Seres, Coisas, Lugares

Seres, Coisas, Lugares

Sinopse: A obra do renomado escritor Guimarães Rosa possui um forte lastro documental a partir do qual as estórias são criadas. O filme “Seres, coisas, lugares” faz o caminho inverso: parte da literatura de Guimarães Rosa – mais precisamente do conto “O recado do morro” – e vai em direção à realidade que a inspirou.
Direção: Suzana Macedo
Título Original: Seres, Coisas, Lugares (2019)
Gênero: Documentário
Duração: 51min
País: Brasil

Seres, Coisas, Lugares

Doces Saberes

Seres, Coisas, Lugares” atualiza o conto de Guimarães Rosa “O Recado do Morro”. A cineasta Suzana Macedo nos mostra que há um conceito de Brasil, suas bases em pilares de conhecimento, que insiste em permanecer viva. Se a obra do falecido autor pode dar uma sensação de memórias, país e Minas Gerais vindas do passado, o média-metragem apresentado da CineOP não deixa dúvidas de que eles seguem pulsantes.

O material original, um longo conto que faz parte da antologia chamada “Corpo de Baile”, conta a história de três homens (um naturalista vindo de outro país, um religioso e um catedrático) que transitam pelo território beirado pelo Rio São Francisco. Uma metáfora para as formas como o Brasil se formou, fundado em um colonialismo eurocentrista e católico. Em expedição pelo sertão, eles têm contato com moradores que mostram todo o conhecimento oriundo da terra – algo que parece inatingível para o pragmatismo e a sanha exploratória e destruidora daqueles seres estranhos àquele ambiente.

Suzana Macedo, então, nos apresenta os responsáveis pelo legado desse conhecimento. “Seres, Coisas, Lugares” – com um subtítulo de “notas avulsas de uma viagem ao sertão”, não coloca um olhar estrangeiro direto na obra. Todos os discursos e interações são de representantes locais, cabendo ao espectador aplicar a sua visão – o seu desconhecimento – sobre o filme. A forma como ele é montado nos coloca em uma espécie de roda de conversa (apesar dos depoimentos serem colhidos isoladamente). Iniciamos com causos mais corriqueiros, ligados aos indivíduos, como o amor de Maria de Lourdes pelo seu Tonico (que não conseguiu amar mais ninguém) e das 153 namoradas do seu Nonô. Aquelas histórias que formaram a ideia da personalidade do sertanejo, o matuto, como uma das grandes figuras do imaginário brasileiro.

Aos poucos o lirismo vai tomando conta da obra. Seu Mauro é um maestro, que trabalha cantando. Até que, pela música, chegamos na verdadeira juventude daquele território, representada por Washington. Ele inicia sua participação falando de forma crua sobre a morte do pai, apontando dentro da casa onde e como ele se matou. Em seguida, vai revelando suas duas grandes características: o tradicionalismo e a religiosidade. Ele parece se destacar como o grande guia da história – e nos apresenta ferramentas e utensílios de sua residência como se ela fosse um museu natural em construção.

É da facilidade de comunicação de Washington que “Seres, Coisas, Lugares” segue o rumo do conhecimento encapsulado. As propriedades medicinais das ervas locais, a personalidade de seu Nonato – descrito como um farmacêutico – e também de Magela, com suas diversas formas de antecipar o clima da localidade, provavelmente bem mais eficiente que alguns meteorologistas. A oralidade permitiu que os entrevistados se apresentassem como guias de conhecimento, uma forma de traçar nossos destinos que anda em baixa aqui na cidade grande. Por fim, Suzana Macedo ainda trás algumas lendas da noite para enriquecer ainda mais seu filme, que deixa também um legado e uma mensagem: ainda é possível uma real conexão da Humanidade com a terra.

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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