Twisters

Poster de Twisters (2024)

Sinopse: Kate Cooper, uma antiga caçadora de tempestades assombrada por um encontro devastador com um tornado, dedica-se agora a estudar os padrões das tempestades em Nova Iorque. O seu amigo Javi, que está a testar um sistema de rastreamento inovador, vai trazê-la de volta ao terreno onde se cruza com Tyler Owens, um influenciador digital, sedutor e imprudente que gosta de publicar as suas aventuras nas redes sociais. À medida que a temporada de tornados ganha intensidade, começa um fenómeno nunca visto: Katy, Tyler e a sua equipa estão no caminho de múltiplas tempestades que convergem para o centro do Oklahoma
Direção: Lee Isaac Chung
Título Original: Twisters (2024)
Gênero: Ação | Aventura | Thriller | Catástrofe
Duração: 2h 2min
País: EUA | Japão

Imagem de Twisters (2024)

Novos Ares

Sendo cada vez mais raro um filme que não seja parte de uma franquia (saga, universo) faturar mais de cem milhões de dólares nas bilheterias domésticas, Hollywood há alguns anos (ou décadas) tem como missão principal garimpar qualquer sucesso do passado ou fracasso com ares saudosistas para colocar na praça uma produção que não tenha os arriscados selo do ineditismo e da originalidade. “Twisters”, lançamento de 2024 que chegou há algumas semanas no catálogo da Max, foi uma das apostas recentes.

A obra original de 1996 foi a segunda maior bilheteria daquele ano (atrás apenas de outro filme-catástrofe, “Independence Day”), além de ser escolhida nos Estados Unidos como primeiro filme a ser lançado em DVD (aliás, o que mostra a velocidade com qual a distribuição audiovisual se alterou, já que sua continuação menos de trinta anos depois chega em países – como o Brasil – que sequer possuem mais lançamentos em mídia física pelos grandes estúdios). “Twister” (1996), portanto, foi um sucesso inquestionável. Porém, não carregava consigo a palavra saudade ao ser lembrado pelos cinéfilos mais apaixonados.

Seria difícil convencer as pessoas a irem aos cinemas ver “Twisters” se o recorte de público fosse a “base de fãs”. E talvez isso tenha dado a liberdade que precisavam tanto o roteirista Mark L. Smith (desenvolvendo ideia de Joseph Kosinski, diretor originalmente escalado e que abandonou o projeto em nome de “F1”) quanto o diretor Lee Isaac Chung (do oscarizado “Minari”, de 2020). Sem o “peso” do elenco do clássico noventista para reciclar tramas (Bill Paxton faleceu em 2017 e Helen Hunt não aceitou participar fazendo somente uma ponta), o saudosismo precisou ser criado dentro da própria obra. Munido com a única coisa que sobrou do original, a Dorothy responsável por lançar os mapeadores dos tornados no longa-metragem de origem, aqui somos agraciados com um prólogo que cumpre duas funções importantes.

A primeira é promover uma falsa sensação de sucesso na primeira empreitada de Kate (Daisy Edgar-Jones), uma estudante que pretende adquirir uma bolsa de ciências ao provar que consegue “desarmar” um ciclone. Aliás, um dos muitos acertos da nova produção foi atualizar a maneira como cientistas e população lidam com esse fenômeno natural dentro da história. Isso respinga na experiência do próprio público. Os filmes-catástrofes, que fizeram muito dinheiro nos anos 1970 e na virada dos anos 1990 para 2000, saíram de circulação. Não queremos mais assistir formas ficcionais do mundo acabar porque, pelo que percebemos, ele já está acabando. O filme-catástrofe hoje pode ser assistido quase diariamente nos telejornais da maioria dos países.

No mais, a forma de monitoramento das variações climáticas se aprimorou (e muito) desde 1996. Não seria nem um pouco sedutor assistir mais uma vez em “Twisters” um grupo de pesquisadores que apenas querem “entender” o fenômeno. Porém, mais adiante veremos que essa dose de inconsequência ainda existe – e sobre outras formas na nossa sociedade. Portanto, a primeira função se conclui quando – ao contrário do filme original – a proposta de lançar o produto da pesquisa se conclui de plano, sem que este fosse o único tropo narrativo.

A segunda função é a de criar uma nova base narrativa, abandonando qualquer ranço do que foi criado por Jan de Bont nos anos 1990. O sucesso na empreitada é alarme falso e Kate acaba perdendo três amigos na chocante sequência de abertura. Passados cinco anos, acompanharemos uma nova incursão da protagonista pelo mundo dos tornados. Convidada pelo amigo sobrevivente, Javi (Anthony Ramos), ela tentará colocar em prática um projeto, agora sim, de mapeamento. Porém, tridimensional. Em homenagem a Dorothy (que, ao contrário de Helen Hunt, aceitou fazer uma ponta), Leão, Homem de Lata, Espantalho e Mágico são os apelidos das caminhonetes que devem chegar quase simultaneamente no local de formação do ciclone.

O roteiro de Smith retrata a sociedade contemporânea de forma muito interessante. A ficção agradece a ausência de limites dos seres humanos atuais. Presos em suas necessidades de espetacularizarem as próprias vidas, a equipe de pesquisadores ganha a companhia de youtubers que se colocam na linha de frente dos tornados com o objetivo de produzir imagens viralizantes e uma mistura de sentimentos capazes de “garantir o like”. Porém, essa leitura reducionista acaba sendo criticada pelo próprio filme mais adiante.

“Twisters” equilibra bem sequências típicas de filmes-catástrofes com diálogos que diminuem o ritmo da narrativa ao mesmo tempo em que aprofunda relações. Essa multidimensionalidade das personagens é a grande diferença para “Twister”. Reassistido em sessão dupla, o filme de origem parece ainda mais bobo. Preso em um fiapo de história na qual Jo (Helen Hunt) e Bill Harding (Bill Paxton) se encontram porque ela resiste em assinar o divórcio, o que vemos entre as cenas de ação é uma mistura de provocação de casal com um alívio cômico muito mal construído na figura de Dusty (o saudoso Philip Seymour Hoffman).

Já na produção lançada este ano, não. Tyler (Glen Powell), por exemplo, vai ganhando outra forma com o passar da trama. O que parecia ser um caça-click de internet exerce função importante na primeira pausa humanitária da obra. Nos faz questionar sobre a possibilidade de influência positiva das celebridades de internet e como muitas pessoas com grande conhecimento precisaram se adaptar às ferramentas de propagação de mensagem. De outro lado, o bom mocismo de Javi também se torna questionável ao nos depararmos com um rápido debate ético acerca do empreendedorismo de tragédia maquiado na forma de uma pesquisa financiada. Até mesmo o questionamento dele sobre as motivações de Kate lá no início da história contribui para a sensação de que estamos diante de um grupo de personagens sem qualquer verniz de heroísmo, humanos em seus defeitos e qualidades sob determinada ótica e encarando certas situações.

O diretor Lee Isaac Chung não explora tanto as possibilidades visuais de drones, câmeras GoPro, dentre outras ferramentas que poderiam levar as “lives” ainda mais dentro da obra, a tornando um pouco conservadora em sua linguagem. Essa escolha, todavia, passa longe de tirar os méritos de “Twisters”. Um filme que sabe a hora de baixar a tensão para criar sentimento ao lado da emoção da simples catástrofe. Bem mais intenso em seu conjunto do que a clássica imagem de uma vaca voando. Resta saber se os quase quatrocentos milhões arrecadados nos cinemas (ao custo de metade disso) será o suficiente para que exista um provável “Twist3r”.

Veja o trailer:

Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema associado à Abraccine e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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