Sinopse: Um fantasmagórico conto sobre Marquês de Sade.
Direção: Raul Perrone
Título Original: S4D3 (2021)
Gênero: Experimental
Duração: 46min
País: Argentina
Sonhos com Perrone
Certa vez no corredor de um shopping em frente a uma tenda de balas de gomas na fila que abrigava o estande do BAFICI, meio desconcertada, arregalei os olhos e disse “oi, sou sua fã”. Era estreia do filme de Raul Perrone e eu, até então, não sabia que aquela seria apenas a primeira vez que o veria. Ele sorriu e respondeu algo como “que legal”. Mas, não com desdém. Ele, na verdade, foi respeitoso. Só achou desnecessário que alguém fosse fã de sua figura. Depois, ao me aprofundar em sua obra, comecei a entender o que aquilo poderia significar.
O cineasta é o tipo de artista que vive a obra por inteiro, mas não se deixa ser consumido por ela. Seus filmes são verdadeiras experimentações, mas não mais que isso. A vida é mais que um filme (e ao mesmo tempo não faz sentido essa comparação). Não deveríamos acreditar que películas poderiam governar nossos corpos e, quando o fazemos, deveríamos fazer com ironia. Está aí ,aliás, a força da criação,da arte e, portanto, do cinema. O que o torna capaz- diretor e o próprio cinema- de se reinventarem. Admito que essas frases , posteriormente acrescidas, aparecem para que ninguém me acuse de dizer que o artista vive o cinema com pouca intensidade, pois é o oposto do que faz. Poderíamos até entrar nessa questão filosófica e,talvez, em algum outro momento o faça. De qualquer maneira, não é casual que Raul tenha optado por escrever o mínimo possível sobre seus filmes antes de lança-los. Gosta de vê-los correrem soltos.
Assim, os filmes de Perrone vêm figurando o Festival Ecrã não por acaso. Depois de descoberto por qualquer circuito, sua obra cria uma espécie de vício, pois múltipla. Agora com “S4D3“, flerta novamente com o teatro como em “Hierba” (2016), mas de maneira inteiramente diferente. Quem teve a oportunidade de ver 4lgunxs Pibxs , obra que esteve na versão do mesmo festival ano passado, sente uma prova da mutação constante que é o argentino. O Marquês de Sade do realizador pode até não ter nada a ver com isso, mas, para mim, bateu como uma viagem de ácido com Gotan Project em uma noite pela Avenida Don Pedro de Mendoza, talvez com uma parada ocasional no Sale & Pepe sem perceber. E, a beleza do filme é permitir que cada um tenha uma relação própria com o mesmo. Como disse anteriormente,característica da obra do diretor.
Mas, é claro que o filme são filmes dentro de filmes. Tanto em relação às suas alternativas estéticas quanto às suas próprias histórias. O cineasta é capaz de se transformar em uma mesma película, ainda que em um média. Assim ocorre em “S4D3“. A fantasmagoria cresce com o decorrer do filme; que se revela, de fato, uma surpresa. Fantasmas presos à orgia ou pecados pagos em um eterno purgatório?
A música também opera tal qual seu maestro a dirige. Começamos com o tango eletrônico, passamos ao rock e chegamos quase a um freestyle que silencia quando o céu (?) se revela. É difícil também saber o que é céu, purgatório ou inferno. Afinal, tudo é percepção de nossas mentes.
Ou, seria tudo sonho?
Impossível deixar de destacar o incrível trabalho sonoro e de cor de “S4D3“. Todas distorções visuais trabalham em conjunto com a narrativa dessa história de Sade. A cara do plural Perrone que, como sempre segue a nos surpreender.
Clique aqui e acesse a página oficial do Festival Ecrã.
Clique aqui e leia nossos textos de filmes selecionados para o Festival Ecrã.