Madeira e Água

Madeira e Água Crítica Filme 45ª Mostra SP Poster

45ª Mostra SP LogoSinopse: Em “Madeira e Água”, após se aposentar do trabalho na igreja de sua cidadezinha, na Floresta Negra, Anke está ansiosa para rever os filhos durante as férias de verão no mar Báltico. Porém, no último minuto, Max, um de seus filhos, não consegue se juntar à família por causa dos protestos que tomam conta de Hong Kong, onde vive. Sem vê-lo há muitos anos, e depois de um verão um pouco tedioso, Anke decide visitá-lo. Ela passa os primeiros dias sozinha em território estrangeiro, esperando Max voltar de uma viagem de negócios. Tomada por protestos, Hong Kong é para Anke um enigmático novo mundo por onde ela se move com cuidado, mas também representa uma aventura, uma escapatória.
Direção: Jonas Bak
Título Original: Wood and Water (2021)
Gênero: Drama
Duração: 1h 19min
País: Alemanha | França | Hong Kong

Madeira e Água Crítica Filme 45ª Mostra SP Imagem

Hong Kong Café

Parte da Competição Novos Diretores da 45ª Mostra SP, a produção alemã “Madeira e Água” marca a estreia do cineasta Jonas Bak em longas-metragens. Com boa passagem pelo Festival de Berlim deste ano, onde recebeu menção especial do júri da mostra Perspectiva, a obra é mais uma que traz uma visão sobre o Hong Kong e seus protestos recentes, uma pauta que sempre agrada às nações capitalistas do Ocidente. Muito de seus discursos e incongruências foram tratados em nossas críticas dos documentários “Do Not Split” (2020) e “Por Trás da Muralha de Tijolos Vermelhos” (2020), respectivamente indicado ao Oscar de 2021 e presente na seleção de filmes do 10º Olhar de Cinema.

Aqui, entretanto, o olhar estrangeiro de seu realizador opta pelos caminhos que misturam com a ficcionalidade, trazendo uma atratividade residual para essa temática. O filme acompanha a história de Anke Bak, uma mãe que consegue a tão sonhada aposentadoria e visitará seu filho no território chinês, pois ele não consegue sair do país para visitá-la durante as manifestações. Jonas já atuou como diretor de fotografia de Hong Kong e faz do homem que não vemos seu ater-ego invisível. Antes de chegar nesse ponto, cria belas imagens da região da Floresta Negra, cordilheira alemã.

Ele usa as diferentes perspectivas para falar do domínio da religião na cultura campesina daquela mãe, que aparece de início orando com um Jesus crucificado que parece gigante aos olhos da câmera. Doando seus melhores anos e esforços para o crescimento e desenvolvimento daquela comunidade, sobretudo em sua fé, Anke é uma senhora cheia de vontade de ver o mar, que surge como uma narradora com saudades do pai e dos filhos, com uma casa recheada de lembranças em objetos e fotografias. Em “Madeira e Água” acompanhamos essa virada de chave, do momento em que tentamos nos convencer de que nossa missão laboral foi cumprida para o “dia um” do que deveria ser nosso descanso.

Se há algo que parece mais próximo de nossa rotina quando temos mais “tempo livre” é a chegada de notícias – pelos meios que habitualmente usamos, seja TV, internet ou o antigo papel. O mundo parece mais assustador e diferente de outros tempos quando ficamos mais em casa, pensando naqueles que precisam manter uma agenda intensa por conta de seus compromissos. Um fenômeno que passamos com pais, tios ou avós quando eles começam a gastar horas com essas leituras de uma sociedade que soa mais violenta e falida do que o habitual.

Anke, então, seguirá seu caminho e sai do seu núcleo comunitário do interior em uma bonita sequência no qual atravessa um túnel. Na outra ponta desse pequeno arco que reflete uma viagem, não encontramos Berlim ou outra grande cidade alemã ou europeia. Os arranha-céus, a iluminação neon e os aspectos ultra tecnológicos nos revelam a Hong Kong que a protagonista desbravará para permanecer mais perto do filho. Em alguns momentos, essa passividade e comportamento introspectivo da personagem, em um road movie acidental faz o longa-metragem se parecer com outro do cinema alemão, que ano que vem completa trinta e cinco anos: “Bagdá Café” (1987).

No filme de Percy Adlon não há reatividade e sim convivência por parte Jasmin, assim como acontece com Anke aqui. O território no qual ela se encontra soa assustador em seu gigantismo e não podemos deixar de trazer conosco as leituras daquela sociedade que ela acompanhou pela TV. Vivemos com ela a expectativa de encontro, a ambientação forçada enquanto espera o filho e suas visões da massa de pessoas se deslocando em mais um protesto. É como se a protagonista se visse, depois desse deslocamento, dentro de um filme que ela começou a assistir do sofá de casa.

Madeira e Água” nos confronta com as doenças das grandes cidades. Pelos agentes que rompem a tela, há um pouco de ansiedade e depressão naquelas representações cinzas. Ficamos feliz quando nossa guia, imbuída dos princípios do tai chi chuan, retorna para a Floresta Negra. Nem a cultura que criou essa prática consegue mais associá-la a uma rotina moderna, de muita urgência e pouca reflexão. Nesse mundo em velocidade acelerada,  melhor para Anke é ser apenas uma visita.

Veja o Trailer:

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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