Sinopse: Em “Pressão Atmosférica”, à medida que as vacas são ordenhadas, uma tempestade cataclísmica se forma no horizonte. Sob o ataque, o verão desaparece. Um meteorologista vai investigar. Seu equipamento o leva à fazenda, que agora está abandonada. Sob tais condições bizarras, ele constantemente perde o controle da realidade.
Direção: Peter Treherne
Título Original: Atmospheric Pressure (2020)
Gênero: Experimental
Duração: 40min
País: Reino Unido
Experimentamos Demais
“Pressão Atmosférica” consegue, em poucas cenas, trazer a grande relação de causa e consequência que o Capitalismo devastador das últimas décadas provocou no planeta. O filme do diretor Peter Treherne, não deve ter figurado na lista dos mais assistidos do Festival Ecrã, onde estava disponível. Provavelmente, aquele espectador que não estava preparado ou de coração aberto para a viagem, deve ter usado a liberdade quarentênica de ter o mundo todo à disposição – mas sem sair de casa – e desistiu do filme. Pois bem, trata-se de uma das obras que mais provoca debates no que há de mais urgente na sociedade. Sim, é puro clichê essa última frase. Mas o média-metragem britânico possui essa definição.
Dez dos primeiros quarenta minutos da produção nos traz um processo de ordenhamento coletivo de vacas. A fotografia em preto e branco estiliza todos as representações em “Pressão Atmosférica“. Aqui há uma grande contribuição: a de amenizar o sofrimento. Por vezes, a câmera oferece certo distanciamento. Este é necessário para que a fruição de proteína animal esteja incrustada em grande parte da população – que não participa da cadeia produtiva. Chegamos na grande gênese da desconscientização do consumo, que atingiu níveis alarmantes. Sem perceber, a falta de olhar crítico neste processo em especial ampliou o leque de opressões e explorações – inclusive o aprofundamento do desrespeito ao trabalhador.
Quando ficamos um bom tempo encarando aquele processo, podemos criar esse vínculo, essa relação de causa (nosso consumo) e consequência (vidas sendo usadas como objetos de produção em escala industrial). Treherne, entretanto, vai além. Ele adiciona o reflexo ambiental nessa proposta de contemplação crítica – esteticamente linda, por sinal. Traz o aumento da força das chuvas e raios, causados pela pecuária. Não esqueça que, para ter gado, é preciso desmatar. Poderia trazer aqui alguns links que mostram os dois lados, mas a defesa do cientistas agropops da atividade como algo “regenerativo” à Natureza causou embrulho ao meu estômago desacostumado com carne. Veja, independente de seguir ideologias (sugiro só seguir alguma se tiver certeza que isso não o fará um incoerente – ou que faça, mas que você não tenha problema em lidar com isso, que é meu caso) urge raciocinar no sentido de uma diminuição de consumo. Só que esse é o pecado mortal da sociedade capitalista.
Por isso “Pressão Atmosférica” é uma obra de grande potencial. Porque, ao reduzir representações, ela nos dá uma grande ferramenta a favor do pensamento: tempo. Ilustra com a atividade agropecuária, depois com o caos causado pelas chuvas, as dificuldades de transporte e de comunicações. Quando vemos aquele lamaçal e uma quantidade de vacas e galinhas aparentemente condenadas a ter um esboço de vida pela incompetência dos seus “donos” nos questionamos: há mesmo uma comunhão da Humanidade com a Natureza? Por fim, o filme se vale da imagem do pombo, o animal perfeito para traçar paralelos com os humanos. Como propaganda, gosta de representar e pregar a paz. Na vida real, possui grande poder de adaptação – podemos até dividir uma sopa de pedras com eles (nós com a sopa e eles com as pedras).
Uma nova planilha recheada de números é a visualidade que reinicia o processo. Um novo dia, novos ordenhamentos. Está de volta a “Pressão Atmosférica“.
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