Leia a crítica de “Ida Red”, estreia da faixa Première Telecine.
Sinopse: Ida Red pode não sobreviver à pena de prisão de 20 anos por assalto à mão armada. Ela se vira para seu filho, Wyatt, em busca de um último emprego e uma chance de recuperar sua liberdade.
Direção: John Swab
Título Original: Ida Red (2021)
Gênero: Thriller | Drama
Duração: 1h 51min
País: EUA
Os Imorais
Exibido no Festival de Locarno de 2021, o thriller que mistura ação e drama familiar “Ida Red – O Preço da Liberdade” é a grande estreia da semana na faixa Première Telecine. A produção da Universal, que fica disponível também no serviço de streaming do tradicional canal de filmes do Grupo Globo, reúne o inoxidável Josh Hartnett e a vencedora do Oscar de atriz coadjuvante de 2011, Melissa Leo (por “O Lutador” e indicada dois anos antes na categoria principal pelo bom – e esquecido – “Rio Congelado“).
Usando referências do meio-oeste dos Estados Unidos para nomear seus personagens, o diretor e roteirista John Swab consegue equilibrar bem a forma como mistura as narrativas aqui. O longa-metragem é focado na imagem de Wyatt (Hartnett), irmão mais novo de Dallas (Frank Grillo). Com uma vida dedicada ao crime, ele não mede esforços para tirar a mãe, Ida (Leo) da cadeia. A senhora, portadora de uma grave enfermidade, cumpriu apenas doze dos 25 anos aos quais foi condenada em uma prisão de segurança máxima. O objetivo do filho é trazer uma morte digna para ela.
Ao mesmo tempo “Ida Red” opera em frequências diferentes. Temos o embate familiar entre outro núcleo, formado pela irmã, Jeanie (Deborah Ann Woll), sua filha Darla (Sofia Hublitz) e o marido Bodie (George Carroll). Este é policial na cidade e está, junto a um agente do FBI, à procura dos responsáveis pelo assassinato de dois caminhoneiros e o roubo de uma carga de remédios de responsabilidade do Estado – sequência esta que abre o filme em prólogo. Esta atratividade dos agentes da lei para o ambiente familiar não é novidade, algo que outras histórias ficcionais usam como argumento.
Uma delas é “Breaking Bad” (2008-2013), série de sucesso da década passada que não parece ter escapado da lista de inspirações do cineasta. Não apenas na costura da trama – e aqui podemos citar como outro exemplo a forma como o advogado vivido por William Forsythe opera como um aliado do crime, usando um pouco de exotismo de sua imagem para não deixar isso transparecer, tal qual o Saul Goodman de Bob Odenkirk. Estamos diante de mais uma obra que moderniza, pela ótica da ação, dilemas parecidos com o western como clássica história “americana”.
Por isso, o trabalho de incluir outros embates, alguns flertando com a tragédia, parece ainda mais difícil. Se não há grandes sequências dramáticas ou um clímax catártico que deixa o espectador em busca de ação tão satisfeito, o filme parece conseguir criar relações empáticas com boa parte dos personagens, o que já é um feito no meio do bombardeio de estreias que pulam de forma algorítmica em nossa timeline. A jovem Darla é um exemplo de como complexificar uma subtrama, valorizar o trabalho de uma representante do elenco de apoio, usando elementos básicos para gerar identificação do público.
É pelo olhar dela que há um debate sobre como nossos parentes tendem a ser nossos modelos. Isso se apresenta também na preocupação da mãe de Darla sobre como a influência do passado (e presente) da avó e tios se dará. Jeanie (antes da virada de trama que não traremos aqui) vai nos apresentando consciência de que, dentro daquela dinâmica familiar, ela também possui sua cota de sacrifício. Vai muito além da ideia de acolher ou renegar nossos entes queridos de acordo com seus atos, escolhas e comportamentos. Isso parece chegar ao momento crítico no auge da adolescência da filha, que vai angariando subsídio para a revolta natural da idade.
Mantendo o clima de suspense e balanceando o que virá a seguir, desde as revelações sobre o passado, o último grande crime de Dallas e Wyatt e a tentativa de libertação de Ida, o longa-metragem encontra espaço para alguns diálogos interessantes. Talvez o principal deles seja a forma como o personagem de Hartnett conta para a sobrinha como o histórico de crimes tomou conta daquela família. Mais do que julgar e questionar se não seria possível fazer diferente, a conversa sobre motivações e justificativas não deixa de ser uma forma de aproximar (e não repelir) a jovem.
Perto do fim, Melissa Leo tem uma grande cena em que é explorado seu potencial dramático, antes de um clímax de ação tão bem executado quanto a sequência inicial de “Ida Red“. O título da crítica soa como uma ironia, se pensarmos que a moralidade nunca é o grande aspecto da obra. É mais porque fez lembrar do filme do mesmo título, estrelado por John Cusack e Anjelica Huston em 1990. Ali Stephen Frears cria uma engrenagem feita para descambar na tragédia. Aqui há um tipo diferente de apego ao realismo, mostrando que toda a existência já é trágica. Cabe a nós fazer com os intervalos entre nossas desgraças o que bem entendermos.
Veja o Trailer: