Chega ao circuito brasileiro nesta semana o francês “Mais que Especiais”. Leia a crítica.
Sinopse: “Mais que Especiais” é a história de dois homens que dedicam suas vidas a crianças e adolescentes com autismo há vinte anos. Sendo os responsáveis por duas organizações sem fins lucrativos, eles têm a função de ensinar a jovens vindos de locais carentes, que foram recusados por outras instituições, a serem cuidadores de casos extremos. A grandes parceria e entre os dois amigos e sua dedicação mostram uma realidade emocionante e fora dos padrões tradicionais.
Direção: Olivier Nakache e Éric Toledano
Título Original: Hors Normes (2019)
Gênero: Drama | Comédia
Duração: 1h 54min
País: França | Bélgica
Perspectivas
“Mais que Especiais” chega ao circuito comercial do país pela Califórnia Filmes após passagem pelo Festival Varilux de Cinema Francês do ano passado. Dirigido por Eric Toledano e Olivier Nakache (também responsáveis por “Samba” de 2014 e “Intocáveis“, grande sucesso de 2011), o longa-metragem foi destaque no César de 2020, prêmio mais importante da indústria audiovisual francesa. Foram nove indicações, incluindo melhor filme, direção, roteiro – além de duas menções na categoria de ator, tanto para Vincent Cassel quanto para Reda Kateb. Nessa nova produção, outra estreia de 2021 no Brasil, mais uma vez, a dupla de cineastas aposta em um tema sensível.
Aqui, acompanhamos a história de Bruno e Malik, dois coordenadores de instituições que recebem jovens e adultos com transtorno de espectro autista e, por conta própria, desenvolvem maneiras de aproximação e adotam métodos para que a relação desses com as demais pessoas se torne menos acidentada.
Até bem pouco tempo pouco se ouvia falar sobre autismo (o dia a conscientização do autismo foi criado em 2007) e ainda há muita desinformação sobre o tema. É possível que nosso medo de entender a percepção como ação cognitiva que faz parte de uma relação entre nosso corpo e o ambiente nos afaste de uma busca por esse mundo que é tão diferente do que percebemos.
Os protagonistas de “Mais que Especiais” fazem o caminho oposto. Ao optarem por desenvolver um trabalho com pessoas com autismo severo passam também a procurar compreender a particularidade de cada situação e alterar o método de acordo com cada um. Evito utilizar a palavra paciente porque não é dessa maneira que o filme trabalha as personagens. Bruno e Malik funcionam como condutores de um processo que é feito tanto com as pessoas que são encaminhadas para as instituições como com os acompanhantes. Todos passam por uma espécie de iniciação em conjunto com o espectador.
Embora mostre situações tensas e dificuldades que, algumas vezes, demandam uma adaptação lenta e dolorosa desses indivíduos para que possam dividir espaço com pessoas que não possuem o transtorno (e vice-versa), o longa-metragem se torna uma importante janela para aqueles que nada ou pouco sabem sobre o assunto. Os diretores conseguem mesclar cenas de humor entre Vincent Cassel e Reda Kateb (que perderam o César para Roschdy Zem, do ainda inédito “Roubaix, une Lumière”) sem perder de foco a seriedade. Cada entrave burocrático e cada tempo de espera pela acomodação que surgem com uma nova chegada, é também uma abertura que nos faz pensar quantas variáveis devem ser levadas em conta toda vez que os amigos se comprometem com as instituições.
Dois casos mais graves de fuga ocorridos durante a trama paralisam ao nos dar uma pequena amostra de como uma situação corriqueira pode ser apresentar terrivelmente assustadora para alguns. Nossa incapacidade de perceber o outro é descoberta.
Assim, “Mais que Especiais” deixa algumas pistas de como podemos tornar nossa troca com todos os seres mais prazerosa e desafiadora. O processo inicia-se ao compreendermos que o mundo e as coisas que nos cercam são vistas e sentidas de modos diferentes. Para aqueles que se propuserem, pode ser um convite a ser relacionar de maneira mais flexível e menos dogmática.
Veja o Trailer: