Queens

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Sinopse: A história gira em torno de Dylan Pettersson (Molly Nutley), uma jovem de 23 anos que vive em uma pequena ilha e sonha em ser dançarina. Ela começa a trabalhar na limpeza de um clube de drags chamado Queens, onde o melhor dançarino e coreógrafo do local (Fredrik Quinones) descobre seu talento sem querer. Dylan quer muito participar da apresentação, mas ela é mulher e o show é de drag queens. Será que Dylan vai conseguir realizar seu sonho?
Direção: Helena Bergström
Título Original: Dancing Queens (2021)
Gênero: Comédia | Drama
Duração: 1h 50min
País: Suécia

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No Balanço da Apropriação

A produção sueca “Queens” chegou esta semana ao catálogo da Netflix correndo o risco de ser invasiva em relação à representatividade LGBT+. Em uma trama que coloca uma jovem aspirante a dançarina em um contexto onde deverá fingir ser uma drag queen, deverá atrair atenção pela forma de comédia leve, que muitos chamam de feel good movie. Por trás desta proposta, aquela pensada pelos algoritmos da plataforma de streaming para conquistar o seu play (olha quanta perda de identidade linguística há neste parágrafo), há algumas questões trabalhadas – nem sempre de uma forma corajosa.

Dylan (Molly Nutley), prenome comum de dois gêneros, nos é apresentada em um estendido luto pela morte de sua mãe. Visita o túmulo onde a mulher, falecida com pouco mais de quarenta anos, está enterrada. Mostra como sua avó tenta, apesar das limitações da idade, segurar a barra do pequeno mercado de propriedade da família. Registra que o pai, que tem na música um hobby, encontra muita dificuldade em superar a dor da perda. Temos uma protagonista ainda mais perdida em um momento-chave de nossas vidas, onde a busca pelos caminhos para o futuro se tornam mais urgentes.

Quem não sabe o que há por trás da narrativa se envolve com facilidade na trajetória de uma personagem que está sem aquela que lhe inspirava e incentivava. Mãe e filha dividiam o amor pela dança e sonhavam com uma carreira que tiraria Dylan da pequena cidade costeira da Suécia – a locação da obra é a espetacular Ulricehamn, que em 2010 contava com menos de dez mil habitantes. Ela, então, decide se ausentar da loja da família e de suas lições como professora de ritmos para as crianças e viajar a Gotemburg, onde o Grande Teatro (Stora Teatern) fará audições para uma famosa companhia de dança, a fictícia Dadelac.

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Como diriam meus amigos do Bola Presa: até ai, tudo bem. O primeiro ato de “Queens” se encerra quando a personagem descobre que perdeu a data dos testes e é convencida a se infiltrar como faxineira na boate que dá título ao longa-metragem. A ideia inocente é: passar uma semana acompanhando os ensaios de um grupo de drags para o novo espetáculo, onde teria contato com dançarinas experientes. Chegando lá, descobrimos que Tommy La Diva (Claes Malmberg) se mostra resistente a uma modernização de músicas e passos, querendo uma apresentação mais tradicional.

Neste embalo que uma nova página se inaugura na obra, desenvolvendo um novo arco dramático. Parece que caminharíamos para uma divisão de experiências, já que Tommy também vive a dor da perda, seu companheiro de vida e trabalho também faleceu. Ao contrário de “Xtremo“, filme de artes marciais espanhol (também lançado pela Netflix esta semana), a aproximação a partir de uma similaridade de sentimentos não se concretiza. Dylan soa deslocada enquanto agente observadora e a diretora Helena Bergström (que também assina o roteiro, ao lado de Denize Karabuda), precisa avançar na narrativa antes que esse estado de permanência afete o ritmo.

Contudo, o faz tirando o único trunfo que há na sinopse. O coreógrafo do espetáculo, ciente dos desafios que parecem insuperáveis há uma semana da estreia, gosta da forma como a jovem mulher dança e decide colocá-la no show. Uma apropriação cultural vinculada a identidade de gênero, que a certeza do sucesso do plano torna algo menor. Um “Tootsie” (1982) subversivo e contemporâneo que já sabe que entrará em terreno com grande potencial de danos. No momento mais pesado, o novo colega de Dylan usa a impressionante frase: “uma pena você não ser homem“.

Como se não bastasse ser essa a lembrança que perdura quase até o final da sessão, a cineasta ainda aumenta o potencial dramático da expressão ao repeti-la dentro da cabeça de sua protagonista. A partir daí temos uma mistura de “poderia ser pior” com uma sensação de embaraço do próprio filme, que parece consciente do dilema de gerar comédia a partir da simulação de uma mulher cis, fingindo ser um homem cis que se apresenta como drag queen. Com pouco desenvolvimento, a segunda metade de “Queens” acaba se tornando um apanhado de cenas indefiníveis entre o humor e o drama.

Ficamos esperando o final, aquele que definirá a mensagem que Bergström acaba atraindo para sua produção. O desenrolar do que seria o clímax de uma lição sobre desrespeito à identidade não é dos piores, de fato. Suas colegas de camarim acabam se sentindo traídas mais pela ausência de confiança em uma comunidade baseada no acolhimento do que no jogo de orientação sexual que ela precisa fazer. Até porque o filme foge disso ao máximo, preferindo tirar da cartola por três vezes o classicismo por trás do impacto cultural de “I Will Survive“, símbolo de resistência do tradicionalismo de Tommy.

Sem muito a acrescentar nos debates de apropriação e reapropriação de identidades, “Queens” cozinha o espectador em um banho-maria carente de graça, de sentimento e até mesmo de música. Ao optar por ser indefeso para não se tornar indefensável, não desenvolve nem a premissa de que a arte não depende de gêneros e nem deixa registrado o risco de danos quando cooptamos aquilo que nos convém.

Veja o Trailer:

 

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Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

11 Comments

  1. Eu adorei o filme. Ágil, com sentimento e lições de amizade e superação. Sem contar a beleza da dança, dos dançarinos e a fotografia. Maravilhoso! Recomendo.

  2. O filme é tecnicamente bem feito, a protagonista é uma boa atriz e convence muito na interpretação e a química dela com a personagem do coreógrafo é incontestável. Poderia ser uma comédia dramática interessante se se aprofundasse na questão da apropriação e desenrolasse a história por outro viés. Mas é impressionante como diretores e roteiristas em pleno séc XXI, ainda se permitem tratar de temas tão complexos, com necessidades tão urgentes, de forma tão negligente e cínica. É falta de vergonha na cara, que chama.

  3. nossa, ótima crítica. estou vendo o filme agora, mas pelo trailer não acreditei que ela ia virar uma drag queen. bell hooks fala sobre como o fetiche sobre o outro tem sido utilizado pela branquitude e cisgeneridade como forma de utopia, mas ainda de escape para as pressões do mundo capitalista, convertendo o outro em consumo, culturas coadjuvantes que são usadas para manter a estabilidade do poder ocidental.

  4. Não gostei do filme.. se diz uma comédia…. Mas até quase metade não há nada… desisti de assistir no meio.

  5. Parece uma série reduzida para um filme. Gostei do filme, principalmente da dança entre ela e o coreógrafo antes do fim do filme, no Teatro. Foi lindo.

  6. “correndo o risco de ser invasiva em relação à representatividade LGBT”
    O texto da crítica do Jorge Cruz já começa mal… Já vem com uma lacração desnecessária, onde tudo é invasivo ou “apropriação de cultura”. De cara o texto já fica chato.
    Ah! O filme… Por uma palavra: Uma merd@ !!

  7. O enredo é fraco, mas seguindo esse roteiro, o filme se desenrolou razoavelmente. Valeu a pena assistir pelo trabalho dos protagonistas, que, são jovens e bons. As danças executadas por eles é lindíssima! Mas o tema LGBT merecia ser retratado com mais dedicação.

  8. Gente, só um adendo sobre o filme Queens, eu tenho visto em varios sites dizendo que o filme foi gravado numa ilha suéca chamada Ulricehamn, mas está errado, esta cidade fica ao leste da Suécia, ainda na região de Vastra Gotland, mas não é uma ilha, eu e minha esposa moramos aqui em Gotemburgo, e estamos procurando saber qual o nome da ilha pra visitarmos, mas nem os proprios Gotemburgueses reconhecem o local. Abaixo segue o link da posicao geografica da verdadeira Ulricehamn.

    https://goo.gl/maps/4sLAvdqgcpij8RVT9

  9. Eu, como não sou crítica de cinema, kkkk gostei e gostei muito mesmo… superou minhas expectativas… mas concordo que faltou esse fechamento… boa crítica!

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