O Céu da Meia-Noite

O Céu da Meia-Noite Crítica Filme Netflix Pôster

Sinopse: Em “O Céu da Meia-Noite”, um cientista solitário no Ártico se apressa para contatar uma tripulação de astronautas em viagem de retorno, para evitarem uma misteriosa catástrofe global.
Direção: George Clooney
Título Original: The Midnight Sky (2020)
Gênero: Ficção | Fantasia | Drama
Duração: 1h 58min
País: EUA

O Céu da Meia-Noite Crítica Filme Netflix Imagem

Os Passageiros e a Agonia

Quem ainda precisa de narrativas de descobertas mundanas e sentimentais de pessoas à deriva no espaço? Quem ainda aguenta? Um filão que se renova com base em estrelas que ancoram projetos em Hollywood há, pelo menos, cinco décadas. Misturando a idealização de uma viagem que ultrapassa os limites da atmosfera com o potencial de imagens que o Universo tem para nos entregar, seguimos recebendo novos produtos que fazem releituras parecidas – com resultados quase tão imprevisíveis quanto as possibilidades do infinito espaço-tempo. A bola da vez é “O Céu da Meia-Noite“, drama dirigido por George Clooney que chegou à plataforma de streaming Netflix perto do Natal de 2020 e foi há poucas semanas indicado ao Oscar de melhores efeitos visuais.

O astro e cineasta gosta de revisitar gêneros clássicos do cinema norte-americano. No ano em que fez, até agora, seu melhor trabalho na função (em “Boa Noite, Boa Sorte” de 2005, pelo qual foi nomeado pela Academia por direção e roteiro original), ele ganhou o troféu de consolação como ator coadjuvante de “Syriana” (2005). Desta vez ele nos ambiente em fevereiro de 2049 e une duas propostas. Na primeira, o protagonista Augustine (interpretado por Clooney) é um cientista que permanece baseado no Observatório Barbeau (fictício e de arquitetura inspirada na Estação Comandante Ferraz do Brasil na Antártida). Com uma doença terminal, ele se sacrifica a permanecer na superfície enquanto a humanidade se alocou no subsolo após um evento apocalíptico. Ou seja, uma narrativa de confinamento – que muitos vincularam ao momento do planeta, há um ano tentando conter o avanço da pandemia da covid-19 com táticas de isolamento social.

A outra proposta está na nave espacial Aether, que está retornando da área de Júpiter com uma tripulação que não sabe que a superfície da Terra se tornou inabitável. O filme nos prenderá a atenção pelas tentativas de Augustine de, em um último sacrifício, informar aos astronautas que é melhor ficar onde estão. Ou seja, uma narrativa de humanos à deriva no espaço e seu dilema de retornar ao seu planeta-natal. Quase como se desmembrasse as representações de “Passageiros” (2016), uma dessas ficções científicas que, como já mencionamos, se financiam por atrair atores que acham interessante ter este tipo de obra no currículo. No caso, Chris Pratt e Jennifer Lawrence.

O mesmo já ocorreu com Ryan Gosling em “O Primeiro Homem” (2018) e Brad Pitt em “Ad Astra: Rumo às Estrelas” (2019) – com o adicional de poderem trabalhar com cineastas como Damien Chazelle e James Gray. Temáticas parecidas e resultados longe do ideal. Parte da crítica que admira Gray comprou a relação estabelecida entre pai e filho, mas todas essas obras citadas se unem pela sensação de metáfora rasteira, de vincular a imensidão do espaço com as grandes questões sobre o risco ou proximidade da morte (ou ressureição mal sucedida) de seus protagonistas.

Não que a intenção não seja válida, mas “O Céu da Meia-Noite” retoma leituras que soam cansadas, ultrapassadas. A ideia de se ver sozinho no mundo, de ser a última esperança da Humanidade, de se sacrificar por um grande feito quando, na verdade, há uma busca por redenção e a salvação de si mesmo… Os dramas no espaço só não são abolidos de vez porque usam a mesma muleta: as belas (e artificialmente construídas) imagens daquilo que o espectador nunca terá a chance de alcançar (e que bom, o que esteve mais perto disso no país virou vendedor de travesseiro e depois Ministro de um governo genocida). Há quase vinte anos, Clooney já havia topado a releitura de uma obra-prima de Andrei Tarkovsky e estrelou a versão estadunidense de “Solaris” (2002). Por aqui, ele enquanto diretor até tenta ir além da linearidade e da trama simples de um objetivo só, mas isso exigirá que você embarque na ideia de que é possível ver parte das sequências envolvendo Augustine como delírios do personagem. Bem pouco para nos envolver na história e tirar o gosto de genérico da boca.

Baseado no romance de estreia da jovem escritora Lily Brooks-Dalton, o filme tem o reforço da marcante trilha sonora original de Alexander Desplat. Talvez o grande diferencial da mesmice das obras já citadas, porque estamos falando de um dos compositores que consegue guiar nossas emoções da melhor forma no cinema atual. A ideia de que o próprio Clooney quer se inserir em tipo de produção bem específico foi uma frase a ele atribuída de que vê seu longa-metragem como um encontro de “Gravidade” (2013) e “O Regresso” (2015). O primeiro co-estrelado por ele ao lado de Sandra Bullock e o segundo escrito por Mark L. Smith, também roteirista de “O Céu da Meia-Noite“. No fim, essa manifestação só adiciona mais duas xaropadas para nossa lista de metaforizações forçadas do audiovisual norte-americano. Nos últimos anos, qualquer tentativa de trazer a natureza e o espaço como elementos fundamentais tem sido assim: depressivo e desolador. O filme de Clooney também é – mas não da forma poética como eles querem que seja.

Veja o Trailer:

 

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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