Leia a crítica de “Justiça em Família”, estreia da semana na Netflix.
Sinopse: Um viúvo arrasado (Jason Momoa) promete levar à Justiça as pessoas responsáveis pela morte da esposa. Ao mesmo tempo, ele precisa proteger a filha (Isabela Merced), a única família que lhe resta.
Direção: Brian Andrew Mendoza
Título Original: Sweet Girl (2021)
Gênero: Ação | Drama | Thriller
Duração: 1h 49min
País: EUA
Brincando com a Morte
A estreia mundial da Netflix dessa sexta-feira, que deve concentrar as atenções dos espectadores assim como “Beckett” (2021) na semana passada, é “Justiça em Família“. Talvez esse crítico esteja passando por um momento de boa vontade, quem sabe reflexo da primeira dose de sua esperançosa vacina, mas o longa-metragem estrelado por Jason Momoa consegue trazer, para um gênero surrado como o da ação, uma boa virada e um embasamento que valoriza o argumento do roteiro.
O Aquaman aqui é Ray Cooper, homem que – mesmo com todos aqueles músculos e olhar intimidador – não consegue salvar a vida de sua esposa, Amanda. A culpa não é tanto assim do destino. Em tratamento contra um câncer, ela não consegue receber doses de um remédio promissor em casos como o seu. O motivo? Uma das grandes da indústria farmacêutica faz um lobby para que o produto seja retirado do mercado, com a intenção de gerar um ganho de marca pela oferta represada.
Antes de começar a pancadaria, o texto de Gregg Hurwitz e Philip Eisner desenvolvem bem o mote. A raiva que surge pelo tipo mais asqueroso de especulação. É o empresário e a classe política brincando com a vida das pessoas porque só querem maximizar seus lucros e obter ganhos fáceis. Isso é potencializado em países como os Estados Unidos, que não oferecem um sistema universal e gratuito de saúde para seus cidadãos, taokey? Não esqueça isso aí, taokey? Essa base de motivação do primeiro ato poderia se transformar em balão de ensaio se a narrativa desenvolvida pelo diretor Brian Andrew Mendoza fosse genérica.
Ela não apenas não é como, a partir da filha de Ray, a jovem Rachel (Isabela Merced), adiciona um terceiro vértice na relação familiar que não está ali apenas para ser mais um fator de preocupação do macho alfa que outrora concentrava nele as atenções. Além de um rosto conhecido entre o público mais novo, Merced constrói bem sua personagem, que seguirá os passos do pai no processo de justiçamento. Absorvendo uma realidade em que nem o Estado, nem a mídia e nem os outros se importam com a morte da mãe, ela quer fazer parte dos planos de Cooper.
“Justiça em Família” até que entrega um pouco seu plot quando coloca Momoa em prólogo dizendo que o passado pode surgir para nós como um sonho. Passados seis meses do incidente envolvendo o representante do laboratório, o mundo parece ter esquecido do desabafo de Ray na televisão. Além do lobby, a filantropia como forma de propagandear uma suposta preocupação social da farmacêutica parece tornar a vingança ainda mais sem sentido aos olhos da sociedade. Porém, quem apanha não esquece. Rachel, então, começa a se preparar para ser parte do que ela e o pai entendem como solução.
É compreensível que parte do público se frustre com o longa-metragem. Para que essas bases se formem de maneira crível e bem fundamentadas, a ação fica em segundo plano. Ela demora a ganhar a tela, inicia na base das lutas corporais, mas ganha na metade da sessão proporções épicas. Quando o filme já tinha nos ganhado, seria compreensível Mendoza ampliar a voltagem e deixar o thriller tomar conta da narrativa até o final. Porém, não é isso que acontece. Sempre que pode, Momoa e Merced retomam o arco dramático, para tornar mais efetiva a ideia por trás do encontro dessas identidades e da conexão genética. Tal qual uma passagem de bastão, para que a virada do roteiro que inicia o terço final do longa-metragem não soe forçada.
Digo isso porque a lógica é que pareça assim. Quando a verdade é revelada, a montagem usa o mesmo expediente que tanto criticamos em “Filhos de Istambul” (2021) – que não apresenta elementos para que seu plot twitst nos surpreenda de maneira positiva. Pelo contrário, nos sentimos apenas enganados. Aqui, não. Uma trama bem costurada que nos deixa com vontade de retornar ao início da história, assistir novamente para ver em que momento Rachel se encontra de forma autônoma com o seu destino. O melhor de tudo é não segurar essa mudança de cenário para os momentos finais (a produção turca faz, literalmente, no último minuto).
Desta forma, “Justiça em Família” ainda permite que Isabela Merced ganhe um ato final inteiro para mostrar que Jason Momoa é grande, mas não é dois. E que uma boa fita de ação depende mais de carisma de seu elenco e boas ideias de seus realizadores do que músculos e explosões em excesso. Ou talvez eu esteja errado e você tenha até tirado uma pestana enquanto se decepcionava com mais uma obra da Netflix. No hard feelings, como diriam os gringos.
Veja o Trailer: