Los Lobos

Pôster Los Lobos Crítica Olhar de Cinema

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Sinopse
: Para muitos, o isolamento social não é uma invenção da pandemia. Realizado antes de qualquer quarentena sanitária, Los Lobos se baseia nas lembranças da infância do seu diretor: um mexicano que, repentinamente aos cinco anos de idade, se vê habitando, com sua mãe e irmão mais novo, uma terra estranha (ironicamente chamada de Novo México) em outro país. Lá, enquanto a mãe sai para trabalhar, as crianças vivem confinadas ao interior de um pequeno e desconfortável apartamento. Assim como suas imaginações e engenhosidade, o cinema se torna uma expansão de experiências e máquina de gerar empatia.
Direção: Samuel Kishi
Título Original: Los Lobos (2019)
Gênero: Drama
Duração: 1h 35min
País: México

Los Lobos Crítica Filme Olhar de Cinema Imagem

No Hay Nadie Como Tu

O mundo capitalista. O sonho da vida digna que será possível a todos a partir do crescimento de uma economia global que procura extrair o máximo de todas as suas matérias-primas, mas com consciência coletiva (também podemos ser irônicos, o chamado “capitalismo consciente”). Já deu para perceber depois que mais de um século que a organização econômica e social tal qual imposta pelo sistema que construímos e do qual fazemos parte não irá trazer beleza para todos. Alguns , entretanto, ainda tentam lutar contra as cercas e as poupanças fartas que os separam de uma pequena parte da população que lutará com unhas e investimentos para continuar com seus privilégios.

Los Lobos“, de Samuel Kishi, é uma crítica a esse sistema e à vulnerabilidade a qual ele expõe alguns corpos que acreditam (por falta de opções) que poderão romper a barreira que os separa dos sonhos. Ao migrar para a cidade de Juarez (fronteira com a tríplice cultura estadunidenses/mexicana de Texas, Arizona e Novo México), a intenção de Lucia é promover aos filhos uma educação e um futuro mais tranquilo ou, ao menos, menos difícil do que parece ter sido suas experiências até então.

Como muitos que tomam essa decisão, Lucia não tem exatamente um plano ou conhecidos que possam dar suporte enquanto trabalha durante o dia inteiro para continuar viagens. É aí que adentramos o mundo de Max (8 anos) e Leo (5 anos). Os meninos, trancados em um quarto de um condomínio criam um mundo paralelo no qual a metáfora do lobo, sugerida pela própria mãe, passa a dar força para aguentar todas as mudanças, mesmo sem entender qual será o próximo passo dado.

Crianças, por mais flexíveis que sejam- e o são, demandam resposta do adulto que será responsável por sua formação. Porém, Lucia, já cansada e sem tempo deixa de fazer esse papel e os meninos passam a criar brincadeiras e entendimentos próprios, ainda que baseados na fita k7 que a mãe deixa com regras essenciais para a sobrevivência de ambos.

Sem falar o idioma, sem poderem sair do quarto e com um receio não verbalizado, mas muitas vezes demonstrado em suas expressões, eles passam a contar com a ajuda da locadora do apartamento, uma senhora chinesa que, assim como eles, pouco fala inglês. Um outro ponto de vista de migrantes que saíram de seu país de origem, mas se encontram em uma espécie de limbo. A cidade de Juarez, tal qual mostrada no filme, aliás, se assemelha a tudo que uma fronteira pode nos trazer à mente. Não é apenas uma questão de limites territoriais, mas culturais.

Kishi explora bastante o mundo interno criado pelos meninos antes que eles tenham finalmente, coragem (ou desobediência) para sair. A pouca diferença de idade entre Max e Leo faz com que o primeiro já se sinta desconfortável desde o primeiro momento e, mesmo que embarque nas brincadeiras propostas, exige algumas respostas da mãe. Dentro do quarto semimobiliado o tempo é outro. Os planos detalhes e os sons cuidadosamente concebidos dizem muito do que é ver enquanto criança ou do que é perceber o mundo enquanto ainda se há uma certa inocência que nos mantêm falsamente seguros.

A verdade é que nem dentro, nem fora do apartamento, os meninos estão seguros e, por um lado, é bom que não saibam disso. Assim, suas imaginações tomam conta das fronteiras que nós, adultos, instituímos. São muitas. Tantas. Talvez, demasiadas para que um corpo aguente por muito tempo. O esgotamento de Lucia é não somente compreensível como esperado. As Lucias, essas, também são muitas.

O diretor Samuel Kishi faz questão de mostrar em “Los Lobos” o rosto de muitas histórias que poderiam ser contadas no lugar dessas. Quando tudo parece dar errado, ainda há alguma esperança?

O desamparo existe em todos os idiomas e não sei responder à questão que acabei de colocar, mas parece que a sensibilidade que só as crianças conseguem ter, com as coisas que só as crianças conseguem ver, parece que aí pode residir um tanto de esperança para nós.

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Em constante construção e desconstrução Antropóloga, Fotógrafa e Mestre em Filosofia - Estética/Cinema. Doutoranda no Departamento de Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) com coorientação pela Universidad Nacional de San Martin(Buenos Aires). Doutoranda em Cinema pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Além disso, é Pesquisadora de Cinema e Artes latino-americanas.

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