Sinopse: “Meu Primeiro Verão” traz a história de Claudia, 16 anos, que cresceu isolada do mundo exterior. Presa em uma propriedade remota após a morte de sua mãe, ela fica chocada quando Grace, uma animada adolescente local, aparece no jardim como uma miragem, uma brisa de ar fresco e açucarado.
Direção: Katie Found
Título Original: My First Summer (2020)
Gênero: Romance | Drama
Duração: 1h 18min
País: Austrália
Em Busca de Perguntas
Com uma capacidade impressionante de garimpar boas produções que fogem da lógica do circuito de festivais tradicionais, a Supo Mungam, através de sua plataforma de streaming Filmicca, lança no Brasil o lindo “Meu Primeiro Verão“. Um filme que ultrapassa a construção de uma relação de afeto a partir de um encontro improvável e de características e comportamentos que afetam a mesma lógica padronizadora de qualquer sociedade a qual a arte decide retratar.
Uma obra que, até seu ato final, permite ao espectador uma via de projeção de realidade, de se ver no outro – e até que ponto este outro existe a partir de nós mesmos – para uma conclusão que extrai poesia a partir do amor, uma “brisa de ar fresco e açucarado” como induz a sinopse oficial, sempre bem-vinda em tempos de ódio.
O longa-metragem parte do encontro de Grace (Maiah Stewardson), uma adolescente da cidade, com Claudia (Markella Kavenagh). Esta acaba de perder a mãe, que a mantinha em uma casa isolada do convívio humano. A célula de proteção construída pela escritora Veronica Fox (Edwina Wren) era tão sólida que até mesmos conhecimentos sobre as proximidades da propriedade não chegaram à garota. Em interpretação extensiva, podemos entender que foi usada a premissa da excentricidade e da necessidade de se manter alheia ao mundo de uma artista para que ninguém soubesse da existência da menina.
Porém, nada é confirmado porque as informações extraídas como verdade são apenas aquelas que precisamos para compreender aquele recorte da história. Por sinal, um exercício de desprendimento e de desconstrução da ideia de julgamentos sobre atos e tudo o que os antecede que, no caso desta produção, a torna ainda mais fascinante,
Nos próximos meses, “Meu Primeiro Verão” deverá atrair dois públicos diferentes. O primeiro é o fandom de “O Senhor dos Anéis”, interessados em conhecer Stewardson, confirmada no elenco regular da nova série sobre a Terra-Média no Amazon Prime Video, onde dará vida à Tyra, do núcleo élfico da trama. O segundo é aqueles que verão o nome de Matthew Chuang, diretor de fotografia da promissora produção norte-americana “Blue Bayou” (2021), escrita, dirigida e produzida por Justin Chou e apresentada na mostra Um Certo Olhar do Festival de Cannes da última semana. Ninguém (apenas os preconceituosos intolerantes) se decepcionará, já que estes são alguns dos ótimos trabalhos de um longa-metragem irretocável, o primeiro da jovem cineasta Katie Found, que já demonstra muito talento.
O texto, também de sua responsabilidade, é mais do que as velhas reproduções sobre um coming of age de descobertas e de expressões de desejos reprimidos. A história se ergue como um amor forjado pela confiança, pelo complemento. Ao propormos uma leitura projecional, vale salientar o quanto Claudia – uma adolescente que vive à margem da sociedade – encontra em Grace uma outra pessoa que parece querer o mesmo destino. Para além da casualidade, uma proposta parecida com o curta-metragem brasileiro “Letícia Monte Bonito, 04” (2020) e que nos apresenta formas de deixarmos de ser invisíveis.
Até mesmo as lacunas da narrativa se tornam elementos fundamentais e atrativos na obra. As motivações da mãe Veronica, sem dúvida vinculada ao medo do que sua filha sofreria em uma comunidade que deve ter lhe magoado muito, abre um leque de possibilidades. Found, entretanto, constrói a obra de maneira direta, tal qual um conto de uma coletânea sobre o amor e suas improbabilidades e formas de expressão.
Com duas protagonistas que tem suas dramas ampliados pelos traumas e que se conectam, a cada novo passo, em um elo forte de afeto, “Meu Primeiro Verão” é movido pela sensibilidade do olhar de uma cineasta que vai pelo caminho da prosa poética para fundir drama e romance sem que nós possamos segmentá-los, um procedimento que já se mostrou contrário aos objetivos de promover o amor contra o ódio, sempre injustificável e escondido sob o manto do julgamento.
Veja o Trailer: