Irmandade | Uma Amizade Tóxica

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45ª Mostra SP LogoSinopse: Em “Irmandade”, Maya e Jana são adolescentes e inseparáveis. Jana costuma assumir a liderança das ações e é seguida pela amiga. Até que um dia, ela convence Maya a postar um vídeo em que Elena, a garota mais popular da escola, aparece fazendo sexo com o interesse amoroso de Maya. O vídeo viraliza e Elena vê sua vida destruída. Após um violento confronto entre as três garotas, Elena desaparece. Maya quer ir à polícia, mas isso não está nos planos de Jana. Maya, então, passa a ser o seu novo alvo, ao mesmo tempo em que tenta encontrar coragem para sair desse relacionamento tóxico e lidar com o segredo que ameaça arruinar o seu futuro.
Direção: Dina Duma
Título Original: Сестри (2021)
Gênero: Drama
Duração: 1h 30min
País: Macedônia do Norte | Kosovo | Montenegro

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Chantagem e Culpa

Dentro da Competição Novos Diretores da 45ª Mostra SP, “Irmandade” traz a amizade entre duas adolescentes na Macedônia do Norte, em narrativa universalista da cineastas Dina Duma que nos remete a algumas outras boas produções assistidas ao longo de 2021. Após passar pela Berlinale Talents do Festival de Berlim há cinco anos, a realizadora lança agora seu primeiro longa-metragem colocando luz sobre o impacto do linchamento virtual na vida dos jovens.

Bem diferente da sex tape que dá início à trama de “Má Sorte no Sexo ou Pornô Acidental” (2021), de Radu Jude, aqui Elena (Marija Jancevska), a menina mais popular da escola, é captada praticando sexo oral no namorado, Kris (Hanis Bagashov). As responsáveis pela gravação são Maya (Antonija Belazelkoska) e Jana (Mia Giraud). A primeira tem sua rotina movida pela paixão pelo garoto já citado e a segunda exerce forte influência em uma amizade que se transforma em uma abusiva relação de poder.

Apesar do mote de “Irmandade” ser a captação e difusão ilegal – há questões específicas em jogo, como o fato do próprio celular de Elena enviar o vídeo para seu perfil nas redes sociais – Duma não tem pressa em chegar neste momento. Desenvolve bem a relação entre as protagonistas, nos ambienta em um grupo de adolescentes que pautam suas atitudes nas selfies, stories, reels e derivados. Usa o próprio audiovisual de dispositivo, com captações de smartphones na posição vertical, como parte da linguagem do próprio filme. Explora a água como elemento na transmissão de fluidez, de forma a lembrar “Raia 4” (2019), produção brasileira dirigida por Emiliano Cunha.

Ao contrário de “Slalom – Até o Limite” (2020), produção francesa comandada por Charlène Favier, destaque da seleção da edição especial do Festival do Rio, aqui todas as dinâmicas de opressão envolvem os próprios jovens. Eles que se agridem e machucam em suas convenções, reproduzem através do bullying a misoginia e condenam o ato de Elena como se fosse ela a criminosa. Já Maya, instigada a praticar uma pequena vingança que ganha proporções grandes, graves e previsíveis, é achacada a todo instante por Jana, que coloca medo sobre uma eventual confissão da menina.

Nada disso seria convincente se Duma não criasse bases sólidas nessa narrativa. A personagem de Belazelkoska é apresentada como alguém que sofre um doloroso processo de separação dos pais e a própria trilha sonora do filme vai criando uma aparente tensão em contraste com o ato inaugural. Nele, Maya e Jana são vistas como se vivessem o melhor momento de suas vidas, em passeio e festas com os colegas, em um olhar deslumbrado da câmera da cineasta, que formula bem o andamento da obra e usa essa mudança nas representações para, ao mesmo tempo, fragilizar e vilanizar (um pouco) as duas meninas.

O caminho óbvio de “Irmandade” é aquele que consome a mente de qualquer adolescente que faz algo muito errado. Sem conseguir afastar da mente a culpa pelos seus atos, ao mesmo tempo que precisa lidar com a chantagem de alguém que acreditava ser sua confidente, o espectador não encontrará o fechamento do ciclo de Maya, apesar de nos darmos por satisfeitos por largamos daquele pesadelo que seus traumas não deixarão ela sair.

Na fluidez e no dinamismo da contemporaneidade, nos quais os problemas se empilham, o luto pode ser mais breve do que imaginamos. Às vezes postar um “RIP” é o suficiente para se sentir menos pior. E seguir a vida, enquanto novos abusos e agressões acontecem em todos os lugares.

Veja o Trailer:

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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