Sinopse: Em “Higiene Social”, Antonin é uma espécie de dândi. Seu talento com as palavras poderia ter feito dele um escritor famoso, mas, ao invés disso, ele se vale de sua habilidade para livrar-se de problemas. Dividido entre a angústia de fazer parte da sociedade, ao mesmo tempo em que pretende escapar dela, seu charme e sua inteligência serão desafiados por cinco mulheres que estão prestes a perder a paciência com sua maneira de lidar com a vida: sua irmã, sua esposa, a mulher que ele deseja, uma coletora de impostos e uma vítima de suas atitudes.
Direção: Denis Côté
Título Original: Hygiène Sociale (2021)
Gênero: Drama
Duração: 1h 15min
País: Canadá
Da Aristocracia à Malandragem
“Higiene Social” foi o terceiro filme de nossa maratona da 45ª Mostra SP e é curioso como ele dialoga de formas diferentes com os dois anteriores. O novo longa-metragem de Denis Côté que está presente na mostra Perspectiva Internacional foi premiado no Festival de Berlim de 2021 com o troféu de direção na seção Encontros. Assim como “Má Sorte no Amor ou Pornô Acidental” de Radu Jude, vencedor do Urso de Ouro no mesmo evento. Em comum, formas alternativas de explorar o contexto de distanciamento social que aplacou a sociedade em todo o planeta desde o início do ano passado pela pandemia de covid-19.
De forma inventiva, o cineasta canadense nos traz cenas teatralizadas, estáticas e com marcações que denotam o isolamento de seus personagens. Antoine é o protagonista que interage com mulheres de seu círculo mais próximo como irmã, esposa e amante. Uma forma de brincar com a rotina que nos deixou em contato limitado com as pessoas mais próximas de nosso convívio. Como seria essa situação se as ferramentas tecnológicas não permitissem que aplacássemos a saudade e a carência por outros meios?
Bom, essa reflexão se torna mais distante visto que “Higiene Social” nos permite outras óticas de análise dentro de sua narrativa simples, baseada em diálogos de um personagem que cria versões de si para se adaptar às situações que encontra pelo caminho – enquanto, caso você queira acreditar nele, dorme em seu carro. Um pouco do que tratamos em nosso texto sobre “O Refúgio” (2020), drama com Jude Law e parte do catálogo do Amazon Prime Video, no qual um empresário inglês alterna realidades (em casa e no trabalho) para deixar sua família dentro de um redoma (ou de um ninho, título original da obra).
É aqui que o filme de Côte dialoga com “A Taça Partida” (2021), produção espanhola da Competição Novos Diretores assistida em sessão dupla da Mostra SP. O Antoine aqui é um homem atemporal, não enquanto qualidade, mas como prova de que a visão sobre a masculinidade enquanto característica de poder opressor e dominante da sociedade se reproduz através do tempo. O diretor não apenas traz essa proposta como cria um jogo visual, no qual os comportamentos, vocabulários e, principalmente, os figurinos não nos permite enquadrar aquelas representações em uma linha temporal bem definida.
Assim como uma possível convenção espacial, já que estamos no alto de uma montanha, de grama alta e um visual impessoal. Ao nos isolarmos em nossas bolhas (ou ninhos) e usar as tais ferramentas tecnológicas, levamos conosco essa impessoalidade das relações. Com isso, a experiência de assistir a essa espécie de comédia de costumes com um toque canadense pode soar estranha. Um protagonista que, de forma ardilosa, cria histórias, usa palavras, jargões e frases de efeito como se a vida fosse apenas um jogo. Alguém que não quer usar seu talento de forma propositiva e seguir atalhos que prometem o máximo de benefício com o mínimo de esforço – e até uma dose de diversão.
Algo que só é possível porque é um homem que foi ensinado a acreditar que aquelas outras pessoas orbitam em torno dele. Com o passar das sequências, Côte vai tirando essa ideia de centralidade de Antoine, principalmente quando coloca três agentes em cena – e encontra um humor físico em um duelo de espadas à distância que poderia ser um esquete pandêmica de Monty Python se eles estivessem na ativa em 2021. “Higiene Social” nos prende em sua narrativa de alguém que vive pequenas farsas, na tentativa de enganar parentes, amigos e – claro – o Estado, mostrando que na complexidade das relações humanas estamos a um passo de sermos vítimas, seja de um aristocrata ou de um malandro.
Veja o Trailer: