Minari

Minari Filme Crítica Pôster

Sinopse: Uma família coreana imigra para o Arkansas, no interior dos Estados Unidos, para criar uma fazenda nos anos 1980.
Direção: Lee Isaac Chung
Título Original: Minari (2020)
Gênero: Drama
Duração: 1h 55min
País: EUA

Minari Filme Crítica Imagem

Boas Intenções

Minari“, aposta da A24 para empilha indicações ao Oscar 2021, começou a circular pela mídia especializada brasileira envolvo a uma polêmica. Que, por sinal, apenas registra por outra ótica a falência da associação de correspondentes estrangeiros e, por consequência, do Globo de Ouro. Uma produção totalmente estadunidense relegada à categoria de filme estrangeiro pelo critério linguístico. Vale lembrar que, nessa semana, uma notícia bombástica veio à tona pelo L.A. Times (leia, em inglês, clicando aqui). Porém, a lembrança do longa-metragem na categoria melhor elenco no SAG Awards (a principal e que dificilmente tirará a vaga dele como candidato a melhor filme no Oscar) é um bom indício.

Porém, quem está mais próximo do espectador norte-americano: a associação de jornalistas ou a Academia? A busca por representatividade vem gerado frutos no principal prêmio do cinema – e a vitória de “Parasita” (2019) é parte disso. O filme dirigido por Lee Isaac Chung tende a inaugurar um novo tópico nessa discussão. O cineasta é nascido no Colorado em 1978 e muito do olhar do jovem David (Alan S. Kim) é a projeção dele sobre os fatos de sua infância, já que cresceu em uma fazenda no Estado de Arkansas. A história dos Yi, uma família coreana que se estabelece na América, prima pela veracidade na narrativa ao colocar os personagens dialogando, óbvio, em seu idioma primário. Todavia, o roteiro do próprio Chung tem um foco, o de trazer os desafios e as dificuldades de um intercâmbio cultural forçado dentro da sua própria casa, quando se é imigrante.

A crítica está apaixonada por “Minari” e o público não deverá ter dificuldades de se envolver com a trama. Apesar da direção ser mais estilosa do que sensível, as referências da plateia em narrativas do tipo, que ultrapassam o sucesso arrebatador de Bong Joon Ho no ano passado, garantirão a dose de emoção. Jacob (Steven Yeun) e Monica (Yeri Han) são um casal de meia-idade que se firmam no mesmo Arkansas da década de 1980. Ele tenta criar uma rede autossustentável de agricultura familiar, revendendo sua colheita para outros imigrantes que ocuparam o comércio de cidades maiores. Ela se mantém em um degradante trabalho na fazenda vizinha, em que os donos de terra se aproveitam da necessidade para ofertar subempregos a quem chega nos Estados Unidos.

No meio de tudo isso, a filha adolescente Anne (Noel Cho) e o menino David precisam se desdobrar para se integrar ao seu país sem perder as raízes culturais cultivadas pelos pais. Porém, essa identificação enquanto coreano já se manifesta de forma prejudicada no menor. A chegada de sua avó, Soonja (Yuh-jung Youn, também indicado ao SAG Awards como atriz coadjuvante) irá escancarar esse conflito – sendo esse o grande fator de atração. Alan e Esther tem uma química espetacular em cena – ela foge do estereótipo da avó adorável e quebra a expectativa da birra que o garoto pretendia fazer. Desde o início, percebe-se nos pais daquelas crianças uma sensação de recomeço. A composição do espaço onde reside a família é feita nos primeiros minutos de “Minari” e se vinculam a uma tentativa de adicionar um elemento sentimental a um território estrangeiro – sob todos os aspectos.

O intercâmbio cultural se choca com a chegada da senhora, porque Anne e David imaginavam ser simples essa convivência harmônica dos Estados Unidos “da porta para fora” e da Coréia “da porta para dentro”. Lee Isaac Chung valoriza esse olhar sempre que possível, seja usando uma bebida típica do país oriental (ou uma garrafa guardada de antes), até o uso do inglês sempre com forte carga dramática. Usando expressões que eles não querem dizer ou então como uma provocação ao outro, o idioma é um fator preponderante na narrativa – o que torna inexplicável a manutenção da regra pelo Globo de Ouro. Jacob mantém a busca pelo direito a uma terra produtiva, quase uma outra releitura da Marcha para o Oeste, do Destino Manifesto, que mencionamos em “Victoria“, produção belga exibida no 9º Olhar de Cinema.

Claro que não estamos diante da mesma aplicação de olhar nos dois filmes, porque “Minari” se ergue enquanto produto palatável para a temporada de premiações. “A Despedida” fez o mesmo (e muito bem), mas a diretora Lulu Wang encontrou uma resistência maior em 2020. Porém, enquanto bonito conto familiar, o longa-metragem é bem menos arrebatador que outros exemplares do gênero. Ganha nossa simpatia e prende a atenção por se inserir na realidade norte-americana, saindo da unidimensionalidade. Porém, assim como vem acontecendo nas narrativas ficcionais com o objetivo de ser laureada por sindicatos e associações, as alternativas à abordagem tão original do primeiro terço seguem um caminho repetitivo.

O arco de Soonja, que de tão curioso vai se tornando os centros das atenções, perde força em uma saída encontrada muitas vezes em outras produções. Uma senhora que surge carregada de indiscrição e que nos diverte por ser inconveniente em muitas situações, é levada a um destino tão clichê e tão repentinamente exposto, que Chung não atinge o objetivo de emocionar a partir dessa perspectiva. Por outro lado, a leitura de Jacob, pai com um protagonismo mitigado porque suas ausências são importantes para a trajetória da família, também perde força. Um homem que tenta administrar a obsessão por entregar uma vida despreocupada para sua família e que deixa vazios sentimentais, que vão além do mero progresso econômico.

Essa luta bem intencionada do personagem de Yeun surge sempre desfocada e, no clímax do longa-metragem, o espectador não fica tão tocado com as consequências dessa administração equivocada da própria vida. Se há tendências na indústria em 2021 e elas seguirão o caminho pouco ousado de se aproximar da acertada escolha do ano passado, é possível que estejamos diante de um campeão aqui. Tanto que a A24, que ano passado se destacou com “O Farol” (2019) e “Uncut Gems” (2019) – mas o melhor filme do ano “The Last Black Man in San Francisco” (2019) se perdeu no caminho – tirou fichas de “First Cow” (2020), uma obra bem mais interessante, porém menos universalista, acreditando que o perfil do Oscar mudou.

Resta saber se a campanha nas próximas semanas fará “Minari” ser assistido com um olhar generoso por parte dos votantes – e do público, que deve chegar com a expectativa calibrada para se emocionar um pouco acima da média na comparação com algumas produções genéricas que postulam ao seu lado.

Veja o Trailer:

Jorge Cruz Jr. é crítico de cinema e editor-chefe da plataforma Apostila de Cinema.

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