“Os Pequenos Vestígios”, thriller com Denzel Washington e Rami Malek, é uma das novidades da HBO Max. Leia a crítica.
Sinopse: Em “Os Pequenos Vestígios”, um policial começa a ter problemas em sua investigação devido a seu passado obscuro e sua tendência por quebrar as regras.
Direção: John Lee Hancock
Título Original: The Little Things (2021)
Gênero: Crime | Mistério | Drama
Duração: 2h 8min
País: EUA
Espírito de Corpo
Mais uma produção que surgiu bem na temporada de premiações, mas perdeu logo força chegou ao espectador brasileiro via streaming esta semana. “Os Pequenos Vestígios” (2021), thriller criminal que reúne três vencedores do Oscar de melhor ator, passa a integram o catálogo da HBO Max. Após indicações pouco compreensíveis ao Globo de Ouro e SAG Awards de um Jared Leto que reproduz performances exageradas de outros tempos, o longa-metragem soa como um compilado de possibilidades narrativas e as ferramentas utilizadas pelo seu texto para provocar mistério. Primeiro sobre autoria, depois materialidade e, por fim, sobre a motivação de um aparente serial killer tresloucado.
A sensação se confirma quando surge nos créditos o nome do diretor e roteirista John Lee Hancock. O texano conseguiu boa entrada em todos os seus projetos na última década replicando fórmulas. Começou com o prêmio da Academia a Sandra Bullock em “Um Sonho Possível” (2009), drama esportivo, baseado em fatos, em um troféu que era bem mais o reconhecimento de um importante nome do star system hollywoodiano dos anos 90 e 00 do que destreza artística. O lobby político foi mais fácil do que se imaginava, em um ano sem um arrasa-quarteirão na categoria (tanto que a cadeira cativa de Meryl Streep foi ocupada pelo apenas simpático “Julie e Julia“). Porém, ao conseguir emplacar outra nomeação, como melhor filme, os trabalhos seguintes do cineasta atraíram atenção – e bons nomes para o elenco.
Hancock, então, atua em zonas de conforto. Se enquanto roteirista foi homem de confiança de Clint Eastwood, nos ótimos “Um Mundo Perfeito” (1993) e “Meia-Noite no Jardim do Bem e do Mal” (1997), sua virada de chave na carreira não trouxe mais do que obras medianas. Usando o panorama histórico e curiosos nomes, foi por suas mãos que conhecemos a história por trás da adaptação de um dos grandes musicais da Disney em “Walt nos Bastidores de Mary Poppins” (2013) e o imbróglio envolvendo os primeiros anos do MacDonald’s e os segredos de seu sucesso como rede de fast food em “Fome de Poder” (2016). Nenhum deles soa inesquecível, apesar de atores e atrizes de destaque e uma produção caprichada.
“Os Pequenos Vestígios” segue esta lógica e nos coloca no ano de 1990. Nele, o detetive Jim Baxter (Rami Malek) é designado para investigar a série de assassinatos que acontece em seu distrito e no vizinho. Jovem, cheio de energia e midiático, ele terá o auxílio do xerife Joe Deacon (Denzel Washington). Experiente, discreto, observador e – sobretudo – eficiente. Ao perceber a força narrativa do fato junto aos jornais, Albert Sparma (Jared Leto) se coloca como réu confesso dos crimes. A dupla de policiais fica, então, na dúvida: seria ele um serial killer exibicionista ou um mentiroso? Ao contrário do que deveria acontecer, o rumo das investigações segue uma rota de questionar o próprio assassino.
O pequeno exercício de maneirismo que pode ser lido pelas decisões do diretor deve ser tão questionado quanto o comportamento de Sparma. Todos os indícios do “crime” parecem se conectar, mas notas de produção indicam que ele, de fato, escreveu o roteiro em 1993, logo após concluir sua primeira parceria com Eastwood – e a ideia é que o próprio Clint assumisse. A ambientação no início de uma década marcada por thrillers de motes parecidos, desde adaptações literárias de sucessos editoriais norte-americanos até as produções de David Fincher, como o clássico “Seven – Os Sete Crimes Capitais” (1995) e “Zodíaco” (2007), que revisita os anos 70 e 90 com distanciamento histórico. Toda a construção nos leva a acreditar que Hancock quer se inserir neste rol, apesar de suas criações anteriores tenham o mesmo verniz de realidade e criatividade – bem menos sucedido do que as soluções de Deke. Sua leitura anacrônica não o impediu, então, de abandonar ou reformular este projeto.
Portanto, parte da diversão da sessão será investigar as motivações não de Sparma e sim do diretor. O que há por trás de tantas reproduções, que vão do início de relação difícil de parceiros de missão às expectativas sobre o próximo passo de seus agentes – passando por um clímax que nos leva para uma área distante da cidade, na rodovia no meio do deserto parecido com a grande revelação de John Doe (Kevin Spacey) há 25 anos. O que não dá para defender muito é a receptividade positiva de Jared Leto, que não encontra o tom do personagem e parece torná-lo uma nova versão de seu Coringa de “Esquadrão Suicida” (2016) – que já não era bom.
O ato final, principalmente o que há de substância após o clímax, talvez seja o que há de destaque em “Os Pequenos Vestígios“. A partir da obsessão dos agentes da lei por resolver um caso importante, da justificativa dos fins pelo meio e do falso sentimento de que a justiça foi feita, há uma rede corporativista que torna o Estado mais humanos e, portanto, mais falho do que gostaríamos que ele fosse. Interessante que inverter essa ideia e pensar em plots possíveis mostra que seu criador possuía algo potencialmente mais criativo do que ele coloca em prática. O resultado é a reciclagem de um texto de quase trinta anos com um medo de errar que o mantém na bolha de mediocridade.
Veja o Trailer: