Leia a crítica de “Rua do Medo: 1994 – Parte 1”, estreia da Netflix!
Sinopse: Em “Rua do Medo: 1994 – Parte 1”, durante os corolários de uma brutal tragédia em Shadyside, Ohio, um grupo de adolescentes descobre uma série de eventos horríveis que assolaram a cidade podem não ser meros acidentes – e eles podem ser as próximas vítimas.
Direção: Leigh Janiak
Título Original: Fear Street Part One: 1994 (2021)
Gênero: Terror | Mistério
Duração: 1h 47min
País: EUA
Entre Luz e Sombras
Fala, Noventistas! Aqui não é o Nogy… A Netflix traz em julho uma proposta diferente de produção em seu catálogo. Na tentativa de criar um burburinho (ou o moderno buzz) sobre as novidades em seu catálogo, inicia com “Rua do Medo: 1994 – Parte 1” uma trilogia de horror que durará três semanas. Por sinal, um período em que boa parte das novas obras não consegue se manter na crista da onda (ou o moderno trending topic). A brincadeira com as novas leituras de expressões é parte de uma viagem tão carregada de saudosismo que deixa a impressão, cada vez mais comum, de uma mistura de algoritmos e referências, no fazer audiovisual popular que aplica cada vez mais a colagem enquanto premissa.
O filme, dirigido por Leigh Janiak, inaugura uma mitologia sobre a bruxa maneta Sarah Fier – baseada na série de livros Rua do Medo (são 16 publicados em português, de um total de 52). Ela seria a responsável por ondas de assassinatos violentos que ocorrem a cada dez ou quinze anos na cidade de Shadyside. Do outro lado da estrada, o município de Sunnydale é a versão conservadora-civilizada de uma comunidade que se pauta em uma disputa entre seus moradores. De um lado, crimes cruéis e ataque aos bons costumes e o uniforme de high school vermelho. Do outro, a calma de uma vida tranquila com as futuras gerações vestindo azul. No meio, Sam (Olivia Welch), uma ex-moradora de Shadyside, que vive uma paixão às escondidas com Deena (Kiana Madeira).
É inegável que a a construção da narrativa pela cineasta cria um interesse pelos lançamentos das próximas duas sextas-feiras. Os mais jovens repercutirão as cenas de gore, carregadas de sangue com corpos dilacerados dividindo espaço com uma tensão sexual constante. Tristes daqueles que não sabem a senha que libera as produções +18, mas acredito que ambiente controlado em uma casa com adolescentes atualmente é quase tão saudosista do que as muletas desta primeira história, roteirizada por Janiak, ao lado de Phil Graziadei.
As gerações mais velhas reencontrarão uma trama noventista de terror e horror, como os sucessos das franquias “Eu Sei O Que Vocês Fizeram no Verão Passado” (1997) e “Pânico” (1996). Não há a criatividade de reinaugurar gêneros, até porque há uma pilha de longas-metragens dispostos a resgatar o mesmo cenário: cidade do interior do Estados Unidos, grupo de adolescentes e serial killer. Fizemos uma sessão dupla com “Freaky: No Corpo de um Assassino” (2020), que chegou ao catálogo do Telecine, onde a atualização das questões de gênero se aliam à trama. Aqui, o arco é bem mais demarcado pela investigação sobre a ancestralidade que leva aos assassinatos. Apenas ao final do primeiro terço, a indução de um elemento fantástico, sobrenatural ou que ultrapasse as barreiras do espaço-tempo é proposto, tornando a introdução do filme aquela colagem já citada.
Por sinal, a cineasta exagera na abordagem referencial. Quem reclamou da trilha neurótica, que incluía sucessos do pop e do rock a cada esquina de “Cruella” (2021) passará os primeiros minutos um pouco zonzo. Uma construção noventista baseada na repetição de narrativa e nas memórias afetivas do maior número de ex-jovens possíveis. Quando ele parece abandonar esse expediente, a obra encontra certa força para andar pelas próprias pernas. Há até uma busca por tornar mais épica certas sequências, que seriam capazes de transformar a mitologia própria da trilogia bem mais grandiosa. A questão é que a diretora segue um caminho mais conservador ao montar o filme. Opta por uma grande quantidade de cortes, mesmo nas cenas sem a violência exagerada (e falsa, claro). Quer ganhar dinamismo no grito, mesmo ao custo habitual dos erros de continuidade – quase sempre pelas expressões e posicionamento dos atores – que gritam aos mais atentos.
No meio de algoritmos que lembram a forma “Stranger Things” (2016-) de contar histórias e algumas facadas bem dadas, “Rua do Medo: 1994 – Parte 1” talvez incomode pelas atuações um pouco perdidas de seu elenco jovem. Mas, em terra de quem tem um olho na TV e outro no celular, quem enxerga erro de continuidade e falta de expressividade do elenco é Rei! Em sua predileção por takes curtos, o filme será capaz de sobressaltar os menos (ou mais?) conectados até quando passa longe da ação. O preço para quem tira quase duas horas para prestigiar o início da trilogia é o cansaço nos momentos em que as mortes não ocorrem.
Não o suficiente para abandonarmos a ideia que a Netflix nos trás. O longa-metragem tem a função de criar expectativa sobre o que virá e os títulos das outras obras sugerem uma outra releitura algorítmica, agora dos shlashers dos anos 1970 e se encerra com a origem da bruxa no século XVII. O conflito entre luz e sombras de Sunnydale e Shadyside, com chance de tratar dos impactos das dinâmicas sociais naqueles territórios, surge como uma temática promissora. Talvez seja pedir demais que outros aprofundamentos narrativos sejam contemplados – apesar de tempo não faltar, Zack Snyder deve estar com inveja das quase seis horas de sessão que será criada por Leigh Janiak.
No bloco derradeiro de “Rua do Medo: 1994 – Parte 1“, os personagens que (aparentemente) se despedem nos entregam um quebra-cabeça pelas mãos de Josh (Benjamin Flores Jr.), enquanto somos levados a uma sequência que afunila a ação. Sobrevivemos com folga para aguentar o buzz desta semana, à espera da próxima. Resta saber como aqueles que deixarão para depois lidarão com os spoilers do menu inicial do seu aplicativo.
Veja o Trailer: