Sinopse: Em resposta à execução de Marielle Franco, as eleições de 2018 se transformaram no maior levante político conduzido por mulheres negras que o Brasil já viu, com candidaturas em todos os estados. No Rio de Janeiro, Mônica Francisco, Rose Cipriano, Renata Souza, Jaqueline de Jesus, Tainá de Paula e Talíria Petrone se candidataram aos cargos de deputada estadual ou federal. O documentário acompanhou essas mulheres, em suas campanhas, mostrando que é possível uma nova forma de se fazer política no Brasil, transformando o luto em luta.
Direção: Éthel Oliveira e Júlia Mariano
Título Original: Sementes: Mulheres Pretas no Poder(2020)
Gênero: Documentário
Duração: 1h 45min
País: Brasil
Como (re)viver na Perda
O documentário “Sementes: Mulheres Pretas no Poder” começa nas manifestações pela morte de Marielle, mas vai muito além disso. No livro Pensamento Feminista Negro, de Patricia Hill Collins, a socióloga norte-americana começa o capítulo “Por uma política de empoderamento” com trecho de Sueli Carneiro – essa filósofa e ativista brasileira – , que gostaria de citar aqui.
“Para fazer diferença na vida das mulheres negras brasileiras, temos que fazer mais que simplesmente esperar por um futuro melhor[…]. O que temos que fazer é nos organizar e nunca parar de questionar. O que temos de fazer, como sempre, é trabalhar duro.”
Partimos também desse pensamento de Sueli para entender a narrativa do documentário e explorar a série de manifestações e candidaturas de mulheres negras que vieram como resposta à morte da vereadora Marielle Franco. Se o filme pode ser entendido como um manifesto político , e o é, ele também é diagnóstico de uma sociedade adoecida e fragmentada que precisa retomar sua lógica de organização através daqueles e daquelas que compreendem melhor suas estruturas , pois as vivem verdadeiramente. O Rio de Janeiro, como insistimos em algumas de nossas críticas, é um Estado complexo. Com uma série de governos e prefeituras investigadas , nos resta tentar reinventar essas estruturas a partir de novos corpos.
A última eleição, que é retratada no documentário, foi particular no sentido de que racionalmente nada fazia muito lógica. Tivemos um governador inesperado, uma votação polarizada- que é demonstrada pela escolha de alguns eleitores que votaram lado a lado em PSOL e e PSL (então partido do Presidente), mas, ainda assim, conseguimos eleger Talíria Petrone, Renata Souza, Mônica Francisco e Dani Monteiro – todas negras.
“Sementes: Mulheres Pretas no Poder” acompanha os meses que antecedem a eleição e acompanha as candidatas em momentos de campanha pelos mais diversos espaços do Estado.
Ter quatro mulheres negras com votos expressivos eleitas não é pouco. Principalmente se pensamos no momento de retrocesso que vivemos. Embora sejam representantes de causas similares, é interessante observar suas singularidades. Em entrevista à uma TV espanhola, Renata Souza diz que não se sente herdeira de Marielle Franco porque precisam haver muitas herdeiras.
Essa ideia de que precisamos de uma nova Marielle, aliás, persegue a mente de algumas mídias que apostam mais ou menos fichas em alguns nomes possíveis para suceder a vereadora assassinada em 14 de março de 2018.
Marielle Franco foi, e é ,a soma de muitas outras mulheres, assim como Talíria, Renata, Mônica e Dani também o são. Se há algo que “Sementes: Mulheres Pretas no Poder” traz de maneira assertiva em sua narrativa , não é a força das mulheres negras. Disso já sabemos! O grande ganho dos últimos anos de luta pela representação e pela inserção de mulheres negras em todas as áreas de poder é fazer com que a subjetividade seja aceita. Seremos muitas, seremos diferentes e todas nós iremos lutar por objetivos distintos, mas sempre com um elo que nos conecta (e ,daí talvez o medo de quem não quer ver a estrutura mudar): sem o fim do racismo, não há democracia.
Essas mulheres não apareceram após a morte de Marielle, elas estavam se preparando durante anos, se aproximando dos complexos ritos da política, estudando, vendo a cidade crescer e sofrendo na prática. Como elas, muitas mais ainda virão. Podem esperar, ou melhor, se preparar.
O filme ficará até dia 30 de setembro no site da Embaúba Filmes. Uma boa oportunidade para refletir sobre as eleições que passaram e as futuras.
Veja o trailer:
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