” nos traz a história de Sid (Debargo Sanyal). A transição da transgênero já seria complexa, ainda que ela não tivesse que lidar com uma mãe indiana tradicional, um namorado que não assume o relacionamento e o filho Rhalp que aparece em sua vida justamente nesse momento de mudanças.
Direção: Eisha Marjara
Título Original: Venus (2017 )
Gênero: Comédia Dramática
Duração: 1h 58min
País: Canadá
O Corpo como Fantasia
A diretora Eisha Marjara traz em “Venus” a dificuldade da transição de gênero. Através da decisão de Sid (Debargo Sanyal), a personagem precisa lidar com a não aceitação por parte da mãe, as dificuldades no trabalho e, além disso tudo, aprender tardiamente a ser mãe.
Quando o menino Rhalp (Jamie Mayers) aparece, Sid descobre ter engravidado a amiga Kristen (Amber Goldfarb) em um rápido relacionamento adolescente. No entanto, o que poderia ser um choque se torna a maior fonte de afeto que ambos- tanto Rhalp, quanto Sid – encontram naquele momento.
Com os problemas semelhantes à grande parte dos adolescentes, Rhalp não enxerga nos pais que o criaram (a mãe biológica e o padrasto), o olhar atento de Sid. Esse, ao mesmo tempo, passa por um relacionamento não assumido com Daniel (Pierre-Yves Cardinal), mas não consegue ter coragem para terminá-lo.
A relação entre Rhalp e a nova mãe faz com que ambos comecem a perceber que não precisam ser diferentes para serem aceitos. A principal preocupação de Rhalp é saber se a mãe seria uma espécie de RuPaul. Fato que, aparentemente, o faria ter muito orgulho.
Apesar de ter citado Ru Paul, não é de maneira burlesca que a personagem é apresentada. Sentimos na condução de Eisha o cuidado para apresentar uma comédia sem se utilizar de ganchos ou situações que posam colocar a personagem em uma situação de zombaria. Ainda que tenha extremo respeito pelo trabalho de RuPaul, tenho certeza de que ela concordaria de que existe uma diferença entre transgênero e drag queen (homens que costumam se travestir como parte de seu trabalho artístico). Em um momento no qual as identidades de gênero, as expressões de gênero e as orientações sexuais ainda estão sendo discutidas, é muito fácil para o espectador que não está acostumado a tratar sobre esses temas, colocar “tudo no mesmo saco”. Até mesmo o que digo aqui não está completamente consolidado. O fato é que transgênero costuma ser utilizado para falar de pessoas que não estão confortáveis com o gênero biológico que lhes foi dado no nascimento.
É com pequenos movimentos que a diretora desconstrói essas confusões. Ser transgênero não é a única característica de uma pessoa. E, em um diálogo simples de Sid com o filho Rhalp, Marjara, que também é roteirista do filme, nos dá essa cutucada. Logo no início do longa-metragem ouvimos uma Sid ainda preocupada com a reação de sua família, dizer que sempre se sentiu fantasiada em seu próprio corpo masculino. Não são movimentos fáceis.
Sid é transgênero, trabalha como designer de interiores e é quieto, calado. É sua relação com Rhalp que o faz começar da dançar, por exemplo. É com o menino que os diálogos mais complexos surgem. Sempre com a aceitação e compreensão de seu filho.
É fato que essa geração consegue lidar com as questões de gênero de maneira mais fluida entendendo que , no final, o que importa é perseguir a própria felicidade.
Aorganização do Canadá no Brasil acertou ao trazer “Venus” na Semana LGBTQI+ que tem, sim, como foco a transição de Sid, mas que, com a inserção de seu filho, mostra o comum: estamos sempre em mudança. E, sem descambar para a superficialidade. Porque mudar é difícil.
Lembramos que aqui mesmo temos a crítica do documentário sobre “Indianara” (2019), figura importante pelos direitos dos LGBTQI+ no Brasil.
Veja o trailer: