Sinopse: Documentário que narra a trajetória do jornalista, Deputado Federal, Secretário de Estado, Ministro de Estado, Governador e Embaixador, José Aparecido de Oliveira que conviveu com as maiores autoridades e personalidades do meio político, empresarial e cultural do Brasil e do mundo.
Direção: Mário Lúcio Brandão Filho e Gustavo Brandão
Título Original: José Aparecido de Oliveira – O Maior Mineiro do Mundo (2019)
Gênero: Documentário
Duração: 1h 29min
País: Brasil
Ideais e Ideias
A política institucionalizada é uma zona cinzenta. Essa afirmação não é de um desiludido e nem de um simpatizante do movimento antipolítica, seja ele revolucionário ou anti revolucionário. Trata-se apenas de um reflexo da forma como a democracia participativa se coloca, principalmente em um país com autonomia administrativa a municípios e Estados da Federação. O documentário “José Aparecido de Oliveira – O Maior Mineiro do Mundo” nos ajuda a compreender essa assertiva, nos apresentado um dos representantes mais sábios de todo esse tabuleiro.
O filme, assistido durante a cobertura da 15ª CineOP, já tem como cartão de apresentação um elenco de entrevistados notáveis, tanto do meio artístico quanto dos bastidores do poder. Entre eles, Ziraldo e José Sarney – todos eles falando da forma como o biografado conseguia unir representantes de diferentes espectros políticos e os aconselhava como se estivesse, de certa forma, acima dessas disputas. Fernanda Montenegro diz que José Aparecido de Oliveira “tinha a brasilidade na alma“. De fato, toda a trajetória do longa-metragem dirigido por Mário Lúcio Brandão Filho e Gustavo Brandão é de celebração. De um homem que, longe do nacionalismo integralista, pensava o Brasil com a grandiosidade que ele merece.
A facilidade de se comunicar fez do Jornalismo o primeiro ofício do protagonista. Até os anos 1970 era comum esse autodidatismo e a presença de jovens nas redações. José Aparecido, que chega a Belo Horizonte para tentar melhorar as condições da família (era o filho mais velho e o pai faleceu quando ele tinha onze anos), funda o jornal Binômio. Aplica uma linguagem irônica, debochada, que leva a recordes de tiragem – na medida para uma publicação com periodicidade menor (era um jornal quinzenal e, depois, semanal). Rapidamente ele é cooptado por uma das velhas raposas da política, que aplicava em Minas Gerais o velho coronelismo: Magalhães Pinto, dono do Banco Nacional.
“José Aparecido de Oliveira – O Maior Mineiro do Mundo” conta a trajetória de alguém que, para dar sua contribuição a um sistema, precisa fazer parte dele – e chega a Brasília no governo de Jânio Quadros. Mas o golpe militar de 1964 era um preço muito alto e que ele não estava disposto a pagar. Aqui podemos traçar um paralelo com as eleições de 2018. Depois de um quarto de século em que a polaridade política parecia ser a centro-esquerda do PT e a centro-direita do PSDB, uma nova velha onda nos fez ver que a maré poderia subir (e muito). Até hoje, passados dois anos de governo Jair Bolsonaro, não há uma movimentação real de uma oposição que articule uma frente ampla pela democracia. Temos nossos Josés Aparecidos por aí, que instados a seguirem no centro das ações, com o poder da caneta na mão, passaram por cima da rivalidade antiga e aderiram de imediato à resistência. Assim como em 1964, não está sendo o suficiente para a escalada autoritária na qual estamos.
O protagonista do documentário era da UDN e, mesmo assim, progressista – a ponto de romper com Magalhães Pinto na época citada. Com direitos políticos cassados, seguiu desempenhando sua realpolitik (e talvez em uma visão menos negativa do que a comumente mencionada). A liberdade de opinião foi um dos princípios que José Aparecido entendia sagrado e garantiu que o Pasquim seguisse de pé em uma de suas crises, por exemplo. O que levou a uma teia tão complexa de formas de pensar o Brasil foi a hospitalidade de Oliveira, que transformou sua casa em uma zona neutra de ideias e gostava de receber muita gente. Há uma preocupação no filme em reiterar que ele não era uma personagem de ideologias nulas ou adaptáveis para se manter no alto do palanque (característica que podemos reservar ao próprio Sarney, sempre sob os holofotes).
Aos poucos, em uma montagem que prima pela linearidade temporal, a importante figura da política de Minas Gerais vai se revelando fundamental para a redemocratização – e ainda mais para a Cultura brasileira, formulando – ao lado de Darcy Ribeiro – as primeiras Secretarias Estaduais e o finado Ministério da pasta. Sua boa articulação política nos deu o primeiro bem cultural da contemporaneidade e ele, quando teve a oportunidade de estar na linha de frente, primou pela representatividade – seja no território de Brasília, seja nas políticas culturais. Aliás, apenas na parte final que homens não-brancos (exceção às mulheres, todas familiares e a Fernanda Montenegro) têm a oportunidade de se manifestar. Uma culpa, vale frisar, que não é do filme – apenas um reflexo de quem sempre teve o poder nas mãos no Brasil.
Expressões como “poder moderador” e “algodão entre cristais” são algumas das utilizadas para definir as formas como José Aparecido de Oliveira agiu em sua vida pública. Ela chega ao fim em uma importante missão diplomática para a independência política do Timor Leste e na criação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – o prêmio máximo da entidade possui seu nome até hoje. “José Aparecido de Oliveira – O Maior Mineiro do Mundo” apresenta uma relevante figura política do século XX a uma nova geração. Pessoas que verão em algum momento alinhamentos supra ideológicos e partidários se formando para nos tirar do fundo do poço ao qual estamos sendo jogados. Aqui não há uma crítica a quem defenda ferrenhamente seus ideais, por mais que tenham adeptos insuficientes para se tornar aplicáveis ao país. Não devemos nunca esmorecer diante do que pensamos ser o certo, isso é louvável – mas talvez negociável em alguma circunstância aguda. O momento chegará e algumas das lições dessa antiga raposa serão revisitadas e, sem dúvida, aplicadas.
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